Listen Before I Go

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Subo os últimos degraus de concreto, finalmente chegando ao topo do prédio onde moro. Há plantas aqui, plantas murchas e sem flores ou algo especial, assim como eu. Sou recebida por um vento frio que parece atravessar o meu corpo como flechas. Ando calmamente até a mureta de concreto, e observo o mundo a minha volta.

Prédios me cercam, grandes e majestosos, com outdoors pregados no terraço onde mostram propagandas de mulheres magras demais. Escuto sirenes de viaturas e ambulâncias, assim como gritos de pessoas e músicas. A floresta de concreto está acordada e bem viva. Um helicóptero da imprensa passa ao lado.

— Ray, por favor não faça isso. — uma voz que eu conheço bem fala.

Me viro, encontrando Ben parado ao lado da porta do terraço. Ele parece estar perturbado. Um vento forte passa por nós, fazendo com que a minha blusa grude em meu tronco.

— Hey Ben. — murmuro, respirando fundo o ar poluído e frio de Nova York.

Nova York, a cidade que nunca dorme.

— Me perdoa, me perdoa, mas por favor não faça isso. — Ben da débeis passos na minha direção, os olhos cinzas vermelhos e brilhantes por causa das lágrimas.

— Desculpas não podem me salvar agora.

Um espasmo de agonia passa pelo rosto dele, tão forte e latente que poderia me incomodar. Poderia, se eu sentisse algo. Se eu ainda sentisse algo além de, bem, disso tudo. Pego uma folha seca da planta ao meu lado, a observo e por fim a esmago com a palma da mão, sentindo prazer no ato.

— Eu preciso de você, eu preciso de você. — e na voz dele a algo tão verdadeiro, uma ânsia, uma agonia desesperada. Ben coloca as mãos na lateral do meu rosto, os longos dedos frios me fazendo olhar para os olhos dele. Cinzas e desesperados. — Eu preciso que você fique.

Uma lágrima solitária escorre do olho dele, e eu a pego antes que caia no chão cinzento.

— Você só vem me ver quando precisa de mim. — sussurro encarando os olhos de Ben. — Por que você não me deixa como sempre faz?

Sinto os dedos dele apertar as minhas bochechas, os olhos se comprimirem e mais lágrimas saem. Dessa vez deixo que role pelo rosto pálido, e que caiam no chão.

— Se você não queria que eu viesse, então porquê me mandou aquela mensagem? — o peito de Ben sobe e desce rapidamente.

Calma Ben, quem vai partir sou eu e não você.

— Acho que eu te devia explicações. Não quero partir deixando uma dívida para trás. — e então ele me solta, como se eu fosse um ácido.

— Então tudo isso não passou de uma dívida idiota que você precisava, o que? Debitar? — agora sim ele parece estar com raiva.

— Você não via dessa forma?

— Mas é claro que não, inferno! Eu não fiz nada daquilo apenas para você me dever algo. Você não consegue perceber? Você não consegue ver?

— Ver o quê? — sinto um peso no peito, que me faz respirar mais rapidamente.

— Que desde sempre você sempre foi tudo o que me importou. — o cabelo negro de Ben é bagunçado pelo vento. — Eu sempre te amei.

Prendo a respiração, feliz por estar escuro no ponto que estou. Ben não consegue ver as gordas lágrimas que escorrem pela lateral do meu rosto. Lágrimas frias e salgadas.

— Se me amasse, não me machucaria. Se me amasse, não me deixaria. — fico surpresa pelo fato da minha voz não ter saído trêmula, e sim firme.

Quantas vezes eu não chorei a noite até não poder mais? Quantas vezes eu já não cai terrivelmente, desejando que Ben estivesse ao meu lado? Ele nunca estava. Bem sempre me procurava quando ele achava conveniente. Quando tudo estava um mar de flores para ele, Ben vinha me procurar para me aninhar nos braços dele.

Não, não posso deixar que as lembranças me peguem de novo. Não agora. Preciso colocar um ponto final nisso tudo.

Me viro de costas para Ben, me aproximando mais do parapeito. Escuto ele soluçar.

— Sabe por quê eu escolhi o terraço? Eu queria ver o mundo uma última vez antes de partir. — fecho os olhos e inspiro profundamente. — Diga aos meus amigos que eu amo eles, e que vou sentir saudades. Mas não diga que pedi perdão, porquê eu não sinto muito.

Subo no parapeito, o vento aumentando cada vez mais. Olho para baixo, para as minhas roupas. Visto uma camiseta branca que tanto gosto, além de um short jeans e sapatos rasgados. Minhas roupas favoritas.

— Rachel, me perdoa. Fica, e me perdoa. Me perdoa. — lanço um sorriso para Ben.

Ben está chorando, nunca vi tanta dor antes nele. O nariz vermelho, os lábios inchados por terem sido mordidos para tentar refrear o soluço. Vejo que uma mão agarra o peito de dor, talvez ele esteja sentindo a dor características que eu sempre senti.

— Claro que eu te perdôo. — vejo que tirei um peso das costas dele, ele parece mais aliviado, mais esperançoso. Sorrio uma última vez, respiro uma última vez, olho para o céu negro e sem estrelas, apenas com a lua pequena e distante. — Adeus.

Sussurro, e deixo o meu corpo cair, sendo abraçada pelo vento, vendo o mundo ficar azul, deixando as dores para trás.

Billie Eilish - ContosWhere stories live. Discover now