— Ainda não. Pensei bem e desisti de avisá-las. — respondo. — Tem que ser algo muito minucioso. Estamos falando de uma criança desaparecida há quase uma década, haverá euforia. Nesse momento é preciso calma. E Abel não pode voltar para casa. Eu só preciso ajeitar alguns detalhes e aí sim elas poderão vir para cá.

— E as outras crianças? Gallardo falou sobre ter seis crianças na casa.

— Estavam dentro de uma parede. Depois de me encontrar com Abel, dei uma olhada no lugar. Tem um botão que ajeita a opacidade do espelho. É um espaço muito apertado, porém, é bem disfarçado, parece uma parede mesmo. Ali você ajeita a opacidade e todos acharão que é um espelho. Um esconderijo menos clichê que um porão.

— Sabe para onde iriam?

— Não, mas talvez Abel saiba. Ele era o único acordado, e se ele entrou na parede, sabia o botão da opacidade, ele sabe mais coisas. Ainda teremos que procurar mais informações sobre essas crianças. Não constam em nenhum registro de desaparecimento dessa cidade ou das mais próximas. Pelo menos já devem saber falar, só vamos esperar para conversar quando acordarem.

— E onde estão?

— Em um local seguro. Lá tem médicos, toda assistência que elas precisarão. Só trouxe Abel para cá porque ele já é grande para entender e conversar conosco. E Moisés pediu por isso, pode ser que tenha algo mais aí.

— Moisés está saindo um bom justiceiro, bem certeiro em tudo o que faz.

— Eu imagino como seria a real vingança dele se não tivesse a nossa intromissão. Atrapalhamos a verdadeira vingança do Moisés. Como começaríamos a investigar e saberíamos de muita coisa, ele se adiantou no seu plano. E ele tem anos de investigação, de planejamento. Por isso, tudo está saindo tão certeiro. Ele estudou todas as maneiras e os detalhes.

— Ele te contou muita coisa? — confirmo. — Você está o ajudando ou está com Gallardo?

— Ainda tenho um pé atrás com Moisés. — confesso a Luan. — Sabemos que ele está nessa para vingar Melina. Está matando quem precisa, mas tem toda a coisa de assassinatos anteriores. Eu ainda não sei o que pensar e o que fazer com Moisés, mas, no momento, estarei ao lado dele. Eu falei do meu assunto pessoal contra essa quadrilha e ele me deu uma lista dos integrantes...

— Você é um criminoso, no fim das contas. — olho para Luan. — Por que vai julgar o psicopata se você também comete crimes? — dá de ombros. — Sei que estava perdido sobre o que fazer da vida, mas não anula o que já fez e ainda fará, pelo menos contra seus inimigos. E é aí que você ganha a confiança de Moisés.

— Sim. — respiro fundo. — Sou um criminoso no fim das contas.

— E o casal que sequestrou Abel? Onde estão?

— Hospital. Moisés atirou em cada um, nada para matar, apenas para não correrem na hora da invasão.

— Meus tios e primos me abandonaram? — agora a nossa atenção vai para Abel novamente. — Ou foram ameaçados e precisaram ir embora?

— Sua mãe e avó explicarão melhor. — respondo. — Eu não sei a fundo na história.

Eu sei o que ocorreu, mas é melhor não falar disso agora.

Seus parentes ficaram com medo de tudo o que ocorreu, ainda mais com o assassinato do pai de Abel. Eles foram embora e deixaram Liv para trás, com uma senhora tentando dar forças a uma jovem viúva e com o filho desaparecido, sendo dado como morto, e ela sabendo que está vivo.

Era só terem ficado ao lado da mulher, da irmã ou cunhada, que não procurassem pelo Abel, pelo perigo, mas que dessem força aquela mãe e viúva.

— Eu lembro do meu pai. — respira fundo. — Eu lembro de todos, sempre lembrei.

Vou até a cadeira e sento ao lado de Abel, que continua no chão.

