O moleque que ria de tudo e vivia na sala da diretora finalmente estava pronto. Tão pronto que, se ela demorasse até o amanhecer, o perderia. Não era hora de recuar. Dênis estava certo. Podia ter só mais dez minutos de vida. Quando ficou roxa sem conseguir respirar e seu pai foi obrigado a chamar por emergência, a única coisa que pensou foram nas coisas que deixou para viver depois.

— Dênis — cochichou baixinho.

Silêncio. Finalmente tinha coragem, e esse moço dorme feito pedra?

— Dênis: — Ela tentou. — Dênis.

Sem sucesso, teve que se contentar com o dia seguinte. Deu meia-volta, pensando que era melhor ficar acordada do que perder sua última chance, e sentiu a mão grande puxá-la de volta.

Num golpe só, coisa de quem não precisa de olhos para entender a amada, ele a puxou por cima de si, a passando para o lado de dentro do sofá, o lado mais seguro e de onde ela não cairia.

Armadilha dupla: também não conseguiria sair.

Sem falar nada, sem implorar e sem esperar por ela, ele encostou seus lábios nos dela procurando derreter. Sentiu uma de suas mãos pequenas e frias na borda do rosto, de carinho manso, o carinho que ele sempre quis saber como era, e sorriu sem se conter.

Antes de ser mulher, Iracema é flor. Sentia os cantinhos dos lábios do amado se curvarem em sorriso e sentia o encaixe de coisa nascida para ser.

Deitados na sala do pai da moça, como dois adolescentes atrevidos, ela sentia o roçar do rosto masculino, o suspiro de moço adulto que não se contenta com beijos, e as mãos, macias como nunca antes, só feitas para cuidar.

— Eu te amo desde antes de você saber que eu existia. — Ela disse quando o beijo terminou. — Desde antes de saber seu nome. Te deixei ir uma vez porque sabia que aqui não era seu lugar. Você ia voltar para sua terra, fazer uma faculdade, tocar a vida e esquecer de mim. Esse era o plano.

— Como que te esqueço, anjo?

— Na hora que você voltou — Ela deu um beijo em seu rosto —, na hora eu soube que era um presente pra mim. Que tinha voltado por mim, que você seria meu.

— Mas você tinha que pisar primeiro um pouco, né?

— Te amo, Dênis. — Ela deu um beijinho em seus lábios, sorrindo, mais calma e feliz por ser correspondida. — Por favor, fica comigo, não vai embora não...

— Como que eu vou embora? Quase padeci de desgosto longe de você.

— Te amo.

— Não tá certo a moça dizer primeiro.

— Você já disse.

— Não falei, não.

— Disse, Dênis. Num dia qualquer você me ligou e disse antes de desligar.

— Pois foi?

— Quase que infartei.

— Digo de novo para não ter dúvida, Cema: te amo. Eu já te amava antes, faria o que fosse por um só beijinho teu. Eu sou doido, desconfie do que vou te dizer, mas agora... Parece que as coisas tinham que acontecer do jeito que aconteceram. Não dá pra viver mais sem ti. Fica boa para mim, se cura, amor, e dá um jeito de ficar sempre comigo, porque eu quero demais ser feliz do seu lado.

Então, com cuidado e carinho, ela beijou cada gotinha de lágrima que escorria do homem que ela queria por seu, e pediu desculpas por fazê-lo chorar.

— Foi o choro mais manso que já saiu, em toda a minha vida.


Um coração por CasalOnde as histórias ganham vida. Descobre agora