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Meu celular não parava de tocar e eu mal conseguia prestar atenção na estrada. Com os olhos vermelhos e ardidos de tanto chorar eu tentava focar no trânsito na tentativa de sair daquele lugar de qualquer maneira, mas eu simplesmente não conseguia achar um jeito de encontrar a expressa e fugir dali.
Eu dirigi sem rumo por um bom tempo, não conhecia nada naquele fim de mundo e tive a impressão que estava dirigindo em círculos eternos, até finalmente chegar em um canto isolado de Tulsa que eu tinha certeza que nunca tinha visto antes.

Estava exausta e sem ar, então parei o carro na rua mesmo, enquanto meu celular berrava desesperado por atenção. Haviam pelo menos 20 ligações perdidas da Sara e outras tantas de um número desconhecido.

Assim que peguei o telefone, ele começou a tocar de novo e eu atendi
-Cris, o que aconteceu, mulher??
- nem me pergunte Sara..nem me pergunte porque eu não sei por onde começar

- O Taylor está ligando aqui igual um louco, tentando falar com você
Minha raiva voltou a tona
- você não deu meu celular pra ele né?
Eu levantei a voz e a coitada da Sara ficou quieta na linha
- puta que pariu Sara... não me diga que você...
- Cris, ele está desesperado, falou que você sumiu, eu não tinha outra opção se não dar seu número pra ele. Você não me atendia e ele fez parecer que era caso de vida ou morte!
Precisei me controlar para não descontar toda a minha ira na coitada da Sara

- Seguinte: se ele ligar de novo, diz que eu não tenho mais nada pra tratar com ele
- mas o que aconteceu, Cris?? Eu não estou entendendo nada...
Respirei fundo
- eu me demiti, Sara
- VOCÊ O QUÊ????
- me demiti, ok?!
- mas por quê? Isso não faz o menor sentido!!
- o Taylor... aquele...
A raiva aumentou ainda mais só de lembrar e lágrimas de frustração escorriam pelo meu rosto
- ele me agarrou, Sara. Aquele filho da puta pensou que iria rolar algo comigo.
- NÃO!!
- sim... no estúdio hoje cedo. O louco pulou em cima de mim do nada!
- Cris... eu não acredito que ele fez isso!
- E o pior... o Zac viu... ele entrou no estúdio bem na hora e viu tudo

Ela ficou muda na linha porque sabia muito bem o que tudo aquilo significava. O pouco que eu tinha compartilhado com ela era o suficiente para saber o quão fudida eu estava.

- Sara, olha, eu preciso ir..
- Me escuta Cris. Fala com o Zac...
Ela continuou na tentativa de amenizar as coisas
- você sabe que ele está me ignorando a semana toda, Sara. Ele me odeia e deixou isso bem claro na segunda feira..
- ele não te odeia, ele está com o orgulho ferido porque você fugiu dele
- puta que pariu Sara! EU NÃO FUGI
- ok... você deixou ele na mão porque estava com receio de estragar tudo e foi embora sem avisar...
Ela falou como se narrasse uma história  de cor.

- eu não vou discutir isso com você  agora. Eu tive meus motivos e você sabe muito bem disso! Agora, depois de hoje eu tenho certeza que ele não vai querer me ver nem pintada de ouro!
- mas Cris...
- eu menti esse tempo todo pra ele sobre o Sam. Ele acha que eu ainda estou namorando... ai eu virei as costas e deixei ele por conta da minha carreira e do projeto, deixei claro que o String Theory era mais importante do que tudo pra mim... e aí do nada ele pega o seu irmão em cima de mim, dentro do estúdio!!! Que moral eu tenho Sara? Hein? NENHUMA

- calma Cris, isso ai é tudo um mal entendido...
- você não conhece o Zac... não tem mais volta, Sara. E sabe o que é o pior disso tudo?? Por medo de errar de novo eu troquei o Zac pelo trabalho e pela minha carreira.. e o que foi que eu ganhei? NADA! Perdi o projeto e perdi ele
Eu comecei a rir de nervoso enquanto lágrimas ainda escorriam livres pelo meu rosto

-você não pode se demitir, Cris. Essa não é você! Pensa com calma, coloca as coisas em perspectiva. Essa não é a primeira vez que um cliente tenta algo com você
- exatamente! E aquilo quase me custou a produtora! O filho da puta colocou meu nome na boca de todo mundo e eu nem sequer havia feito nada!! Lutei tanto para apagar esse boato do meu nome, não vou sobreviver à mais um...
- não demorou tanto assim Cris. Você vai superar mais isso
- eu perdi o maior contrato que eu tinha e isso me fez voltar à estaca zero,  porra!

