Ensinamentos Noturnos

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Vladmir caminhou calado até o outro lado do chalé. Era possível ver que o sol já brilhava lá fora; as janelas, mesmo fechadas, deixavam pequenos filetes de luz entrar. Dimitri o seguia, acompanhado por Thamina. Em silêncio, eles notavam a tensão do Conde. Um guinchado baixo, seguido por uma risada sem motivo, fez os três virarem, olhando para trás. Igor os seguia com uma faca em uma mão e, na outra, um pedaço de carne. Caminhava lento e manco, sua corcunda elevada acima da cabeça. O velho tirava filetes da carne e comia, rindo desordenadamente.

— O que foi, imprestável?

— Igor já terminou os afazeres. — Riu — Posso me retirar?

— Vai...

— Obrigado, Mestre. — Ele continuou rindo e voltou pelo corredor no caminho contrário.

Dimitri ficou espantado com o tamanho da biblioteca. Vladmir acendeu algumas velas, puxou duas escadas e subiu para o andar superior. Ali, começou a pegar alguns livros, falando os títulos em voz alta.

— Os diários de Mina Harker; vai conhecer um Drácula que Bram Stoker não foi capaz de descrever. — Ele passou por algumas prateleiras — A história de Bran... — O volume grosso com capa de couro foi lançado. Dimitri o pegou no ar, sorrindo.

— Tenho que ler qual capítulo?

— Todos! — Thamina e Vlad falaram juntos.

— Pensei que vampiros não estudassem....

— Ah! — Vladmir gritou. — Para um estudante de Direito você parece não gostar de ler, jovem Dimitri. — Vladmir descia as escadas com seis livros nas mãos. — Leia todos até o anoitecer e pegue um para ler na viagem. — Sorriu. — Thamina...

A vampira pegou um dos livros e o entregou para Dimitri.

— Leia Harker, a estrutura do vampiro. É mais interessante. — Sorriu.

— Tudo bem. — Ele sentou-se à mesa e começou a ler.

— Vou pegar uma garrafa para bebermos.

Dimitri o encarou e falou:

— Vladmir, me traz um hambúrguer, pelo amor de Deus. — Riram juntos.

A tarde foi caindo e Dimitri já havia lido sete títulos diferentes. Cansado, tinha dado uma pausa e estava na varanda observando o fim do dia. Thamina o olhava de longe, o sol a impedia de se aproximar. O rapaz virou-se em sua direção e enxugou uma lágrima. Thamina sorriu.

— É difícil — ela falou, sentando-se na cadeira próxima à janela. A luz do sol tocou sua pele, fazendo fumaça surgir. Ela segurou o ombro e suspirou. — Eu me lembro como foi acordar e não poder mais ver o sol.

— Todos estes anos e vampiros e lobisomens eram somente histórias para fazer crianças dormirem. — O sol desapareceu no horizonte e Thamina juntou-se a Dimitri na varanda. — Como foi para você?

— Um choque. — Ela riu. — Mas eu escolhi...

Dimitri a encarou sem entender. A mulher subiu no beiral, equilibrando-se com leveza e sorriu para ele, estendendo-lhe a mão. Dimitri respirou fundo e a segurou, e logo ambos estavam se encarando, equilibrados na grade.

— Vladmir sempre foi um homem rico, a Notoryev é dona de grandes hotéis e empresas dos mais diversos segmentos. — Sorriu, saudosa. — Eu era secretária da diretoria e nosso patrão estava desaparecido há dois anos. Já estávamos julgando-o morto.

Os dois olhavam o céu que foi tomado por tons azuis e laranja misturando-se com o branco das nuvens.

— Fui enviada à Romênia, era o último local onde Vladmir fora visto. Soube que ele deu uma passada rápida no hospital de Budapeste, onde recebeu cuidados médicos por conta de uma mordida. Fui investigando e encontrei um homem amargo andando pelas ruas da Transilvânia. Eu não o conhecia pessoalmente, mas como vampiro, ele me seduziu. Eu seria sua presa. — Dimitri saltou para dentro da varanda, histórias de vampiros sanguinários o enojavam. — Não fique assim. Quando eu disse quem eu era, ele hesitou.

A Fraternidade - Fernando LuizOnde as histórias ganham vida. Descobre agora