Capítulo 4

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Havia várias vantagens em se estudar numa escola internacional, como a suíça, a alemã, a americana, britânica, ou o Liceu francês. A maior delas era o convívio desde pequeno com outra cultura.

O brasileiro comum se acanha muito diante do mundo. Numa escola internacional, esse acanhamento simplesmente não existia. Estudávamos juntos desde criança, suávamos antes das mesmas provas, havia bons e maus alunos tanto entre os brasileiros quanto entre os estrangeiros. Convivendo assim, você não fica deslumbrado e olhando os outros de baixo para cima.

No entanto, tínhamos que estudar muito mesmo – um fardo pesado. Eram oito horas por dia na escola, mais duas horas (no mínimo) de dever de casa. Os próprios pais reclamavam: "Elas são crianças. Precisam de tempo para serem crianças." E assim, depois de muitos anos, se estabeleceu um limite máximo de duas horas de dever de casa por dia.

Também podíamos ver em primeira mão a diferença entre os professores suíços e os brasileiros. Os suíços, oriundos de um dos países mais competitivos do mundo, cuidavam de criar alunos competitivos, partindo-se do princípio de que os filhos dos suíços só estavam no Terceiro Mundo de passagem e tinham de ser preparados para as exigentes universidades suíças. (É claro que nem sempre dava certo. Boa parte dos suíços acabou virando brasileiro e muitos continuam aqui até hoje.)

Já os brasileiros tinham uma cultura mais derrotista, bem de país subdesenvolvido, cujo maior exemplar era o Sr. Isauro*, um sujeitinho de quem trataremos com atenção mais adiante.

E também tinha o valor às artes, principalmente a música e o teatro.

Até a 5ª série do 1º grau, todas as turmas tinham que apresentar, no auditório da escola, pelo menos um espetáculo teatral por ano, no final do primeiro ou do segundo semestre (algumas turmas faziam nos dois). Da 6ª série em diante, as turmas se apresentavam se quisessem – e muitos professores organizavam as peças.

Na 6ª série, nós mesmos apresentamos uma em que satirizávamos nossos amados professores – ou seja, dávamos a nossa versão das aulas. O responsável foi o Peter Joos, o mesmo que, um ano e meio mais tarde, orientaria o meu roteiro em alemão.

Em 1984, com uma nova fornada de professores brasileiros e suíços, fui encarregado de ser o redator-final de uma nova peça em que dávamos a nossa versão das aulas. O problema é que tínhamos apenas seis semanas para organizar, escrever, ensaiar e apresentar a peça. A primeira semana foi gasta organizando os quadros e quem faria o quê. A partir da segunda, entrei em ação, numa verdadeira corrida contra o relógio.

Eu tinha três semanas e meia para escrever sete quadros, satirizando sete professores diferentes, mais a abertura. Cada quadro tinha de oito a dez minutos. Em princípio, tínhamos muitos "professores-figuras" para satirizar e não devia haver problema. Mas é claro que eles surgiram.

O primeiro foi que não tínhamos nenhuma aluna para interpretar Maria da Penha, a nova professora de português. A primeira opção foi a Thereza (que efetivamente virou professora, quando adulta), mas ela não tinha nem cacoete de atriz. Um dia, passei pela porta da sala entreaberta e ouvi o seguinte diálogo dela com o Romério.

– Não sei, mas não estou me sentindo muito bem nesse papel.

– Thereza, se eu fosse você não me preocupava, porque eu acho que essa peça não vai sair – dizia Romério.

Thereza acabou sendo substituída, mas a outra aluna também acabou pulando fora e perdemos um excelente quadro a menos de duas semanas da peça.

Depois teve o quadro do professor de alemão. Escrevi o sketch sozinho, mas ninguém gostou – e tínhamos um ator excelente, Sandro Martelli, para interpretá-lo. Em vez de ficar de futriquinhas por trás, a turma me chamou para conversar. Fizemos uma rodinha, todos deram ideias e sugestões e naquela tarde mesmo eu escrevi um quadro totalmente novo, que acabou sendo o melhor de todos.

PUTS! 17 anos e meio ao lado de um engraçadíssimo cachorro-pessoaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora