Capítulo 29 - A conversa

3.6K 295 5
                                    

Segunda-feira pela manhã. Se eu dissesse que estava tranquila, seria mentira. Pensei sobre a suposta conversa com a diretora por um largo tempo, antes de cair no sono e, como se não bastasse, foi o primeiro pensamento que tive ao acordar.

Aquilo era estranho, eu estava nervosa mesmo colocando em minha cabeça que, se quem eu amo for um problema ao meu emprego, eu não me importaria em perde-lo. Acredito que a teoria e a prática eram diferentes. Apesar de saber a ordem de importância, eu não queria perder meu emprego, eu estava me dando bem com aquilo.

Giovana começou a se mexer e eu resolvi terminar de acorda-la:

- Bom dia, amor.

Ela me encarou sem abrir os olhos, apenas tentando encostar seus lábios nos meus. Após conseguir, disse, abrindo os olhos:

- Bom dia, linda.

Percebi em sua expressão que ela também estava cansada. E preocupada. Aliás, como poderia ser diferente? A tensão estava tomando conta daquele lugar minuto-a-minuto, até que saímos de casa, em carros separados, e fomos até o colégio.

Chegando na sala dos professores, como de costume nas segundas-feiras, estávamos sozinhas. Contudo, não tardou muito até que ouvimos passos se aproximando: era Lúcia.

- Bom dia, meninas. - ela disse.

- Bom dia! - respondemos quase juntas.

- Bárbara, será que podemos conversar por um minuto?

- Claro, Dona Lúcia! Agora mesmo?

- Se não estiver ocupada...

- Por mim, agora é perfeito. Só preciso guardar estas provas.

- Então ótimo. Te espero em minha sala.

Ela saiu da sala e podíamos ouvir o barulho de seu salto se afastando cada vez mais. Lúcia não parecia tão irritada, mas tampouco parecia feliz. De qualquer forma, eu deveria encara-la.

- Me deseje sorte - eu disse, tocando a mão de Giovana e lançando um sorriso tímido para acalma-la.

- Boa sorte!!

Pisei fora da sala dos professores, respirei fundo, e caminhei até sua sala.

- Dona Lúcia...

- Bárbara, sente-se. - falou apontando para uma das cadeiras à sua frente.

- Com licença - eu disse enquanto me sentava.

- Bárbara, quero tratar com você um assunto que é meio delicado. - pausou, observando minha reação.

- Pois não, Dona Lúcia... - incentivei-a

- Chegou ao meu conhecimento uma reclamação a respeito de seu comportamento e da professora Giovana. Você poderia me explicar qual o tipo de relação que vocês têm?

- Desculpe. Reclamação? Independentemente de qualquer coisa, posso garantir-lhe que nenhuma atitude ou comportamento seja cabível de reclamações.

- Certo. A verdade é que me foi dito que você e a srta. Giovana estão... Juntas. Esta informação procede? Porque se for real, você precisa saber que isto pode acarretar problemas, não só para vocês, mas também para o colégio.

- Dona Lúcia, sim, eu e a Giovana estamos juntas. Eu posso imaginar a origem de sua preocupação e não posso deixar de lhe dar razão, acontece que em nenhum momento estamos fazendo algo errado ou que possa causar algum problema para qualquer pessoa deste colégio. - neste momento, lembrei da cena do banheiro na última sexta-feira, mas engoli a seco e continuei - Eu tenho plena certeza de quem foi que trouxe esta informação até a senhora e posso dizer que a motivação para isto foi outra, não existe a mínima possibilidade de ela estar realmente incomodada com nossa relação.

- Você precisa entender que a situação é sensível e, apesar de não existir nenhuma regra ou lei que impeça a relação entre dois funcionários, é algo que pode trazer consequências maiores e complicadas posteriormente. E se, por acaso, vocês brigam?

- Dona Lúcia, eu e a Giovana somos duas mulheres bastante adultas e maduras. Com certeza, caso houvesse alguma discussão ou até mesmo um rompimento, saberíamos dividir isto de nossa vida profissional. Entretanto, entendo seu ponto de vista, e como deve ser delicado em sua posição saber como lidar com esta situação.

- Exato, é bem complicado...

- Bem, eu gostaria de esclarecer que eu e a professora Giovana estamos bem juntas e eu não seria capaz de romper o que temos pelo simples fato de ser confortável para nosso local de trabalho. Sendo assim, se a senhora julgar necessário que eu seja dispensada, eu estou de acordo com a decisão.

Lúcia estava um pouco surpresa com a minha resposta. Será que ela pensou que eu iria implorar para que ela não nos demitisse? Ou pode ter pensado que nós duas estávamos apenas nos divertindo, sem nada sério e, na primeira ameaça, aceitaríamos abrir mão da relação...

- Bárbara, eu conheço bem a sua família, conheço você desde pequena e sei que seu caráter e palavra valem muito. Eu posso te dar um voto de confiança, e ter a plena certeza de que, continuando as duas aqui, vocês não terão nenhum tipo de crise que afetará seus desempenho profissionais?

- Eu garanto que honraria minha palavra se este voto de confiança me fosse dado.

- Então, assunto encerrado. - pude sentir que aquela decisão estava sendo improvisada, mas que ela realmente acreditava em mim.

- Agradeço sua confiança, Dona Lúcia. - disse ao levantar-me.

- Bárbara, você e a Giovana são boas pessoas e excelentes profissionais. Espero que dê tudo certo. - sorriu em minha direção. - Ah, eu pretendia conversar com a Giovana também, mas agora não vejo muito sentido, então posso ter sua ajuda para repassar a ela o que foi comentado e decidido entre nós?

- Pode contar com isso. Até breve, Lúcia. E, mais uma vez, muito obrigada!

Caminhei novamente em direção à sala dos professores, carregando uns 300 kg a menos do que quando fiz o caminho inverso. No final, não é que realmente tinha dado tudo certo?

No meio de tudo, Você!Onde histórias criam vida. Descubra agora