vingt trois

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   — Minha culpa, minha culpa... — murmurava baixinho repetidas vezes, entre fungos e soluços sôfregos. — O meu dever é lhe proteger. Eu n-não protegi. Eu fui um i-inútil não? Eu sei!

O loiro mantinha o rosto de Marinette próximo ao seu pescoço e o resto de seu corpo em seu colo, suspendido pelo enlace forte dos braços de Adrien ao seu redor. Ele sempre quis estar rente a ela dessa forma, fitando aquelas grandes safiras e especialmente o sorriso mais dócil que já vira em toda sua vida enquanto cuidava da mesma com todo o carinho que poderia lhe dar. Mas nunca esperou que fosse ocorrer dessa maneira. Nessas exatas circunstâncias.

O seu lamento encontrava-se tão profundo que nem reparou que os apitos de seu anel se cessaram, logo retornando em sua forma civil. Tão patética, tão sentida.

Plagg baixou os minúsculos olhos, sentindo um solene remorso, atribuindo grande parcela da culpa para si mesmo. Afinal, como pôde ser tão negligente? No entanto optou por não proferir nada naquele momento, dando espaço para o garoto, permanecendo em seus cabelos, numa espécie de apoio demonstrando que o kwamii estava lá ainda por ele.

Passaram-se algumas dezenas de minutos, o que pareceram muitas horas, até que Adrien enxugou o excesso de lágrimas de sua face e olhou para a azulada. Percorria seus dedos direitos ainda trêmulos pelo seu rosto afim de drenar o molhado de seu pranto, vislumbrando cada detalhe, com seus lábios se movendo num mínimo sorriso de encanto. A beleza de Marinette era sublimemente esplêndida.

Plagg remexeu-se suavemente em sua cabeça, mas suficiente para Adrien ter um choque de realidade, piscando várias vezes para sair daquele quase transe super-paixonite que acabara tão rápido quanto começara. Ironicamente voltou a vista nas orelhas dela.

Desnudas.

Sem os brincos. Claro.

Merda. — balbuciou.

— Já... Já está melhor garoto? — o kwamii se manifestou acanhado, depois de flutuar até sua frente, vendo o rosto dele se tornar quase inexpressivo. Quase sombrio.

— Eu sou um inútil Plagg.

— Não Adrien, claro que não. Foi uma armadilha tanto pra ela quanto você, você sabe! Você não tem culpa alguma.

O esverdeado ainda incrédulo demais com a situação, na verdade mais ignorou o que o kwamii acabara de dizer, pensando ainda no ocorrido.

— O filha da puta finalmente conseguiu... — fez uma pequena pausa. — Hm, desculpa mãe. — murmurou libertando um suspiro exausto. — Mas... O que acontece agora?

Plagg fitando os olhos avermelhados e temerosos do menino, baixou a cabeça diminuta, como se estivesse pensando. Todavia logo disse seriamente:

— Baseado nas minhas apostas... Algo bastante grave. Maior do que você imagina Adrien. — divagou complacente. — Mas o meu conselho pra agora, é se esconder com ela, pelo menos até a poeira baixar.

Ele sentiu o coração se apertar mais um pouco com a ideia.

— E quando ela acordar? — torceu o nariz. — Só espero não haver nenhuma chapinha ou algo perigoso por perto.

~•~

O fato de ser um Agreste até que ajudava em alguns momentos. Tipo este.

Adrien agradeceu o seu esquecimento, assim deixando-o com uma boa quantia em dinheiro e um cartão que ele dificilmente usava na sua carteira já que, bem, não era de sair para gastar. Desse modo, o plano era seguir para alguma localização improvável e se instalar em algum modesto hotel apenas por um ou dois dias. Então seguiu para Porte de la Chapelle, que não era longe de Puteaux, ficava nas arredondezas de Paris, na 18th arrondissement, tornando a probabilidade de serem encontrados diminuir — ou esperava por isso ao menos. Havia desligado o serviço de localização do seu celular e desligado o aparelho de Marinette, apenas por precaução.

Achou um hotel estreito que parecia o mínimo do decente entre os que via, simples e, rústico digamos. Um curioso leve odor de cloro, lavanda e cigarros, com algumas plantas mortas e quadros empoeirados. Madeira gritando por sua existência nos móveis, piso, balcão, uma escada no canto direito e tudo possível, menos nas paredes, que possuíam uma tinta bege descascando. Falando em balcão, havia um homem careca e franzino, de estatura alta usando uma camisa floral e bermuda caqui. Em seu rosto lasso, uma barba ruiva misturada com os insistentes fios brancos em destaque com seus olhos castanhos desvanecidos, mexendo em um celular antigo.

