UM TEMPO PARA O AMOR

Capítulo 3

Lucas ainda estava inconsolável. Por vezes Laura o flagrava chorando e se perguntando, por quê? Ele amava distrair-se com seus jogos virtuais online, alguns criados por ele e seus amigos que alcançaram um certo sucesso. Tábata e Rodrigo, irmãos gêmeos que moravam no bairro e estudavam junto com ele eram os amigos mais frequentes. Habilidoso na informática, Lucas criou a loja Virtual da Rede Elegance e Pillar o incentivou e em poucos meses a loja alcançou um sucesso fantástico. Sem sair de casa por toda a semana após a morte de Pillar, os amigos de jogos virtuais marcaram um encontro com ele num shopping para lhe dar um abraço pois sua ausência nos jogos preocupou a todos. Com o rosto ainda vermelho e inchado ele beijou o rosto da mãe e saiu pela porta. O coração de Laura apertado doeu, por ver seu filho daquela forma. Mas Lucas já era um homenzinho como Pillar sempre falava. Ele estava aprendendo a administrar suas emoções desde aquele fatídico episódio a dias atrás.

Como a morte de Pillar acontecera no final da tarde de segunda feira, Laura decidiu decretar luto nos quatro dias úteis em todas as lojas da rede em todo o pais. As homenagens a Pillar se seguiram em todos os seguimentos da moda e nas associações comerciais. Um último evento no final da tarde do sábado prometia mais lágrimas. O mais novo empresário de sucesso no ramo do design e criação, eleito recentemente como presidente da Associação Comercial do Estado de São Paulo, prestaria a última homenagem a Pillar em nome de todos os empresários paulistas. Laura estava exausta. Ainda não tinha tido tempo de chorar a morte de sua amiga mãe por conta dos inúmeros eventos em homenagem a ela e no seu tempo livre consolava o filho. Embora Lucas agora com 15 anos, já se mostrava um homem competente no mundo dos negócios, era uma criança frágil que nesse momento precisava muito do colo da mãe e do carinho dos amigos.

Laura deu uma geral na casa toda e preparou um café. Sorveu um gole fumegante e relaxou no sofá da sala, lembrando de como sua vida tinha sido difícil. Mas como a virada aconteceu no dia em que bateu na porta da casa dos Matoso. Decidiu enxugar as lágrimas e tomar um demorado banho e deixar a água do chuveiro deslizar sobre seu corpo suavemente como uma massagem relaxante e ao mesmo tempo revigorante. Hidratou os cabelos e tomou mais um café enquanto preparava seu discurso de gratidão para o evento mais tarde. Uma hora depois, estava pronta. O vestido azul que Pillar lhe fizera para os 15 anos do filho lhe fazia parecer mais jovem e hoje especialmente ela precisava disso. Parecia ter envelhecido uns 10 anos depois da morte de Pillar. Caprichou nos cachos brilhantes e prendeu a lateral com um grampo perolado. Uma maquiagem discreta adequada a ocasião e salto de cetim preto. Bateu o selo de aprovada no espelho e ouviu o som da buzina do carro de aplicativo.

O salão da Associação estava lotado, muito bem decorado com as flores preferidas de Pillar, orquídeas, e sua cor favorita predominava no ambiente, o azul em diversas tonalidades. Laura engoliu seco. O responsável pelo evento conhecia Pillar. Distraída pelo encanto no salão, esbarrou no homem que com pressa adentrava o salão com uma pasta que foi ao chão e espalhou as fichas que ele trazia. Ela se desculpou imediatamente enquanto o ajudava a recolher seus papéis e então levantou os olhos e viu um jovem desajeitado de olhos negros penetrantes por trás dos óculos.

- Eu sinto muito, - desculpou-se levantando com a ajuda do rapaz.

- Não tem importância. Eu devia olhar mais por onde ando. Me desculpe por favor. Se me dá licença, preciso ir. Você está bem?

- Sim, claro, estou bem. – observou-o seguir em direção a tribuna. Devia ser um daqueles garotos da organização do evento. Embora muito bem vestido com seu terno grafite e sua camisa social azul combinando com o ambiente, percebia-se de longe que estava muito desconfortável.

A música ambiente foi pausada e uma estonteante jovem num vestido preto, cabelos soltos como cascata em seus ombros anunciou com sua voz rouca o início do evento, apresentou as autoridades presentes e os mais influentes comerciantes do Estado. Em nome de todos falaria o presidente da Associação.

- O quê?! - Soltou sem querer um gritinho abafado Laura ao ver o jovem desajeitado subir na tribuna. Marcos Fernando Aires, presidente da Associação Comercial, executivo da Designer Brasil.

- Senhoras e senhores! Uma boa tarde a todos. Quero pedir desculpa pelo atraso, mas quando um amigo precisa de nós devemos colocá-lo em primeiro lugar. Frase de d. Pillar que guardo registrada em meu coração. E hoje um amigo precisou de mim. Mas, em nome da associação quero agradecer a Deus por podermos conviver por mais de 10 anos com a pessoa preciosa que nos foi dona Pillar. Minha madrinha, conselheira e a pessoa responsável que me ajudou a chegar onde estou hoje. Acreditando em meu potencial e investindo em mim. Todos aqui temos pelo menos uma história boa para contar sobre nossa Pillar, mas esse evento tem um toque diferente, o de lembrar de momentos alegres e de suas frases de impacto que incentivavam a todos e principalmente do seu excelente bom humor que contagiava todos a sua volta. Por favor, sentem-se e aproveitem a viagem. – E mais uma vez uma música suave invadiu o ambiente vindo de um vídeo que começava no telão... lágrimas e risos ecoaram pelo salão por cerca de 15 minutos de vídeo. Cenas alegres e marcantes da vida profissional de Pillar e suas frases mais significativas foram lembradas. Essa sem dúvida era a homenagem mais profunda feita por quem com certeza era muito íntimo de Pillar. Mas quem era esse "afilhado" que Laura não conhecia?

Ao final da apresentação, dirigiu-se ao dr Otávio, acompanhado da esposa d. Maria, cumprimentou-os e perguntou-lhes: - O que está acontecendo aqui?

- Pillar, uma caixinha de surpresas, deve estar rindo de nós agora. Eu soube disso agora há pouco. Mas saberemos melhor na leitura do testamento dentro de 30 dias.

O evento caminhava para o final e curiosa Laura observava o jovem desajeitado com os olhos mais profundos que ela já tinha visto, discorrer pelo salão conversando com todos e confortando os mais emocionados. Esperou sua vez e aproximou-se.

- Ah... olá! Acho que ainda devo desculpas por meu modo abrupto de entrar, mas como eu disse foi por causa do atraso. Estou perdoado? Disse levantando as mãos em sinal de rendição. Você é? – Perguntou.

- Laura Cardoso, gerente de lojas da Pillar – respondeu estendendo a mão que ele tocou e levou aos lábios e beijou suavemente.

- Com certeza, um prazer conhecer você, Laura.

- Olha só, vou direto ao assunto garoto. Quem é você? E não estou falando profissionalmente. Você disse coisas lá em cima – e apontou a tribuna – muito intimas e o vídeo... – Marcos a interrompeu pedindo uma pausa com as mãos e sorrindo.

- Olha só, eu adoraria te responder tudo agora. Mas sabe o amigo que citei lá em cima? Ele continua precisando de mim. Preciso ir para casa me refazer e voltar para ajudá-lo. Nossa conversa ficará para um outro dia se não se incomoda. – E todo gentil tomou sua mão, beijando novamente. Arriscou uma reverência e saiu do ambiente da mesma forma como surgiu, do nada.