— Qual o sentido de sequestrar uma criança que lembra dos pais? — questiono. — Você nunca os esqueceu, aposto que nunca gostou desse casal que te sequestrou.

— Odeio, odeio muito! — rosna. — Eu lembro de tudo, eles até me chamam de ''Daniele'', para mim é nome de mulher, mas eles disseram que na Itália é nome de homem. Eles diziam que eu jamais teria a vida de antes, porque meus pais me venderam. Mas eles sempre me amaram, impossível me vender.

— Sim, seus pais sempre te amaram, nunca te esqueceram e sempre tiveram esperanças em encontrar você. O que é estranho, crianças mais velhas lembram da verdadeira família, por que vocês?

— Gioconda tinha dois filhos, acho que tinham sete anos. Eles morreram em algum acidente de ônibus escolar. Ela sempre contou essa história para dizer que me ama.

— Você lembra o filho dela?

— Lembrar de lembrança, não de rosto. Gioconda disse que me viu na feira com minha mãe, se apaixonou porque me amou desde aquele momento. Aí ela conversou com minha mãe e ela me vendeu. Quando as outras crianças chegaram em casa, lembro de Gioconda falar que queria uma menina agora, e iria aproveitar o momento para escolher a nova filha.

— E seu dedo? — Luan pergunta.

— Eu acordei e minha mão estava enfaixada. Lembro que eu tinha medo e chorava muito. Gioconda dizia que quando eu crescesse, meu dedo cresceria de novo. Eu era pequeno e achei que fosse verdade mesmo. Ela disse que era como um dente, que arrancamos e depois cresce novamente.

— O marido dela não falava com você? — pergunto.

— Eles se amam muito, eu acho. — meneia a cabeça. — Ele nunca gostou de mim, ela sempre foi mais exagerada ao falar ''Eu te amo''. Eu acho que ele me aceitou para agradar a mulher, apenas.

— Você fala muito bem para o que? Treze anos? — faço a observação. — Foi a escola?

— Não, porque eu lembrava dos meus pais, avó, tios e primos. Gioconda tinha medo de me deixar solto e eu contar algo ou fugir. Mas eu lia muito em casa.

— Sua casa recebia visitas?

— Uma vez ou outra, mas a visita que realmente falou comigo foi Moisés.

— E por que exatamente o Moisés? — Luan pergunta.

— É que as outras visitas já iam falar logo com eles, não ficavam por perto. Moisés teve que ficar por perto porque estava esperando o dinheiro.

— Que dinheiro? — pergunto, já que não sabia desse detalhe.

— O dinheiro das crianças. — filho da puta! — Moisés foi pegar o dinheiro, mas como não estava arrumado, ele teve que esperar ao meu lado. Eu vi quando entregaram a mochila de dinheiro a Moisés.

Luan ri.

Eu também dou risada.

Nos afastamos de Abel, que agora espera por algo para comer.

— Justiceiro, porém, nem tanto. — Luan entende o que aconteceu.

— O filho da puta não foi salvar crianças ou ajudar a prender pessoas importantes da quadrilha, ele só foi pegar o dinheiro. Aproveitou a situação para entregar culpados, mas o plano era apenas o dinheiro. — concluo.

— Sabendo da polícia na área, Gianluigi nunca mandaria alguém até a casa para pegar qualquer dinheiro. Moisés escapou com a grana e com uma larga vantagem de não ser descoberto. Moisés está brincando. Ele não está apenas atrás da vingança com Gianluigi, ele está brincando com todos.

— O que me faz persistir na ideia de que não estamos falando com um justiceiro, com um cara que tem algum senso de justiça, ele tem o sentido deturpado. Escreva o que estou falando, Luan, Moisés deve ser o maior serial killer desse país. Quando tudo isso terminar, eu quero saber a verdade sobre Moisés. 

Uma família para o mafioso - Em busca da filha perdida (Livro 1 e 2)Where stories live. Discover now