Raiva

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Capítulo 13

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Lembrei que tinha lido em algum lugar que a dor é a única emoção que não usa máscara. 

(Caio Fernando Abreu)

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Oreki expirou a fumaça de seu cigarro morosamente, vendo-a desvanecer diante da face. Sentado despojado e solitário no sofá, sentia dificuldade para nomear o que sentia. Ele nunca ouvira algo como aquilo...

Eu senti suas mãos frias em meu pescoço

Lançando-me em um insaciável abismo 

Durante o almoço, a breve distância de sua convidada permitiu ao vocalista reconhecer estar enciumado. O sentimento o incomodou ainda mais quando Satoshi fez questão de recebê-la sozinho na sala, alimentando suas incômodas fantasias. Eles teriam se beijado outra vez? Talvez o guitarrista estivesse cada vez mais perto de fazê-la se apaixonar... Só de imaginá-lo alvo da atenção daqueles belos olhos verdes, Oreki precisava deter seus primitivos instintos. 

Nos minutos em que os aguardava, percebendo a si mesmo, o vocalista assumiu que devia urgentemente ignorar as malditas sensações que Kayla lhe despertava. Ele devia parar de agir como um idiota e deixá-la fazer o que quisesse de sua vida pessoal, porque não tinha nada a ver com isso.

Mas a maneira como ouvira sua voz através da porta entreaberta do quarto, embalando cada sílaba daquelas palavras dolorosas, não saía de sua mente. Não o abandonava! E isso era muito pior do que tê-la à sua frente, tão próxima, e não poder expressar seu interesse por Kayla para manter sua lealdade como amigo. Era muito pior do que imaginá-la nos braços de um estúpido Trevor ou aceitando ao convite inconveniente do Satoshi.

E o meu ódio crescente pareceu de repente

Sufocante demais para mim

Remexendo-se no sofá, o olhar castanho fixou-se no teto pálido e só o que Oreki via eram as lágrimas dançando na expressão melancólica de Kayla. As lembranças de sua observação silenciosa pareciam presas em suas retinas, repetindo-se mesmo que fechasse as pálpebras ou se esforçasse para pensar em outra coisa. Ele definitivamente nunca ouvira algo tão comovente, miserável e ferido!

Seria possível que aquelas palavras narrassem parte de sua história? Quem era a protagonista daquela trama tétrica?

— Oreki? — A voz da ruiva chamou-o com docilidade, mas o vocalista não ousou desprender sua atenção do teto.

Levando o cigarro amentolado aos lábios, limitou-se a tragar a composição tóxica e torcer para que Kayla não percebesse o que estava temendo agora.

Oreki temia que aqueles malditos olhos verdes pudessem ver através dele. Ele temia que Kayla soubesse, de alguma forma ilógica, que estivera à porta do quarto observando-a sem convite.

Ele temia, especialmente, vê-la tão quebrada como há poucos minutos e não evitar dar voz ao que queria indagar agora: "você cantou o seu passado?"; "aquela dor... você ainda a sente?".

— Está tudo bem? — A forma como a pergunta dela soou, vacilante e insegura, o fez se arrumar lentamente e pousar seu foco sobre ela.

Com sua crueldade e personalidade doente

Você roubou meus sonhos, deu-lhes fim

Não havia nada na expressão serena que revelasse o pesar flagrado naquele quarto. Nada além das pálpebras levemente inchadas, que estavam facilmente camufladas com a maquiagem escura. Se ele não a tivesse visto chorando, nem notaria. Sequer saberia de seu coração em cacos.

A Garota DelesWhere stories live. Discover now