Ele obviamente estranhou o jeito esquisito de agir de Adrien porque ele naturalmente não sabia atuar, e, claro, uma garota desfalecida em seus braços. Mas justificativas de bebidas e uma quantia um tanto mais generosa resultou em duas chaves na mesma hora.

Abriu o primeiro quarto, composto de uma cama de casal acompanhado de uma mesinha ao lado, uma TV no mínimo analógica suspensa na parede, e um papel de parede brega revestindo as paredes. Mas até que o cômodo cheirava bem.

O loiro posicionou Marinette na cama tal qual uma pluma delicada, adquirindo uma posição mais confortável para a mesma ao arrumar o médio travesseiro. Até que finalmente pôde respirar, cobrindo o rosto com as mãos como sinal de redenção.

Sentindo-se totalmente esgotado, não resistiu ao ato de se sentar na cama ao lado de Marinette, coçando o nariz e estalando o pescoço, um antigo costume que tinha. Alguns pontos do seu corpo doíam, provavelmente por conta da luta. Torceu a boca com a memória. Um lado seu até desejava ter ativado o cataclismo, entretanto as coisas seriam piores ainda.

Ele se situou perdido em seus pensamentos. Não sabia nem o que sentia ao certo. Um misto de apatia, cansaço, preocupação, raiva, receio... Contudo o mais provável era estar no estágio de maior indiferença, por conta da sua exaustão em todos os sentidos possíveis. O dia com toda certeza fora mais extenuante que o esperado, somado da preocupação com um futuro mais iminente do que temia. É como Morrison dizia: o futuro é incerto e o fim está sempre perto.

Adrien massageava as têmporas enquanto olhava para o nada, o sono quase dando-lhe pancadas internas fazendo seus olhos mais pesados do que nunca. Então despretensiosamente observou o quanto estava bem próximo de Marinette. Se duvidar, até conseguia ouvir sua respiração tranquila, cujo momentaneamente o transferiu uma sensação afável no seu peito amargurado. Incrível como aquela doce criatura mergulhava em seus devaneios, mesmo em sono profundo. Ali, naquele momento, enfim ele achara algum período de remanso, embora provisoramente. Afinal, pelo menos ela estava com ele, protegida, acolhida, antes de vir a tempestade.

E com esse fato, deixara o cômodo com a constelação dentro de si mais amena.

~•~

Marinette pensou que iria ficar cega. Ou então que chegara o momento de sua morte e entrada para o céu.

Quando voltou ao breve estado de consciência, ao abrir os olhos, havia um clarão intenso, que a fez fechá-los instantaneamente. Sua cabeça dera tantas voltas, ela se sentia entorpecida. Se Deus a desejava no outro lado, essa era a hora.

Acreditando devotamente na sua partida para o além, tentou mais algumas vezes permanecer com suas safiras abertas, piscando freneticamente até se acostumar com o local e enxergar mais nitidamente. Contudo não havia nuvens. Nem um infinito e límpido céu azul. Portões dourados, reluzindo do mais perfeito ouro. Ou anjinhos flutuando com suas imaculadas asas e áureas cristalinas. Somente havia... bege. Muito bege. Cafona, diga-se de passagem.

Levantou-se até ficar sentada, esfregando os olhos e ainda desacreditada. E sonolenta. Muito sonolenta. Sua cabeça poderia despencar de seu corpo a qualquer momento de tão pesada que estava.

Sua vista aos poucos ia se adequando ao local, as formas ópticas estranhas sumindo lentamente a medida que uma incógnita se formava em sua confusão mental.

"Mas que porra é essa?"  Únicas palavras que pensou com clareza.

Suas lumes seguiam de acordo com a análise do lugar. Bom, era um quarto. Um abajur vintage e sacolas na mesinha ao lado da sua cama. Um minúsculo e vazio armário amadeirado a sua esquerda. Papel de parede bege desgastado ao seu redor. Uma televisão antiquada provavelmente desligada já que sua tela estava escurecida na sua direção. E só. Não era a sua casa.

Os seus olhos tornaram-se inquietos, piscando algumas vezes ao olhar para o seu colo. Tirou o lençol branco, e suas roupas ainda aparentavam estar intactas. Franziu as orbes azuis e caóticas, avistando as sacolas, que apesar de seus sentidos se encontrarem ainda obsoletos, suspeitava de haver um bom cheiro oriundo de lá.

Era comida. Boa por sinal. E bem cheirosa.

A porta do quarto fora aberta após suaves batidas, com uma pessoa entrando toda vestida de preto. Marinette se assustou, apenas cobrindo o corpo com o lençol em resposta. O indivíduo arregalou um pouco os olhos em sinal de surpresa, porém sorriu tímido em seguida. Ele estava vestido de gato preto. Ela riu.

