Trinta e cinco - Alice

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Engoli em seco, sentindo meu nariz arder com as lágrimas que queriam vir. Eu não sabia o que devia fazer, se devia entrar ali ou não. Era como estar paralisada, meu coração batendo rápido demais, minha respiração ofegante demais para que meu corpo pensasse em fazer qualquer outra coisa que não fosse ficar ali, observando petrificada tudo aquilo.

Os guardas passaram por Jax largado no chão, e vi que um deles bateu a bota propositalmente em seu rosto. Jax grunhiu e eu respirei fundo.

Vivo.

Por mais que estivesse machucado ele estava vivo e se ele estava vivo ainda não era tarde demais.

Quentin esperou os guardas voltarem para perto dele para caminhar lentamente para dentro da torre. Ele rodeou o corpo de Jax devagar, quase como se estivesse sentindo prazer em vê-lo daquele jeito. Eu aposto que estava.

– Então... – disse ele. – O que vamos fazer com você? Será que deveria ser uma morte rápida?

Eu estava prestes a correr, a me jogar no pescoço no Quentin para tentar estrangulá-lo de alguma forma, quando a fada começou a falar.

– Você não p-pode – disse ele, meio ofegante, a fala entrecortada. – Se você matar Trent... A m-maldição se... se desfaz.

Alguma coisa se revirou dentro do meu peito. Quentin parou, observando a fada. Eu não sabia se ela estava falando a verdade, se estava blefando, mas a fada continuou.

– Tem certeza que v-vai querer arriscar? – perguntou ele, tremendo. – S-se a maldição se desfizer, você não será reconhecido como rei. Todos se lembrarão de quem é o verdadeiro herdeiro do trono, todos –

– Cale a boca!

Quentin começou a andar mais rápido ao redor de Jax, grunhindo, as mãos enfiadas nos cabelos como se não soubesse o que fazer. Talvez ele fosse acreditar na fada. Talvez fosse disso que Rumpel estivesse falando.

Sorri, olhando para a fada. Ela – ou ele, eu não sabia dizer direito – estava respirando pesado, os lábios retraídos.

Nossos olhos se encontraram. Parei de respirar, temendo que alguma coisa fosse acontecer. Antes era como se eu fosse apenas uma observadora, mas agora, com ele me encarando daquele jeito, senti que era parte daquilo. Uma conspiradora.

A fada sorriu e eu sorri de volta.

E foi quando tudo deu errado.

Algum dos guardas deve ter visto que ela estava sorrindo e olhando para o corredor. Ele se virou e me viu. Foi como se meu coração tivesse parado.

Tentei me levantar e correr, mas o maldito foi mais rápido. Ele não precisou dar mais do que dez passos para me alcançar e me segurar, apertando meu braço com tanta força que eu gritei. Foi naquela hora que Quentin se virou e, junto com a surpresa, juro que vi fogo queimando nos olhos azuis dele.

– O que ela está fazendo aqui? – ele perguntou, marchando na minha direção. – Ela devia estar presa no quarto!

– Me solta! – gritei, sabendo que era inútil. Mas se ele ia me pegar, se nada ia dar certo mesmo, pelo menos ia fazer um espetáculo daquilo tudo, ia fazer com que todos vissem, com que todos entendessem como Quentin era um ser humano miserável.

Quentin estava possesso. Seus cabelos estavam todos desgrenhados, o corpo todo dele subia e descia com a respiração. Quando ele chegou perto de mim e me puxou pelo braço, achei por um segundo que fosse entrar em combustão.

– Não sei como você escapou, Alice – disse ele entredentes, me arrastando. – Mas se veio até aqui, vai ver seu querido Jax desaparecer para sempre.

Comecei a socá-lo, estapeá-lo, mas era como se Quentin fosse alguma coisa inanimada. Ele simplesmente continuou me arrastando, apertando meu braço com tanta força que quase deixei de sentir minha mão.

Assim que atravessamos a porta da torre, ele me jogou no chão e meus joelhos bateram contra a pedra tosca, rasgando a pele. Estavam sangrando, meus joelhos e as palmas das minhas mãos, os hematomas no meu braço começavam a aparecer.

Ainda assim Quentin tinha me soltado, e consegui correr até Jax e me jogar ao lado dele.

Seu rosto estava todo inchado, o nariz fora do lugar por causa do chute que tinha levado, o sangue tinha secado em sua barba. Minhas lágrimas vieram. Eu corri os dedos pelo rosto dele, com cuidado para não apertar nada, para não fazer nada doer mais.

– Jax... - sussurrei, perto, tão perto. Dava para sentir a respiração, tão fraca, que vinha da boca dele. – Jax, vai ficar tudo bem.

Eu não sabia se estava mentindo por ele ou por mim. Talvez por nós dois.

Fechei os olhos e encostei minha testa na dele, minha mão sobre seu peito. Havia um coração ali, batendo fraco. Batendo. Aquele poderia ser nosso último momento e eu quase fiquei feliz por Rumpelstiltskin aparecer logo. Talvez ele pudesse tirar a dor, talvez pudesse viver sem um buraco na minha alma.

Foi quando eu senti o rosto dele se mexer. Era um movimento fraco e incerto, mas inconfundível. Ele estava tentando dizer alguma coisa.

– Jax?

Os lábios dele tremiam, as pálpebras tentavam se abrir.

– Jax, shhhhh.... Está tudo bem. Vai ficar tudo bem.

Ele continuou tentando falar e, quando finalmente conseguiu, a voz era rouca e entrecortada.

– A-lice...

Mais lágrimas começaram a encher meus olhos e eu as tirei dali com raiva. Estava cansada de chorar, estava cansada de tudo dar sempre errado. Jax mexeu os braços, muito lentamente, e colocou as mãos sobre a minha.

– Alice, eu... – ele engoliu em seco, depois tossiu, sangue respingando em sua barba. Ele respirou fundo, as lábios retraídos, olhos fechados. Quando os abriu, Jax os abriu de uma vez e alguma coisa dentro de mim soube que talvez aquela fosse a última vez. – Me... perdoe por nós não termos tido tempo se a maldição podia ser quebrada. Diga... -

– Jax, não!

Eu não queria que ele falasse, não aquilo. As palavras dele se pareciam muito com algo final, algo definitivo, e talvez se ele não conseguisse dizer aquilo, então talvez não fosse acabar, não fosse...

Os dedos dele apertaram minha mão.

– Diga ao Sebastian e ao Tobias... à minha mãe e a todos... que eu sinto muito. Que... – ele engoliu em seco, mais uma lágrima se desprendendo de seus olhos. – Que eu amo todos vocês. Eu... Me desculpem.

Ele fechou os olhos, ar deixando seu peito.

– Jax? – chamei.

Não tive tempo de esperar por uma reação dele, porque naquele momento Quentin me puxou para longe, tomou uma espada das mãos de um guarda e a enterrou no peito de Jax.

Coração de vidro [FINALIZADA]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora