Ilomilo

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Corro no meio da rua.

Meu peito sobe e desce rapidamente, minha respiração se condensa no ar. A lua é luz que me permite ver o caminho, deixando a rua prateada de uma forma meio assustadora. Um cachorro late, me assusto, tropeço nos meus pés e caio no chão. Sinto a pele do meu cotovelo descolar, e o meu joelho também rala. Levanto sentindo as áreas atingidas latejarem. Volto a correr, o que se torna um ato um tanto quanto engraçado, já que manco de uma perna e limpo o cotovelo. Ao mesmo tempo.

Não, não tenho tempo pra parar. Nem mesmo pra pensar.

Corro mais rápido, mais rápido que o meu corpo permite. O fôlego já está se indo, fica cada vez mais difícil respirar. Só mais um pouco, você aguenta mais um pouco.

Um morcego passa perto da minha cabeça no exato instante em que chego ao meu destino.

De uma forma estranha, a casa branca com flores no jardim e nos umbrais parece mais solitária, mais vazia e mais sem vida. Não, é coisa da minha cabeça. Subo as escadas, e por fim, aperto a campainha. Ela soa por toda a casa, estridente e irritante. Quando penso em apertar novamente, a porta se abre. A irmã de Jhon é quem abriu a porta. A garota loira está segurando a porta, com lágrimas rolando soltas pelo rosto, junto com o muco nasal. Vejo novamente a cena, e então percebo que é a porta quem segura a menina.

Não. Não não não. Isso está errado.

Não falo oi, nem boa noite ou posso entrar, apenas passo pela garota e subo as escadas pulando os degraus. É engraçado como eu conheço tão bem essa casa, como se ela fosse a minha segunda casa. E de fato ela é. Até mesmo no escuro eu sei onde está cada coisa.

Chego a porta de Jhonatan, onde tem uma placa pendura escrita 'silêncio'. Bato com os nós dos dedos na madeira, como sempre faço antes de entrar no quarto dele. Espero, recebo o nada como resposta. Ele pode estar dormindo, ele pode estar tomando banho. Decido entrar, se ele reclamar eu tenho uma boa justificativa, não tenho?

Abro a porta lentamente. O quarto está escuro. Entro, mas não ligo a luz. Ele não está dormindo. Me sento na cama bagunçada, vendo o caótico quarto. Livros no chão, junto com roupa, sapatos, dinheiro e um prato. Um copo ainda cheio de água está em cima da escrivaninha, que também está bagunçada. A bagunça dele é algo normal para mim.

Quando meus olhos se acostumam a escuridão, presto atenção aos sons. Silêncio, apenas a minha respiração pode ser ouvida. Alta e estranha a esse ambiente tão quieto. Ele não está tomando banho. Onde Jhonatan está?

— Ele não está aqui. — Mika responde a minha pergunta silenciosa.

Mika, a irmã gêmea de Jhonatan está parada na soleira da porta. Ela já parou de chorar, mas ainda assim há tanta dor nela que me tira o ar.

— Onde ele está? — pergunto, respirando fundo.

Mika olha para os pés. Isso não é um bom sinal. Algo dentro de mim sussurra que eu não vou gostar da resposta.

— Onde ele está Mika? Eu devo saber. — pressiono a garota.

— Jhon está pendurado na velha árvore do parquinho. Ele se matou. — olho para a garota, olho procurando por algo que mostrasse que isso é uma piada de mal gosto.

Jhon e Mika sempre pregaram peças nas pessoas, então por quê agora não pode ser outra peça deles? Solto uma risada nasalada, uma risada que mostra o quão sem graça está sendo tudo isso.

— É sério Mika, onde está o Jhonatan?

— Enforcado. Se não acredita, vá ao parquinho. — e então ela sai.

Solto outra risada. Não pode ser verdade, ou pode? Não, não é. Está frio e Jhon sempre me conta para onde vai, e o que vai fazer, mesmo sem eu pedir. Ele não iria fazer isso comigo, com a família dele. Ou iria?

Não, não é. Não pode ser.

Me deito na cama dele, sendo recebida pelo cheiro de Jhon. Sabão e perfume amadeirado. Não, eu tinha que ter protegido ele, ele deveria ter me contado, ter me avisado. A não ser que ele me avisou, e eu não percebi. Amigos que ele precisou enterrar, ainda assim estavam bem vivos na cabeça de Jhon, foi o que ele me disse certa vez. E por quê eu não fui capaz de salvá-lo? Por quê não fui capaz de fazer algo?

Sinto frio, muito frio.

Jhon, por favor volte. Não chegue muito perto das estrelas, volte e me deixe dar o amor necessário para te fazer esquecer. Volte e me aqueça. Volte, eu não posso perder outra vida. Apenas volte, apenas... viva.

Billie Eilish - ContosWhere stories live. Discover now