Bem, aqui ninguém mexe comigo. E como benefício de ser a irmã quieta do capitão do time, ganhei uma mesa só minha, com uma ótima locação diga-se de passagem. Minha mesa fica entre a do meu irmão e a vidraça lateral da escola que dá vista pro gramado, dos portões e da rua lá fora. O tempo que passo aqui apenas como em silêncio e olho pra fora. As vezes tenho vontade de estar lá,em outras vezes, fico feliz por estar aqui dentro.

—Hey estranha. —me assusto com o toque nas costas e acabo derrubando refrigerante na blusa.

—Merda! —xingo alto, alto demais. Mordo o lábio superior com força quando perçebo os olhares em mim —Merda Joe! —rosno mais baixo. O cretino pelo menos pareçe arrependido.

—Ai meu Deus , desculpa, não foi minha intenção! —ele berra nervoso e já tirando a jaqueta de couro marrom —Veste isso, vamos achar algo pra você no achados e perdidos.

—Onde? —controlo a voz e a vontade de socar o Joe —Você tem sorte de não estarmos sozinhos.

Ele fita o estrago na minha blusa, que é verde claro e está amarronzada e grudada na minha barriga.

—Desculpe. —repete ele mas nem tenho energias pra me irritar, estou envergonhada demais pra pensar nisso —Vem. — Joe envolve meus ombros com os braços e eu me afasto imediatamente —Desculpe, eu não...

—Esqueçe.

Tiro a jaqueta dele, junto minhas coisas apressada e saio. Ele se desculpou mais vezes só que eu não liguei. É péssimo ter tantos olhos estranhos sobre si, sobre mim. Ninguém além de Sam vai a minha mesa, Joe estar indo lá, sendo ele homossexual assumido, levantará idéias falsas. Irão pensar que sou gay também? Não. Não. É antiquado, certo? Heteros andam com gays o tempo todo, não tenho com o que me preocupar, Nicholson é inofensivo.

Atravesso a rua correndo, a movimentação dos carros é mais fraca na hora do almoço. Pouco acima na rua do colégio nós temos um café, o Tiny's. O espaço não é muito grande, são umas 10 mesas redondas com duas cadeiras cada (tudo artesanal). A decoração é como em uma casa de bonecas. Os tons pasteis, as texturas de madeira e ferro simplificados. Apenas dois funcionários; Marcos e May, um casal de irmãos proprietários do negócio.

Empurro a porta de vidro ainda segurando a bile na garganta. Não sei porque quero chorar, só sei que quero. May está no caixa, ela é mais velha, deve ter uns 40 e poucos mas a aparência é conservada, ela lembra a Madonna com os dentes da frente separados e cabelo louro escuro.

Seguro o choro até perçeber que estamos sozinhos. Ninguém toma café no almoço. Aceno brevemente pra ela e corro até uma cadeira. Respiro fundo mais uma vez e deixo as lágrimas rolarem silenciosamente. Odeio como posso ser frágil. É complicado ser eu. Tem dias que são duros e que ainda assim seguro o tranco. E tem outros em que besteiras aconteçem e acabo chorando. Me sinto estupidamente fraca.

—Genna? —quase engasgo ao ouvir a voz de Joe atrás de mim. Ele surge na minha frente antes que eu possa disfarçar a situação —Merda. Eu não... Genna, desculpe, mesmo. Agora sei como ir até sua mesa mexe na ordem natural das coisas. Eu devia ter seguido o plano mas não, sou um veado estúpido e impaciente. Só me perdoe Genn, não quis deixa-la triste, desconfortável ou o que for... De verdade, acho que é a primeira vez que... —Joe pausa me fitando de forma até invasiva —Vejo uma garota chorando por minha causa.

Limpo as bochechas.

—Todo mundo deve estar pensando que sou uma idiota. —murmuro com a voz embargada.

—Eles podem até pensar mas não vão dizer ou demonstrar, Sam os mataria —Joe pega minhas mãos —Eu os mataria Genna.

—Cala a boca.

Uma Garota IncompletaWhere stories live. Discover now