Capítulo 17

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26 de abril

— Luís, espera. — Laura, carregando sua própria mochila e a do garoto que, na pressa, esqueceu na sala do Diretório Acadêmico, tentou equilibrar todo o peso extra enquanto, desajeitadamente, corria atrás do amigo. — Luís, droga! — ela gritou, e ele finalmente parou.

Ela jogou a mochila em sua direção e o arrastou para um canto do corredor, apoiando na parede. Ele virou de frente para ela e cruzou os braços na frente do corpo. Sua cabeça estava baixa, seu corpo tremia, como se atingido por uma dose cavalar de adrenalina que nunca foi solicitada, como se seu corpo tivesse, involuntariamente, se posto em estado de alerta, preparado para o ataque. Seu coração batia alto, reverberando dentro de seu peito, ecoando por cada pedaço de si, extrapolando seus sentidos. Ele se apoiou na parede, zonzo, certo de que estava a ponto de cair se decidisse confiar em suas próprias pernas. Se esforçou para não vomitar a bile que subiu por sua garganta.

Quando levantou o olhar em direção a Laura, ela pôde facilmente notar suas pupilas dilatadas, o pânico estampado em seu rosto. Luís era incapaz de focar na garota à sua frente, ou em qualquer coisa sólida naquele momento. Tudo parecia dançar na frente de seus olhos, como imagens fluídas derretendo, compondo uma pintura renascentista. Tinha certeza que Dali consideraria a cena uma fonte inesgotável de inspiração. Mas, para ele, apenas aumentava sua ânsia de vômito.

Seus olhos agitados percorriam tudo à sua frente. Viu um homem rir, segurando uma lata de refrigerante, enquanto conversava com um amigo. Viu uma mulher passar por ele, nervosamente, segurando um caderno. Podia apostar que ela estava atrasada para alguma aula. Olhou para fora do prédio, permitiu que a luz do sol queimasse seus olhos por alguns instantes, mentindo para si mesmo ao dizer que era o brilho dos feixes de luz o causador das lágrimas que começavam a brotar em seus olhos.

— Luís, respira, por favor. Você parece a ponto de ter um ataque de pânico — Laura sussurrou, tocando seu braço, tentando prender a atenção dele para si. Ele tentou respirar, tentou, tentou de novo. Por fim, rendeu-se ao peso de seu corpo e sentou-se no chão do corredor, a cabeça encostada na parede, os olhos fechados. Laura sentou ao seu lado, em silêncio.

A cena não era tão bizarra quanto Luís achava no momento. Para um expectador distraído, eles não eram nada além de dois estudantes amontoados no canto de um corredor, conversando sobre qualquer coisa com o pretexto de escapar de alguma aula entediante. Talvez um olhar mais atento conseguisse perceber que algo estava errado naquela cena, talvez essa pessoa fizesse algum comentário com alguém que estivesse por perto, mas toda a importância dada àquilo se resumiria a isso. A verdade é que ninguém se importava com a crise que se desenrolava ali. Ninguém interromperia sua rotina, investiria mais do que alguns segundos de atenção ou se daria ao trabalho de verdadeiramente se preocupar em saber o que estava errado. Não era da conta de ninguém, e todos ao redor agradeciam por serem poupados de terem que resolver qualquer que fosse o drama. Apenas se interessariam no assunto como tópico para fofoca alguns dias depois, em uma mesa de bar, enquanto conversavam com os amigos. Um comentário despretensioso entre um gole e outro.

"Ei, vocês ouviram dizer que aquele Luís do laboratório de peixes é gay?", alguém perguntaria. Debateriam o assunto por alguns minutos. Um comentaria que sempre achou que fosse o caso, outro diria que jamais adivinharia. Uma terceira pessoa faria um comentário infeliz sobre como era um desperdício um homem daqueles não gostar da coisa. Até que o foco da conversa mudasse para comentários inapropriados sobre a vida sexual de alguém que não estaria presente para se defender.

Luís tentava convencer-se de que não havia feito a maior besteira de sua vida. É claro, havia decidido não manter mais segredo sobre si, estava cansado de viver na clandestinidade, escondido como um criminoso. E Helena estava certa, de um jeito distorcido e doentio. Se ela o vira saindo da festa com Flávio, alguém mais deve tê-lo feito. Se não na festa, talvez alguém os visse naquele dia à tarde enquanto estivessem no shopping comendo alguma coisa na praça de alimentação. Ou talvez o vissem com outra pessoa. Ou talvez apenas notassem a completa mudança de seu comportamento, agora que ele estava decidido a descobrir quem ele verdadeiramente era.

Obsidiana FraturadaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora