Introducão: Breu

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A dor era muito forte. Não a mais forte que eu já experimentara em toda a vida, mas nesse contexto era a mais angustiante de todas. Eu não conseguia ver absolutamente nada. Não havia um flash de luz, não havia um sinal de vulto, não havia sombra, não havia noção de espaço, tempo ou lugar. Havia apenas essa dor latente na parte de trás da minha cabeça e minha mente tentando fazer algum sentido. Eu estava amarrado dos pés à cabeça e com uma mordaça na minha boca. Seja lá quem fora a pessoa responsável por esses nós, tinha feito com muita força e precisão. A pressão das cordas machucava a minha pele. Eu não podia ver mas tinha certeza que as marcas não eram suaves. Se eu fora espancado? Acredito que não. A despeito da dor na parte de trás da minha cabeça o resto do meu corpo aparentemente tinha sido poupado. Eu estava de roupas, outro bom sinal, eu supus. Mas onde eu estava? E como? E quando? E quem? Algumas imagens voltavam a minha cabeça.

Eu me lembro de estar dançando. Do gosto daquele drinque de abacaxi. Alguns empurrões. Luzes. Música eletrônica. Banheiro. Fila. O drinque de abacaxi estava muito bom. Eu deveria ir pegar mais depois de fazer xixi. Precisava muito mijar. Pego meu celular para olhar minhas redes sociais. Uma amiga do ginásio tinha comentado na minha última foto. Eu sorri. Que saudade da Fabíola. Ela era bem louquinha. Alguém esbarra em mim e meu drinque cai no chão. Era só alguém bem bêbado, tudo bem. Eu troco sorrisos com o pessoal da fila. Quem nunca esteve naquele estado não é? E essa fila que não anda. Precisava tanto fazer xixi. Toca minha música favorita. Que merda, as melhores musicas sempre tocam quando a gente está na fila do banheiro ou do bar. Falando em bar, preciso buscar mais um drinque daquele. Muito bom mesmo. Qual era o nome do drinque mesmo? Chegou a minha vez. Lembro de abrir minha calça, colocar meu penis pra fora para finalmente mijar e enquanto isso já peguei o pacotinho de Key dentro da cueca. Já aproveitaria para dar mais um tiro e curtir a noite melhor ainda. Uso minha chave e levo o pó branco ao nariz. Que sensação maravilhosa. Já tinha tomado uma bala há quase uma hora atrás então muito em breve eu entraria no meu estado favorito. Amazing. Era essa palavra que usava com meus amigos. "Thomas, e aí já bateu?" gritando no meio da pista "Bateu lindo, amigo! Eu to amazing" e muitas risadas. Queria ficar amazing. Termino de fazer xixi e guardo o pó de volta dentro da minha cueca. Ao sair, lavando a mão na pia do banheiro, olho pro espelho pra checar minha aparência e a aparência daqueles ao redor. Banheiro de balada é sempre o melhor lugar pra caçar. Na luz da pra ver direito se a pessoa é bonita ou só arrumadinha. E o que eu vejo é esse cara me olhando de volta. Cabelos e olhos claros. Pele branca mas não pálida. Usando uma camiseta branca sem estampa e um jeans surrado, mas claramente recém saído da loja. Lábios rosa e de textura suave, com o sorriso branco perfeito e o olhar mais charmoso que eu já vi no banheiro de uma balada em toda a minha vida.

- Não dá pala. - ele diz baixinho
- Oi?
- Seu nariz.

Olho no espelho e tem um pouco de pó branco no canto de uma das minhas narinas. Limpo imediatamente e dou um sorriso sem graça agradecendo.

- Quando eu faço eu uso a câmera do celular como espelho. É mais fácil de acertar.
- Pode crer.

Ele sai andando e eu fico ainda meio hipnotizado com a beleza dele. O efeito da bala começa a bater e eu não sei se é o Key ou a música mas eu me olhei no espelho mais uma vez, sorri e pensei: filhinho, você está amazing.

Tento me lembrar de mais coisas mas a partir daí são só alguns borrões

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Tento me lembrar de mais coisas mas a partir daí são só alguns borrões. Estou na pista de dança outra vez.  O cara do banheiro dança perto de mim. A gente troca olhares mais demorados. Agora estamos beijando. Ele sussurra algo no meu ouvido mas não lembro o quê. Ele tem um beijo delicioso. Seus lábios... Dançamos. Não ligo mais para as pessoas esbarrando em mim. Ele coloca alguma coisa na própria boca. Algum comprimido. Pergunto o que é mas nem espero a resposta e digo que também quero. Ele coloca um comprimido na minha língua. Beijamos. Ele me encosta num canto. O beijo dele é hipnótico. Minha vontade era de arrancar a roupa dele e chupa-lo ali mesmo mas obviamente não o faço. Enfio minha mão entre as pernas dele e sinto seu pau. A partir dali era só desejo e prazer ao mesmo tempo.

Os borrões ficam mais intensos. Lembro de entrar dentro de um carro. Lembro de chupar alguém dentro desse carro. Possivelmente ele. Qual era mesmo o nome desse garoto? Lembro de estar me sentindo tonto. Tonto. Tonto. Será que ia vomitar? Não da frente dele, por favor. Ele era o cara mais bonito que eu já tinha beijado na vida. Eu definitivamente não estava me sentindo bem. Olho pra ele e ele sorri. "Chupa, putinha" e força minha cabeça contra seu pau. Só me lembro dos calçados dele. Botas Dr. Martens  pretas com detalhes em amarelo. Foi a última coisa que vi antes de tudo virar um absoluto breu.

Mas agora, por que me amarraram? Talvez tenhamos sido assaltados e sequestrados durante o caminho para seja lá onde estávamos indo. Será que ele tinha me sequestrado? Ou será que também foi vítima? Talvez nem mais vivo ele esteja. Por que me amarraram? E essa dor na cabeça? Onde eu estava?

Ouço um barulho. Vozes distante. Passos. Um feixe de luz passa por baixo da porta e agora eu tinha noção de que havia uma porta ali. A porta se abre. A luz se acende. Estou no chão e a primeira coisa que vejo são as botas Dr. Martens se aproximando de mim.

Histeria Coletiva - Prazer e PerversãoWhere stories live. Discover now