- eu só estou dizendo que não é o fim de tudo...
- olha Sara, não tô com cabeça pra isso agora. Eu vou desligar, ok?
- espera, Cris! Onde é que você está?
- eu não sei.. to presa nesse fim de mundo, procurando um jeito de voltar pra casa.
- você quer que eu vá te encontrar?
- não. Eu preciso de um tempo pra pensar. Quando eu puder eu te ligo

- Cris...
- oi?
O Taylor ligou um pouco antes de você atender e disse que está a caminho. O que eu faço com ele?
- não deixa ele entrar. Diz que eu não trabalho mais pra ele e devolve o cheque do pagamento dessa semana
- mas você não vai se arrepender disso depois? pensa bem ...
- não se preocupe Sara. Eu vou ficar bem

*******

Não sei se fiquei ali 10 minutos ou 2 horas, mas sei que a cada novo pensamento a vontade que eu tinha era de largar tudo pro alto e sumir de vez daquele lugar, nunca mais ouvir falar de Hanson, ou de produtora e começar do zero como garçonete do outro lado do país!
Eu lembro que quando comecei a tocar eu fazia aquilo por amor, a música era minha vida e nada mais me importava. Passei anos sonhando com a idéia de criar minha produtora e viver do que eu mais amava na vida.

Até que eu conheci o Sam. Éramos dois bobos apaixonados e eu cometi o erro de deixar um homem se colocar entre minha profissão e eu. A produtora estava no início e eu não soube lidar com a pressão que ele fazia. Por ele eu abri mão de possibilidades de crescimento, de sair do país, de fazer meu nome na indústria e me arrependo até hoje por conta disso.

Nesse meio tempo eu passei a ser assediada por um cliente poderoso, dono de uma grande gravadora internacional e influente no mercado.
Eu não cedi aos seu pedidos e ele quase me destruiu completamente. Eu era nova no mercado, ele era macaco velho, conhecia todos os cantos da industria. Perdi quase todos os meus clientes e a única coisa que eu ainda tinha era o meu relacionamento com o Sam, o resto era caos, prejuízo financeiro e sofrimento. Ele era o meu porto seguro e eu deixei isso me dominar e me privar de tentar voar alto, de me arriscar de verdade.

Eu havia prometido para mim mesma que nunca mais cometeria os mesmos erros de antes. Nunca mais permitira que meu nome caísse nas bocas de terceiros, prejudicando meu trabalho.  Lutei muito para ter minha reputação de volta e não iria abrir mão disso novamente. Também prometi que nunca mais me permitiria ter que escolher entre um homem e minha carreira... e eu falhei miseravelmente em ambos.

Meu telefone continuava a tocar, desta vez o tal número desconhecido, que só poderia ser do Taylor. Em um ímpeto eu baixei a janela com a intenção de jogar o aparelho no meio da rua, mas parei ao ver que do outro lado da rua estava o Zac, todo suado, saindo da academia com cara de poucos amigos, fone de ouvido e mochila nas costas.

Meu coração parou de bater por um instante. Qual a probabilidade de eu ter dirigido esse tempo todo em círculos e ter parado logo aqui, de frente à academia que ele frequentava?!
Respirei fundo enquanto minha cabeça explodia em diferentes pensamentos, cada um contradizendo o outro. Ora me pedindo para ir atrás dele, ora me mandando dar partida e sumir dali de uma vez por todas.

Antes que eu pudesse tomar qualquer decisão, vi uma garota saindo da mesma academia, vestida com o que parecia mais um desfile de moda fitness do que roupas de academia de fato, correndo atrás dele.
Eu a reconheci no mesmo instante... era a mesma garota que ele havia beijado na segunda feira.

Senti meu coração pesado quando ela o alcançou. Zac tirou os fones de ouvido e começou a andar junto com ela na mesma direção, trocando poucas palavras enquanto ela fazia de tudo para chamar a sua atenção.
Fiquei ali, pela segunda vez na mesma semana, no que parecia ser um deja vu dos infernos, observando os 2 caminhando lado a lado, até que ele chegou na sua caminhonete azul no estacionamento do outro lado da rua.

Eles estavam juntos. Eu sabia... era óbvio. Enquanto ele jogava a mochila no banco de trás, ela se acomodava no banco do carona, sorridente, observando cada movimento dele, toda apaixonadinha.
Ele entrou no carro e ela se inclinou para beijá-lo. Foi rápido, um selinho apenas, mas o suficiente para acabar com o pouco de esperança  que ainda me restava... eles estavam juntos, e eu era passado pra ele.

Esperei ele ligar o carro, dar ré e sair do estacionamento para então eu soltar a respiração que eu nem sabia que estava prendendo, e relutantemente fazer o mesmo.

Musical Ride - Concluída Onde as histórias ganham vida. Descobre agora