— Hm, oi Marinette... — disse num tom envergonhado. — Está melhor?

A azulada o encarou por algum tempo praticamente inexpressiva (no chute o examinando), fato que deixava Adrien suando frio a cada segundo que passava. Ela era o amor da sua vida, mas o amor da sua vida mais imprevisível que existia. Portanto arquitetou cada objeto que ela poderia jogar nele, como a comida, o abajur, o controle da televisão no lado oposto dela, etc.

No entanto, a sua única reação foi esboçar uma tênue curiosidade:

— Por quê meu sequestrador 'tá vestido de gato? — questionou com a voz baixa e rouca, e pendeu a cabeça para o lado, ainda o averiguando com o olhar.

Ela parecia uma criança perdida.

— Eu sou o Chat Noir. O herói de Paris. O único e mais puurfeito que existe. — ela continuou com aquela expressão, não entendendo a sua tentativa de auto identificação. — Eu sou seu amigo... — dor. — E não te sequestrei.

Ela acenou a cabeça vagarosamente, como se tentasse assimilar. Ele se via tendo que falar bem como estivesse explicando algo para uma criança. Céus, ela realmente estava grogue.

— Você abusou de mim e deixou comida pra mim Chat Noir?

O loiro inflou as bochechas, virando rosáceas instantaneamente.

— N-não, não fiz nada com você e nunca faria, sério, não se preocupa. — respondeu um tanto atrapalhado, gesticulando exasperadamente. — E sim, a comida é para você. Também não tem nada, ela está totalmente segura, pode confiar.

A azulada piscou, e apenas deu de ombros. Ao pegar as sacolas de plástico brancas que continham vasilhas de isopor em seu interior, se deu conta do quão seca sua boca estava. Adrien notara sua cara em desgosto.

— Quer alguma coisa? Água? — ela concordou.

Ele correu para apanhar outra sacola lotada de garrafinhas. Deu-a toda para a mesma, que rapidamente já estava sendo atacada. Marinette quase acabou com uma garrafa inteira em questão de segundos. Essa circunstância acendeu uma "lâmpada" em sua mente. Era de fato o que ele julgava.

— Bem, um momentinho. Vou aqui no quarto ao lado rapidinho.

Chat anunciou, observando ela dar de ombros novamente, já mordendo seu hambúrguer e deixou o lugar.

Após uns três ou quatro passos, já dentro do seu quarto, se destransformou. Plagg o via com uma interrogação em sua obscura face, enquanto o loiro permanecera com a mão no queixo como se estivesse refletindo por alguns segundos. Em seguida ele chocou as duas mãos uma na outra, uma em forma de soco e a outra amortecendo o ato, indicando veredito.

— Não tem como falar com ela ainda Plagg. Seria informação demais, pra esse estado no mínimo delicado. Pelo menos minhas suspeitas estavam certas.

— Sinceramente, do jeito que ela 'tá, poderia até aparecer como Adrien que ela não iria distinguir. Mas ao invés de perguntar por que você está vestido de gato, seria por que estaria vestido de modelinho falso. — respondeu se deitado no ar, arrancando um bufão do loiro.

— Ha ha ha ha, que engraçado Groucho. — ironizou uma risada enquanto o kwamii revirou os minúsculos olhos. — Mesmo assim, foi melhor evitar. Talvez ela vá relembrando aos poucos, só o que espero.

— Se está esperando por isso, é porque não vai acontecer. — Plagg cantarolou.

— Sabe, a cada dia que passa eu realmente entendo porque você é um gato preto.

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Oi meus amores!

Eu sei que apareci totalmente de supetão, talvez alguns queiram me atacar com uma chapinha kkkk. Qualquer coisa eu juro que posso explicar, sabe, ter um papinho com vocês novamente. E por falar nisso, eu não tenho palavras pra descrever o quanto fico feliz da fic crescer apesar do hiatus, sinto muito para os leitores posteriores. Fico até envergonhada de aparecer aqui, mas enfim kakakak. O importante é que estou tentando recompensar com capítulos de 2 mil palavras embora enferrujada, viu, estou tentando. 

Por falar em capítulos, tenho que informar que irei viajar por uma realização pessoal incrível. E logo em seguida vai voltar minhas aulas, e eu sou uma pobre estudante de química sem vida. Mas fé que vai dar tudo certo.

Estou muito curiosa caso tenham alguma teoria a respeito do final, já que segredinhos serão revelados onde creio que nossos heróis não vão gostar nenhum pouco hihi.

Anyway, espero que tenham gostado!

Bxs sz.























Chegaste ao fim dos capítulos publicados.

⏰ Última atualização: May 22, 2018 ⏰

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