SEQUOIAS

786 122 31
                                    

"Não ia machucar ele".

Eu fico surpreso ao ouvir isso, não são palavras proferidas, são rugidos baixos, mas que consigo distinguir e entender como palavras. A fera falando comigo. Ela está falando comigo! Talvez, antes, por eu estar a privando sempre, estando sempre com medo dela e com o que causaria aos que me rodeavam, eu não entendia a fera e nem queria. A via como um monstro e nada mais, um mosntro racional. Por isso eu vi ela dentro de uma caixa de vidro naquela grande planície escura com a mini lua sobre mim. Eu a separava de mim, e ela não queria se juntar a mim por conta disso. Quando ela assumia o controle eu quem ficava preso dentro daquela caixa de vidro, mas eu me via fora, em forma de fera. Eu que queria me prender. Me separar. Se eu tivesse tido racionalidade teria entendido que a fera e eu somos duas coisas ocupando o mesmo espaço ao mesmo tempo. Eu podia ter raciocínio estando em forma de lobo, a fera podia me ceder espaço como fez instantes antes de Lucas ter entrado no quarto. Ela sou eu. Eu sou ela. Quando ambos entendemos isso tudo ficou mais claro.

"Claro que ficou, pois eu sou você", disse ela na minha mente para mim mesmo. É como eu conversar comigo mesmo, só que com uma diferença de que, ao invés de você usar palavras mentais, você usa grunhidos e os decifra, tudo ao mesmo tempo. O choque não me nos faz parar e percebo que não estamos veloz, como se eu estivesse em um barco guiado por algo que ainda não faz sentindo pra mim.

"Você me entende?", pergunto.

"Você se entende?", solta ela e eu novamente noto que somos um e não dois.

"É confuso. A gente nunca conversou."

"Você nunca quis", dispara ela.

"Aonde vamos?", pergunto e vejo através dos olhos dela que a mesma está veloz por uma mata estranhamente clara e absurdamente cheia de pessoas. Em meio a todo o caos de cores, a do corpo humano se evidencia pelo brilho berrante, vivo, flamejante. Passamos há 30 centímetros de um homem que não nos vê devida a grande velocidade e também pelo fato de não soltarmos ruído algum ao nos locomover em tamanha disparada.

Ela grunhe algo que não entendo... mas sei que tem a ver com "perigo".

"Você atacou meu namorado", acuso e uma raiva faz com que eu rosne com raiva. "Sempre o atacou".

"Minha racionalidade não existia. É algo criada por você a mim no momento em que sentimos estarmos no mesmo ser", grunhe ela. Por Deus, estou conversando com ela. "É claro que você está. Somos um. Assim como você usa minha força quando humano, uso sua ciência quando fera, passei a usar agora. A compartilhá-la".

Paramos, por ordem minha, e ao fazer isso derrapamos uns 30 metros sob as folhas secas e o solo úmido cheio de musgo.

"Está me dizendo que desde sempre podíamos nos entender?"

"Não sei, sou parte da sua compreensão, nunca estive aqui com isso. Sempre segui nossos instintos", diz ela e sua/nossa pata alongada lhe/nos coça uma das orelhas, como um cão despreocupado.

"Você sempre quis causar danos ao Lucas, matou inocentes", digo.

"Sou um ser selvagem. Sou livre e sigo a lógica natural dos animais 'caçar e me alimentar'", grune tranquila e até mesmo entendiada.

"Mas eu amo Lucas. Se sou você, por quê diabos iria querer ele morto?", pergunto e voltamos a correr. Rápido, pulando em paralelo de uma árvore a outra, subimos um sequoia* de uns 30 metros em segundos. Nos acomodamos num dos últimos galhos e avistamos a cidade.

Meu Namorado É Um Lobisomem (Primeira Parte Finalizada. Pausado)Onde histórias criam vida. Descubra agora