O chão parecia mover-se, sabia que não estava realizando tal façanha por si só, as sensações daquele sonolento estado de inconsciência ainda dominavam sua mente e lutava com todas as forças.
Seus olhos, entretanto, não pareciam estar convencidos disso, era tão mais fácil continuar a sonhar, aquele céu maravilhoso era tão mais fascinante e seus devaneios foram tão reais que, por um breve momento, era até mesmo possível tocá-los, se é que se pode tocar o ar, o céu... Novamente a dor ganhou a batalha e a escuridão envolveu sem perdão seus sentidos.
Após uma eternidade na escuridão uma voz angelical e fascinante flutuou até seus ouvidos. De cadência suave, pareciam sinos e pássaros a cantar. Aquela voz fazia brotar o dom da cura, pois só de ouvi-la sentia a escuridão regredindo bruscamente, acuada, como quem foge de seu mais terrível algoz.
Languidamente foi abrindo os olhos, imagens desfocadas e terrivelmente brilhantes preenchiam sua visão. Aquela luz era quente, sentia seu corpo pegando fogo e a voz... Aquela voz cantava uma música indescritivelmente linda! E estranha, seria essa a dita língua dos anjos? Silêncio e escuridão. Estava só mais uma vez.
Uma brisa surgiu e em meio a ela aquele som divino teimosamente se infiltrava. Sentia que seu corpo descansava sobre algo confortável, curiosamente acreditava estar num local alto. Talvez um altar? E a música, sim a música! Algo lhe fazia pensar que precisava manter o foco nela. A letra era diferente, as palavras confusas, definitivamente não conseguia identificar o que era falado. O ritmo foi se intensificando até chegar ao crescendo.
Nesse instante um clarão envolveu seu corpo e toda a dor que sentira até então parecia uma insignificante picada de agulha em comparação. E foi num instante tão intenso quanto uma eternidade que seu inferno pessoal iniciara agarrando o que estava ao seu alcance com punhos ardentes e pulsantes e terminara. Conseguiu finalmente abrir os olhos e o que viu não fazia sentido com o que acabara de transcorrer.
Uma bela mulher que só podia ser descrita como uma princesa curvava-se em sua direção. Os delicados cachos daquele ser divino, negros como a noite e enfeitados por uma linda coroa de cristal, tocavam levemente sua face e os olhos límpidos, que mais pareciam dois diamantes, olhavam atentamente para os seus. Suas primeiras palavras foram:
- Achei que tivesse morrido e não me resta dúvida de que estava no inferno... Como foi que cheguei aqui? Você foi o anjo que me salvou?
E que surpresa não foi a risada vivaz de som cativante que envolveu seu ser com tamanha doçura feito um amante saudoso. A dona da voz mais encantadora que ouvira, respondeu:
- Oh, milady com certeza não morreu. O que sentimos foi causado enquanto eu realizava o canto da cura. Lembre-se, toda ação tem sua reação e para qualquer ganho, tem-se um preço a pagar.
- Oi? Canto da cura? Mas... Espera só um pouquinho... Quer dizer que você sentiu a mesma dor que eu senti? – espanto ressoava em cada palavra.
- Sim. – respondeu com a sutil resignação de quem agradece pelo troco parco do pão.
- Como é que pode dizer isso tão calmamente? Foi horrível! Só a lembrança já faz meu sangue gelar! E você... Por que fazer isso se nem sequer me conhece?
- Pois não poderia ser diferente, milady! - as lágrimas pontuavam a nobreza de deus sentimentos – Fui eu quem a evocou pelo Portal de Bruadar! O que aconteceu à milady foi minha culpa! Perdoe-me, por favor! Não que seja motivo suficiente para justificar tamanho sofrimento que causei, entretanto, não tive o tempo necessário para preparar o ritual... A escuridão quase colocou suas garras em milady, não fosse por Lorde Clancy... – suas palavras foram sumindo sem forças suficientes para encarar a magnitude da situação.
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Portal de Bruadar
FantasyTemos aqui uma jovem pessoa que adentra agora sua vida adulta, em conflito. Por entre desafios da vida cotidiana e buscas insólitas à própria identidade, se verá inesperadamente diante à uma guerra entre luz e escuridão. O que o código de etiqueta d...