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O dia clareava quando Celeste acordou na manhã de Natal. Perry dormia profundamente, e
não se ouvia barulho nenhum no quarto onde os meninos dormiam. Eles tinham quase
enlouquecido de empolgação com a ideia de Papai Noel encontrá-los no Canadá (cartas
haviam sido enviadas ao bom velhinho avisando-o da mudança de endereço), e com os
relógios biológicos todos confusos, ela e Perry tiveram dificuldade em colocá-los para
dormir. Os meninos dividiam uma cama king-size e tinham ficado lutando naquele estado
histérico em que às vezes se encontravam, em que o riso se transformava em choro e depois
em riso. Perry gritara para eles do quarto ao lado: “Vão dormir”, e então tudo ficara em
silêncio. Quando Celeste entrara para conferir alguns segundos depois, os dois estavam
estirados de costas, braços e pernas abertos, como se a exaustão os tivesse apagado de
repente.
“Venha ver isso”, dissera ela a Perry. Ele entrara no quarto e os dois ficaram observando
os meninos dormindo por uns minutos antes de sorrirem e saírem na ponta dos pés para beber
alguma coisa e celebrar a véspera de Natal.
Celeste deslizou para fora do edredom de plumas e foi até a janela que tinha vista para o
lago congelado. Colocou a palma da mão no vidro. Ela o sentiu frio, mas o quarto estava
quente. Havia uma árvore de Natal gigantesca no meio do lago, resplandecendo com luzes
vermelhas e verdes. Flocos de neve caíam suavemente. Eram tão lindos que ela teve a
sensação de poder saboreá-los. Quando recordasse aquele dia no futuro, ela se lembraria de
seu sabor: intenso e frutado, como o vinho quente que haviam bebido.
Depois que os meninos abrissem os presentes e todos tomassem café da manhã no quarto
(panquecas com xarope de bordo!), eles sairiam para brincar na neve. Fariam um boneco de
neve. Perry tinha marcado um passeio de trenó. Perry postaria no Facebook fotos de todos eles
se divertindo na neve. Escreveria algo como: Os meninos têm o seu primeiro Natal branco!
Ele adorava o Facebook. Todo mundo implicava com ele por causa disso. Banqueiro
importante, bem-sucedido, postando fotos no Facebook, escrevendo comentários joviais nos
posts de receitas das amigas da mulher.
Celeste olhou para Perry dormindo na cama. Ele sempre dormia com uma ruguinha de
perplexidade na testa, como se intrigado com seus sonhos.
Assim que acordasse, ficaria desesperado para dar o presente a Celeste. Ele adorava dar
presentes. Ela soube que queria se casar com Perry quando viu sua cara de ansiedade,
observando a mãe abrir o presente de aniversário que ele lhe comprara. “Gostou?”, perguntara
à mãe assim que ela rasgou o embrulho, e sua família toda tinha rido dele por parecer uma
criança.
Celeste não precisaria fingir que havia gostado do presente. Ele escolheria algo perfeito.
Ela sempre se orgulhara da habilidade para escolher bons presentes, mas Perry a superava.
Em sua última viagem, ele tinha comprado uma rolha de champanhe de cristal em um tom
berrante de rosa. “Bati o olho e achei a cara de Madeline”, dissera ele. Madeline adorou,
claro.
O dia seria perfeito em todos os aspectos. As fotos do Facebook não mentiriam. Tanta
alegria. A vida dela tinha tanta alegria. Isso era um fato.
Poderia esperar os filhos terminarem o ensino médio para deixar o marido.
Esta seria a hora certa. No dia em que eles terminassem as últimas provas. “Guardem as
canetas”, diriam os supervisores da prova. E então Celeste daria fim ao casamento.
Perry abriu os olhos.
— Feliz Natal! — Celeste sorriu.
                              ________

Gabrielle: Todo mundo acha que o casamento de Celeste e Perry é perfeito, mas não tenho tanta
certeza disso. Na noite do concurso de perguntas, passei pelos dois ainda sentados no carro
estacionado. Celeste estava linda, é claro. Eu já a vi comer carboidratos como se não
houvesse amanhã. A vida é muito injusta. Enfim, eles estavam lá parados, fantasiados, só
olhando para a frente, em silêncio.

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