Capítulo 3 - Por um dia

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O professor Daves, de sociologia, recebeu uma mensagem perturbadora naquele final de semana. Era do responsável de um de seus alunos da escola Refletir. Nela, ele se queixava que não houvesse horário de aulas de revisão de sociologia, e culpava nisso o motivo de um dos estudantes de Daves ter tirado notas cada vez mais baixas desde que o ano começara.

Não era culpa do professor que não houvesse aulas de revisão de sociologia. O percentual de alunos tirando nota baixa na matéria era minúsculo, e geralmente eles voltavam a se equilibrar na média por conta própria. Até mesmo o projeto de aulas extras em horário oposto beneficiava apenas matérias como física, química, matemática... Mas afinal, um pai reclamando era um pai reclamando. Mal recebera a queixa, Daves falou com a coordenadora, que falou com o pai, que falou com Daves e coordenadora, que ambos falaram com a diretora, e...

E então, a partir da segunda-feira, haveria aulas de revisão de sociologia. Estava liberado para sair recrutando participantes de sala em sala; por mais que essa liberdade soasse mais como desespero de fazer um número considerável de alunos ir. O dia chegou e ele se sentia um vendedor, batendo de porta em porta, tentando convencer as pessoas de que precisavam de uma coisa que elas não queriam.

Isso não lhe impediu de bater na próxima sala. "1° C", dizia a placa.

- Com licença. – Pediu, sorridente. Seu sorriso levantava o óculos, que por sua vez colocava uma barreira entre seus olhos cansados e os alunos quase dormindo. Era o primeiro horário. A professora em sala apenas lhe fez um pedido silencioso para ser rápido. – Bom dia. Eu tenho um recado.

Jess quase desgrudou seus olhos de Arlec ao ouvir "recado". Quase. Mesmo com a vista desfocada ( ou então ele perceberia seu encarar ) era inegável que naquele dia também, Arlec faria uma pintura sua chorar. Nem o artista mais talentoso conseguiria capturar a beleza efêmera de cada sorriso ocasional dele. Parecia até um ataque pessoal contra ela. Em parte porque passou o fim de semana inteiro digitando e apagando tudo o que queria dizer a ele. Se estressou tanto que quando acordou na segunda-feira pela manhã, estava com o telefone na mão e três minutos atrasada para a aula. Ou seja, além de não enviar mensagem nenhuma, perdeu a chance de falar com ele antes do toque.

-... Quem participar das aulas de revisão de sociologia estará isento das atividades de sua turma da feira cultural deste ano. – A voz masculina lá na frente disse. Dessa vez Jess se virou, assustada: o desânimo da sala toda sumiu, aplausos e gritos abafando a voz do professor. A mera ideia de escapar do trabalho em equipe com todas as pessoas que eram obrigados a aturar todo dia era o suficiente para aplaudirem por horas.

Daves e a professora em sala ficaram encarando os adolescentes. Ele, em particular, deu um sorriso medonho, e a sala se calou.

- Por se tratar de um projeto novo, será explicado melhor no horário extra de sociologia de hoje. Há detalhes que precisam ser decididos com os alunos interessados, então venham, ok? – Ele riu. – Sala de monitoria três, às cinco horas. Estejam lá!

Ele fechou a porta e suspirou. Cochichos eclodiram como uma erupção vulcânica por suas costas, e podia ouvir, por mais grossa que fosse a madeira, a professora em sala reclamando com a turma agora triplamente desanimada.

"Cinco horas" significava ficar na escola até seis da noite para uma aula de sociologia. Ninguém estava disposto a fazer isso. Não quando o motivo de só terem turmas de ensino médio pela manhã era a montanha de dever de casa. Não quando um item a menos na agenda podia levar três horas. Nem mesmo por um professor jovem e divertido que os alunos adoravam. E nem mesmo para escapar do desastroso trabalho em equipe da feira cultural.

- Isso não vai dar certo... – murmurou, fazendo hora antes da próxima sala limpando seu óculos. Ele entendia. Não fazia muito que também era um adolescente, mofando seus sonhos numa sala de aula. Agora era um adulto, e seu sonho de ser professor realizado não vinha sendo o suficiente para tirar a poeira dos sonhos da nova geração. – Que terrível.

Nós, diferentes delesحيث تعيش القصص. اكتشف الآن