Epílogo

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Olhou-se no espelho, satisfeito. Estava bem apresentável. Com a barba feita, o rosto corado, os cabelos lisos devidamente penteados e as vestes pretas bem alinhadas. Levou as mãos ao pescoço e ajeitou a gola de sua roupa comprida, esfregando-a nos vincos para que ficasse impecável. Thomas havia recebido o dom da palavra e a missão de orientar as pessoas perdidas e consolar as que estavam sofrendo. Deveria estar à altura de realizar seu papel.

Sou um servo do Senhor.

Há meses ele começou a dar o seu sermão, sob uma tenda modesta e empoeirada. Seu público começara pequeno, mas as palavras têm força e, a cada novo encontro, mais e mais pessoas vinham para receber o alimento espiritual. Logo a tenda não comportou mais a quantidade de pessoas e Thomas precisou de um local maior. Conseguiu um pequeno prédio, mais ao centro da cidade. O local abrigava seus fiéis com o maior conforto, porém muitos ainda precisavam ficar de pé, escorando-se nos cantos. Ele estava preocupado. Enquanto seu testemunho alcançava um maior número de indivíduos, já não havia mais espaço físico suficiente para todos. Thomas realizava o seu culto a cada sete dias. Logo eram a cada quatro. E depois a cada dois. As pessoas não o abandonavam, independente da frequência. Buscavam suas palavras de fé como ratos atrás de migalhas. Procurou outro local mais apropriado e, nesse processo, ele apareceu.

Um homem bem vestido, com serenidade no olhar. Disse que havia presenciado Thomas em sua pregação e ficara completamente encantado pelo seu dom. Disse também que havia recebido uma revelação. A humanidade precisava ser salva, precisava redescobrir o caminho da fé. E Thomas era o instrumento pelo qual o Senhor derramaria suas graças. O homem lhe contou todo seu plano para fazer com que as pessoas entendessem o verdadeiro significado da fé. E Thomas gostou do que ouviu.

Eu sou um instrumento da fé.

Duas batidas rápidas na porta, pelo lado de fora, tiraram a sua concentração. Mas não sobre o discurso daquela noite. Ele realmente não precisava decorar as palavras, pois quando chegava à frente das pessoas e abria a boca, elas saíam naturalmente, preenchendo os corações de seus espectadores de esperança e alegria. Thomas olhou para a porta através do espelho.

– Entre.

A porta de alumínio se abriu levemente. O suficiente para que uma cabeça passasse pela fresta, procurando-o dentro da pequena sala.

– Está na hora – falou Kate, a moça que foi destinada a assessorá-lo desde sua conversa com o homem.

– Kate, não acha que me pareço com um padre, só que de preto? – perguntou Thomas, abrindo os braços e se virando para ela, mostrando as novas vestes que lhe foram dadas.

– Você está excelente! – respondeu ela, entrando inteiramente na sala. – E não parece um padre, Thomas. Parece um pastor. O melhor de todos!

Thomas ficou satisfeito com a resposta e voltou a se olhar no espelho, garantindo que estava tudo em ordem.

– Como estamos hoje? – perguntou com grande expectativa.

– Eu nunca vi tanta gente – disse ela animada. – Não sei de onde estão saindo.

Meu rebanho cresce a cada dia. Ele estava certo.

– Deixe que venham – disse Thomas. – Vamos dar o que eles precisam.

Thomas saiu da sala e seguiu Kate até a entrada lateral do grande auditório de uma antiga universidade, local de conhecimento. O lugar era imenso, com cadeiras de madeira impecáveis, estofados floridos em tons escuros de lilás. Grandes cortinas verdes desciam da lateral do palco de madeira bem tratada e envernizada. Era incrível o que alguém com os recursos necessários podia fazer, transformando um lugar em ruínas e atirado às traças em um ambiente aconchegante e acolhedor. Ele entrou pela lateral do palco, caminhando sobre o tablado elevado de madeira. A multidão foi à loucura, gritando e chamando seu nome. Havia centenas de pessoas.

As Crônicas do Apocalipse - Livro 1 - O Senhor do Tempo (Completo)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora