Na capela

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Mais uma vez um pequeno tumulto se formava nos limites do engenho. Cochichava-se entre os escravizados sobre como estes pequenos focos de desordem começavam a se tornar rotineiros naquele lugar.

Acompanhavam esta história desde seu início, e o momento que parecia simbolizar o fim daquela trama havia chegado. Os olhos de todo o engenho se voltaram para a entrada da fazenda.

Ele finalmente havia chegado com os relatos de tudo que vira e com os corpos das vítimas do desastre. Visivelmente abatido e esgotadoto, o barão desceu lentamente do cavalo e tomou da garupa do animal o cadáver de dona Lauriana, envolto no delicado tecido branco. Seu semblante transbordava o grande pesar que sentia em ver aquela figura inanimada em seus braços. Uma família honrada, pessoas boas, todas destinadas àquele fim.

Peri se aproximou lentamente, atravessando a multidão de homens que o cercavam. José Rodolfo, ao vê-lo, modificou sua postura de tal modo a transmitir o asco que sentiu ao o avistar. Preparava-se para cuspir em sua direção quando Diogo irrompe um pranto seco, que se inicia silencioso e vai tomando força a cada respiração. O rapaz, que há poucos meses completara 16 anos, não podia acreditar no que via. O choque o proibia de aceitar o que estava diante de si. Agarrou o corpo do pai; depois, correu para o barão, a fim de abraçar o da mãe. Por fim, caiu no chão enquanto balbuciava negações, como se isto pudesse mudar os fatos.

Envergado no chão, contorcia-se de remorso e condosia-se de amargor. Passava seus dedos pela raiz de seus cabelos loiros e os puxava para tentar extravasar a fúria e angustia que o atormentavam.

Aquela cena deplorável levou o barão ao ápice da comoção que já sentia. Sem saber o que dizer, tentava acalmar o rapaz. Este sequer conseguia escutá-lo. Suas memórias o ensurdeciam e seus sentimentos tomavam a direção de seus movimentos e o controle de sua boca.

- Vamos, filho. Entre, não te faz bem ficar aqui. - recomendou o sr. José algumas vezes, mas todas as tentantivas foram completamente inúteis.

Ele indicou para que Misael o conduzisse de volta para casa e que mandasse que Cesária não deixasse Cecília sair até que desse permissão. Misael gentilmente segurou no braço do rapaz enquanto tentava acalentá-lo com suas palavras. Quando estava quase conseguindo levantá-lo, o rapaz se recusou em disparates e num puxão libertou-se de sua possessão, perdendo o equilíbrio e tomabando na direção da multidão. Peri, que estava a frente dela, num movimento rápido o segurou, impedindo ele de se chocar contra o chão.

José Rodolfo teve um sobressalto ao vê-lo em suas mãos. O primeiro pensamento que lhe passou foi vociferar algo ao índio, mas pelo quê?

- Peri! - Clamou o rapaz, vacilante. Inesperadamente, ele buscou conforto nele. A expressão de surpresa comunicada pelo barão foi compartilhada pelo guerreiro. Não se recordava de ter compartilhado qualquer proximade com o rapaz.

Ainda espantado pelo gesto súbito, tentou consolá-lo. Pousando as mãos sobre suas costas, ciciou ao rapaz que voltasse a residência. Lembrou-lhe que Cecí lá o esperava, e que ela era a única que verdadeiramente entenderia o que passava em seu coração agora. Que ela precisava mais do que nunca do homem que seu pai o havia criado para ser.

Ele lenvantou a face umidecida e buscou seus olhos. Seu rosto pueril e seus olhar inocente vertiam a meninice que ainda o preenchia. Peri soube então que não estava apto ainda a tomar a referida posição.

O moço assimilou vagarosamente aquelas palavras e meneou a cabeça positivamente, se erguendo e permitindo-se guiar por Misael.

Quando estavam longe, Peri se dirigiu ao outro cavalo e tomou D. Antônio de Mariz. O mirou silente. Volveu-se então lentamente para o barão com um olhar firme, aguardando um ditame. O barão lançou uma expressão de desaprovação para ele, mas Peri redarguiu o gesto apertando contra si seu senhor e amigo.

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