|15| uma séria conversa

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-Wooyoung? - Yunho chamou a atenção do rapaz assim que este entrou na cozinha na manhã seguinte, sozinho - Podemos conversar?

-Ah, claro - o mais novo se sentiu levemente intimidado quando o maior indicou a cadeira à sua frente na mesa, mas se sentou e manteve um olhar firme, ou quase - Sobre o que quer falar?

-Sobre o San - o menor sentiu seu corpo tensionar quando o nome foi citado, mas tentou não demonstrar. Precisava se manter confiante e mostrar ser digno de confiança para os dois, principalmente para Yunho - Quero falar sobre essa relação de vocês. Mas, primeiro: dormiram bem? Ele não teve nenhum pesadelo?

-Ele chorou um pouco de madrugada, então eu coloquei aquele áudio que você me mandou outro dia e ele se acalmou. Acho que era começo de algum pesadelo. Aconteceu duas vezes e depois ele dormiu bem - contou Wooyoung, lembrando-se das duas vezes em que acordou no meio da noite com San soluçando sobre seu peito e o abraçando apertado.

-Já é mais do que ele dorme normalmente. Obrigado - agradeceu o mais velho, encarando as próprias mãos. Yunho não sabia por onde começar. A história tinha tantos altos e baixos, curvas e pontos sem saída que só de pensar já lhe deixava mal - Olha, Wooyoung, se você quiser continuar nas nossas vidas desse jeito, há algumas coisas que você precisa saber sobre o San.

-Como o que? Se é porque ele não fala, eu já disse que não me importo. Ele é uma pessoa maravilhosa que não merece ser tratado como se fosse inferior só porque é diferente. Eu gosto dele, e não é apenas como amigo, então, por favor, não me peça para me afastar - Yunho ficou estático por um momento, absorvendo tudo o que Wooyoung dissera. Ele havia mesmo admitido que gostava de San desse jeito?

-Eu não vou me opor a nada. Só quero que você saiba onde está se metendo - retomou o mais velho, respirando fundo - Não me interrompa, por favor. É uma longa história.

"Eu e o San nos conhecemos desde pequenos. Nossas famílias eram bem próximas, sabe? Éramos um trio inseparável: eu, ele e a irmã dele. Estávamos sempre juntos, aprontávamos juntos, brincávamos juntos. Até que um dia isso acabou. Meus pais receberam uma ligação do hospital e nós saímos correndo no meio da noite. Eu tinha acabado de fazer 8 anos, então não entendia nada do que estava acontecendo, apenas seguia minha mãe que chorava de forma desesperada.

Um caminhão havia batido de frente com o carro em que eles estavam e os adultos morreram na hora. San e a irmã ficaram desacordados e foram levados às pressas para o hospital, mas ela não aguentou. Ele acordou quase uma semana depois, chamando pelos pais. Eu estava em casa quando isso aconteceu. Crianças não são permitidas em hospitais, como você deve saber, então meus pais se alternavam para ficar comigo em casa e com ele no hospital. Foi uma semana horrível esperando notícias. Eu ficava acordado até tarde, ouvindo as conversas dos meus pais escondido, já que eles não queriam me contar nada.

Antes mesmo do San acordar, meus pais entraram com um pedido de adoção. Engraçado, não é? Meu melhor amigo agora era meu irmão.

Levaram ele para casa sem contar sobre o que aconteceu. Ele perguntava todos os dias sobre o sr. e a sra. Choi, até que meus pais nos contaram a verdade, algumas semanas depois. Ele entrou em estado de choque. Se tornou recluso, quase não comia e não falava com ninguém. Passamos uma semana nisso, até que levaram ele em um psicólogo. Ele havia desenvolvido mutismo seletivo, Wooyoung. Com 7 anos, San perdeu a família e a voz."

Yunho soluçava baixo enquanto narrava uma das épocas mais sombrias de sua vida. Quando Wooyoung fez menção em dizer algo, ele o calou com um gesto.

-O tratamento não fez efeito, então começamos a frequentar aulas de linguagem de sinais juntos. Eu me tornei sua voz e seu protetor. Ele não é tão frágil quanto parece, mas sua mente sim. Mudamos de escola várias vezes por causa do bullying e de ameaças. A depressão de agravou com o tempo, assim como a insônia. Os pesadelos são daquela noite misturados com lembranças dos nossos tempos de escola.

"Por duas vezes ele desistiu de tudo. Destacou todos os antidepressivos da cartela mensal e tomou. Você não pode imaginar o meu desespero quando o encontrei desacordado no nosso quarto da primeira vez. Tínhamos 15 anos, era véspera de Natal e passamos o feriado no hospital. A segunda vez foi na noite da nossa formatura do ensino médio. Vodca e os antidepressivos de novo. Desde então, eu guardo os remédios e não deixo ele saber onde estão.

Se quer permanecer ao lado dele, Wooyoung, por favor, eu imploro, não brinque com os sentimentos dele. Não brinque com ele. Ele não merece mais dor do que já aguenta. Ele é alegre, gentil e inocente, mas também é uma pessoa quebrada que precisa de ajuda. Ele confia e gosta de você de um jeito muito sincero, então, por favor, não me faça te odiar e não o machuque."

Wooyoung sentiu um nó se formar em sua garganta e lágrimas se acumularem nos cantos de seus olhos. Aquela era a verdade por trás dos sorrisos de San. A dor que eles carregavam era algo que o mais novo nunca imaginaria. Aquela pessoa brilhante tinha feridas abertas tão profundas que afetavam todos ao seu redor, principalmente Yunho, que o via como um irmão.

-Eu também gosto dele de um jeito sincero. Nunca teria coragem de machucá-lo, não nessa vida. Eu vejo como ele é cheio de luz, mas também tem um lado que não mostra para ninguém. Eu quero ajudar, Yunho, quero ser parte da vida dele. Não me importo se acabarmos sendo apenas amigos, se ele encontrar alguém para amar que não seja eu. Ele merece ser feliz e eu quero ajudar a assegurar isso - a sinceridade que transbordava das palavras do menor fez Yunho ponderar por um momento, observando a expressão apreensiva do outro quanto à sua resposta.

-Eu não vou te impedir, Wooyoung. Só quero que tome cuidado - pediu, abrindo um sorriso triste. A atenção dos dois foi tirada da conversa quando ouviram batidinhas na porta da cozinha, onde um San de olhinhos inchados pelo choro e pelo sono estava encostado, bocejando.

-Bom dia, Sanie.

The Sound of Your VoiceWhere stories live. Discover now