Caio ergueu os olhos da frase pela metade na tela do seu computador e observou Cauã com as sobrancelhas erguidas, surpreso.

— Vai dar tudo certo – tranquilizou o amigo, dando um chutinho em sua cintura com a lateral do pé – Vocês vão se divertir muito, você vai ver.

Cauã lhe ofereceu um sorriso agradecido.

— Obrigado – os dois ficaram em silêncio por alguns segundos – O que eu faço se ficar em silêncio? Tipo... muito silêncio? Quando eu fico nervoso, às vezes fico sem assunto. Você tem algum conselho?

Caio suspirou.

— Tão inocente... – revirou os olhos – Querido, nós vivemos na sociedade da informação. Você passa o dia inteiro no Facebook. Simplesmente fale alguma coisa sobre a última postagem que você leu e siga a partir daí.

Cauã pareceu pensar a respeito das palavras do amigo.

— Okay – casualmente, olhou o relógio de pulso – Nossa! Já preciso ir para o metrô. Obrigado pela camisa! Depois eu te devolvo sua roupa, está bem?

— Claro. Não se preocupe com isso.

Cauã sorriu e acenou uma última despedida antes de sair do quarto, fechando a porta às suas costas. Caio observou a porta fechada com um sorrisinho orgulhoso e, depois, voltou a se dedicar ao seu artigo.

São Paulo, 26 de maio de 2018

A missa de sétimo dia de Cauã Costa estava repleta de rostos conhecidos, e isso deixou Caio feliz e triste ao mesmo tempo. Era bom ver como o amigo era amado por diversas pessoas, mas sempre que se lembrava que era a morte dele que havia reunido todos ali, sentia o coração apertado.

Muitos alunos ocupavam os bancos da Igreja, até mesmo alguns que Caio sabia que eram ateus e, ao fim da missa, todos se aproximaram para prestar as condolências aos pais de Cauã. Elisa até mesmo fez uma ligação para que Vitória, uma das alunas que tinha uma doença rara e dificuldade de locomoção, pudesse falar algumas palavras gentis para a família.

Na prática, a única pessoa que não estava lá era Fernando, que tinha avisado que não conseguiria ir porque tinha planos com o pai, que não sabia nada sobre sua relação com Cauã. Bruna tinha ficado incomodada com isso, mas Caio tinha aprendido há muito tempo a não julgar a forma como as pessoas lidavam com os próprios sentimentos.

E, neste sentido, Fernando era um caso bastante complicado.

Ele ficou parado a alguns passos da família Costa, observando enquanto as pessoas começavam a se despedir deles, até que o interior da Igreja estivesse praticamente vazio.

— Bom... – Bruna se aproximou, os olhos castanhos molhados – Nós estamos indo para casa.

— Eu dou uma carona para vocês – Caio ofereceu.

— Não, imagina! – A jovem descartou sua oferta com um abanar de mãos – Moramos aqui do lado.

— Eu insisto – o rapaz respondeu – Eu posso aproveitar e pegar algumas coisas minhas que estavam com o Cauã.

Esse argumento convenceu Bruna, que voltou para conversar com os pais. Em questão de minutos, os quatro estavam dentro do carro de Caio num trajeto curto e silencioso, interrompido apenas pelas eventuais fungadas de Cida.

O rapaz conseguia sentir ali o peso da morte de Cauã.

No passado, Caio tinha frequentado a casa do amigo em várias ocasiões. Sabia que eram uma família unida e se recordava de jantares sábado à noite em que todos se sentavam à mesa na sala e conversavam animadamente sobre diversos assuntos, enquanto dividiam uma pizza.

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⏰ Last updated: Apr 20, 2022 ⏰

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