Depois de Nós

Dia 13 de janeiro de 1982

E tudo ficou branco novamente. "Já acabou? ", Daniel pensou, mas era ainda muito cedo para retornar. As visões se tornavam cada vez mais sólidas e o doutor se sentia mais uma vez dentro de uma máquina do tempo, a mais perfeita de todas: o pensamento.

Estava em uma cama branca, debaixo de uma coberta branca, em um quarto branco com várias cortinas ao redor, também brancas, o azulejo do chão era branco e apenas a roupa que usava era de tecido TNT azul. "Onde eu estou agora? ", passou pela sua mente. Tentou se levantar, mas uma dor lancinante tomou seu peito e seu braço esquerdo, uma grande pressão que o mandava de volta à cama, e um grito saiu de sua boca. Uma enfermeira abriu a cortina. Seu cabelo loiro chegava até a metade das costas, mas estava preso como rabo de cavalo, tinha olhos castanhos, era magra e possuía mãos finas. As memórias passaram a ser reais. Ela olhava para uma folha que tinha na mão direita.

- Quem diria, rapaz. – Levantou as sobrancelhas – Infarto.

- Infarto? – Vidrado na beleza da visitante.

- Isso aí. – Ela levantou o braço esquerdo dele e ele o puxou de volta – Dói, não é?

- É. – Nervoso.

- Sua mãe disse que estavam em um churrasco. – Balançou a cabeça, reprovando. – Tem colesterol alto, senhor...

- Daniel Viana. – Coçou a mão que formigava - Não que eu saiba, doutora...

- Michele Zaidan.

- Hum, deve ser árabe.

- Meu avô era. – Pegou no pulso dele.

- O que tá fazendo? – Ele tirou depressa.

- Checando o seu pulso.

- Claro...

- Vamos tirar um pouco do seu sangue, senhor Viana, para dar uma olhada no seu colesterol.

- Ok. – Voltou a coçar a mão enquanto a dor ia passando. – É doutora em quê?

- Sou nutricionista.

- Físico. – Estendeu a mão.

- Parece que vamos ter tempo para isso depois, doutor. – Sorriu e se retirou.

- Espera aí! Nem me passou o seu número!

Ela fechou a cortina enquanto ele sacudia o braço, como que para fazer o sangue voltar a circular.

E a visão se foi.