Capítulo 1

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O chão parecia mover-se, sabia que não estava realizando tal façanha por si só, as sensações daquele sonolento estado de inconsciência ainda dominavam sua mente e lutava com todas as forças. 

Seus olhos, entretanto, não pareciam estar convencidos disso, era tão mais fácil continuar a sonhar, aquele céu maravilhoso era tão mais fascinante e seus devaneios foram tão reais que, por um breve momento, era até mesmo possível tocá-los, se é que se pode tocar o ar, o céu... Novamente a dor ganhou a batalha e a escuridão envolveu sem perdão seus sentidos.

Após uma eternidade na escuridão uma voz angelical e fascinante flutuou até seus ouvidos. De cadência suave, pareciam sinos e pássaros a cantar. Aquela voz fazia brotar o dom da cura, pois só de ouvi-la sentia a escuridão regredindo bruscamente, acuada, como quem foge de seu mais terrível algoz. 

Languidamente foi abrindo os olhos, imagens desfocadas e terrivelmente brilhantes preenchiam sua visão. Aquela luz era quente, sentia seu corpo pegando fogo e a voz... Aquela voz cantava uma música indescritivelmente linda! E estranha, seria essa a dita língua dos anjos? Silêncio e escuridão. Estava só mais uma vez.

Uma brisa surgiu e em meio a ela aquele som divino teimosamente se infiltrava. Sentia que seu corpo descansava sobre algo confortável, curiosamente acreditava estar num local alto. Talvez um altar? E a música, sim a música! Algo lhe fazia pensar que precisava manter o foco nela. A letra era diferente, as palavras confusas, definitivamente não conseguia identificar o que era falado. O ritmo foi se intensificando até chegar ao crescendo. 

Nesse instante um clarão envolveu seu corpo e toda a dor que sentira até então parecia uma insignificante picada de agulha em comparação. E foi num instante tão intenso quanto uma eternidade que seu inferno pessoal iniciara agarrando o que estava ao seu alcance com punhos ardentes e pulsantes e terminara. Conseguiu finalmente abrir os olhos e o que viu não fazia sentido com o que acabara de transcorrer.

Uma bela mulher que só podia ser descrita como uma princesa curvava-se em sua direção. Os delicados cachos daquele ser divino, negros como a noite e enfeitados por uma linda coroa de cristal, tocavam levemente sua face e os olhos límpidos, que mais pareciam dois diamantes, olhavam atentamente para os seus. Suas primeiras palavras foram:

- Achei que tivesse morrido e não me resta dúvida de que estava no inferno... Como foi que cheguei aqui? Você foi o anjo que me salvou?

E que surpresa não foi a risada vivaz de som cativante que envolveu seu ser com tamanha doçura feito um amante saudoso. A dona da voz mais encantadora que ouvira, respondeu:

- Oh, milady com certeza não morreu. O que sentimos foi causado enquanto eu realizava o canto da cura. Lembre-se, toda ação tem sua reação e para qualquer ganho, tem-se um preço a pagar.

- Oi? Canto da cura? Mas... Espera só um pouquinho... Quer dizer que você sentiu a mesma dor que eu senti? – espanto ressoava em cada palavra.

- Sim. – respondeu com a sutil resignação de quem agradece pelo troco parco do pão.

- Como é que pode dizer isso tão calmamente? Foi horrível! Só a lembrança já faz meu sangue gelar! E você... Por que fazer isso se nem sequer me conhece?

- Pois não poderia ser diferente, milady! - as lágrimas pontuavam a nobreza de deus sentimentos – Fui eu quem a evocou pelo Portal de Bruadar! O que aconteceu à milady foi minha culpa! Perdoe-me, por favor! Não que seja motivo suficiente para justificar tamanho sofrimento que causei, entretanto, não tive o tempo necessário para preparar o ritual... A escuridão quase colocou suas garras em milady, não fosse por Lorde Clancy... – suas palavras foram sumindo sem forças suficientes para encarar a magnitude da situação.

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⏰ Última atualização: Apr 23, 2020 ⏰

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