29. ALANA

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Três horas de silêncio absoluto entre Alana e Brenda nem eram desconfortáveis àquele ponto

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Três horas de silêncio absoluto entre Alana e Brenda nem eram desconfortáveis àquele ponto. Elas estavam exaustas, fisica e mentalmente. Ser enganada pela melhor amiga, pela pessoa que você julga conhecer melhor que qualquer outra nesse mundo, pode ter esse efeito em uma garota, seja ela uma boa menina, ou uma menina malvada. As duas se permitiam o atordoamento momentâneo.

Mesmo que tanto silêncio fosse convidativo, Alana não conseguia achar dentro de si a força para dizer a Brenda tudo o que precisava ser dito. Os fantasmas do passado gravitavam entre elas, julgando-as em linguagem muda e ininteligível. Os erros de uma para com a outra e o peso de uma amizade de anos, que deixou de ser. O medo carcomia a boca do estômago de Alana e roubava-lhe todo o discurso preparado, ensaiado, em que tinha pensando mais cedo.

Deus, ela não conseguia nem dizer duas palavras. Me perdoe.

Ou cinco. Você é minha melhor amiga.

Ainda que estivessem a poucos centímetros de distância, mas pareciam quilômetros.

Brenda a largou na porta de casa. Estava sentada no banco do motorista, com óculos de sol sobre os olhos e uma expressão indecifrável. As palavras não ditas pairavam entre elas como um castigo. Brenda subiu o vidro sem se despedir e sumiu na curva que terminava a rua de Alana.

Mas aquele não era o caminho para a casa de Brenda, Alana sabia. Silvia tinha designado a ela a responsabilidade de se livrar daquele carro, e só tinha um lugar apropriado para tal cerimônia: o Jardim Secreto da família Barth.

Alana caminhou sobre os sapatos de salto até a padaria que ficava na esquina de sua casa. Já tinha idade suficiente para comprar uma, duas, três garrafas de vinho rosé, na esperança de que o álcool empurrasse as palavras pela sua garganta afora.

Então, ela retornou até o portão de casa, entrou rapidamente e buscou um pacote dentro do próprio quarto. Trocou os sapatos de salto por sapatilhas de solado emborrachado (melhores para correr), e desceu as escadas correndo até o pátio da frente, onde retirou a antiga bicicleta lilás da corrente. O segredo do cadeado ainda era o mesmo. Ela podia jurar que a bicicleta estava na mesmíssima posição em que a havia deixado, como se o tempo não tivesse passado.

Mas o tempo não deixa de passar por absolutamente ninguém, ela pensou com amargura, não importa quão importante, único e vitorioso a pessoa julgue a si próprio. Alana só podia esperar que não tivesse passado tempo demais.

Ela se pôs a pedalar, dobrando na mesma esquina em que Brenda desapareceu apenas momentos antes. O vento meio gelado de Aquino no rosto a lembrava de quando era apenas um terço de um elo mágico. De quando Brenda disparava na sua frente, ávida para vencer uma corrida que ninguém estava disputando; e Silvia, distraída demais em seus fones de ouvido para se importar em competir, pedalava calmamente às suas costas, cantarolando alguma canção do City And Colour.

E então havia ela, Alana David, fazendo o mesmo caminho pelo chão de terra e pelas chácaras florestais de Aquino, dessa vez sem suas saias pregueadas e meias-até-os-joelhos, mas se sentindo igualmente medrosa e pueril rumo ao jardim em que tudo havia se transformado para sempre no que dizia respeito às Boas Meninas.

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