Capítulo 1

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Acordei com um mal pressentimento, meu coração dizia que algo ruim estava prestes a acontecer e eu não costumava me enganar com essas coisas. Mesmo assim, empurrei a sensação para longe e fui me arrumar para o dia.

Eu tinha que chegar ao trabalho às 10h, por sorte ainda eram 7h quando levantei. Tomei um banho, escovei os dentes e fui me trocar. Coloquei apenas um jeans e uma camiseta simples. Quando eu chegasse na lanchonete teria que pôr o uniforme de qualquer maneira.

Encontrei meu pai sentado na mesa da cozinha com o semblante preocupado. Por mais que eu me esforçasse, as contas ainda não estavam todas pagas e papai não podia mais trabalhar. Ele era um homem de quarenta e nove anos, que infelizmente havia perdido a visão há alguns anos atrás.

- Bom dia, papai.

Ele me deu um sorriso fraco e se levantou da cadeira. Apesar de ser cego, meu pai era muito independente e orgulhoso. Todos diziam que eu parecia muito com ele nesse aspecto, já que na aparência, eu era a cópia da minha mãe.

- Filha, bom dia. Já está indo para o trabalho? - ele perguntou quando eu lhe dei um abraço.

- Vou tomar o meu café da manhã e vou.

Por mais que eu odiasse deixar o meu pai sozinho, era necessário. Ele jamais permitiria que eu pedisse para alguém dá uma olhada nele e eu tinha que trabalhar.

Aos vinte e quatro anos, sou formada em administração, mas infelizmente não consegui ainda um emprego como administradora de algum comércio ou empresa. Então, até consegui, seguro as pontas trabalhando na lanchonete "Carioca da Gema".

- Tudo bem, pai? O senhor parece preocupado.

- Tudo, filha. É apenas a idade e essa cegueira que não me deixam fazer nada. Gostaria de ajudá-la.

Não pude resistir a lhe dar outro abraço. O que mais ele faria por mim? Já fez tudo.

Minha mãe morreu quando eu tinha três anos e desde então, o meu pai tem cuidado sozinho de mim. Não consigo imaginar como seria se ele não tivesse deixado a dor de lado para me criar. Graças a ele, consegui terminar os estudos e fazer a minha faculdade.

- Pai, não preciso de ajuda. Já tomou o seu café? - pergunto já cortando um pedaço de bolo de chocolate que eu havia feito ontem à noite.

Meu pai assente e volta a se sentar.

Eu franzo a testa. Ele parece está preocupado com algo, mas sei que se eu perguntar, ele negará até a morte.

Sento na cadeira ao seu lado e começo a comer o bolo. Papai continua estranhamente quieto e isso me preocupa.

- Pai, está acontecendo alguma coisa? O senhor está parecendo preocupado.

- Não é nada filha. Eu acho que vou dormir um pouco mais, com licença. - ele diz já se levantando e andando com dificuldade até a porta do seu quarto.

Eu poderia me levantar e pedir para ajudá-lo, mas ele sempre recusa. Diz que quer fazer as coisas sozinho. Já decorou todos os caminhos da casa, por isso já não é mais tão difícil para ele andar por aqui como antes.

Termino de comer em silêncio e vou lavar o prato e a xícara que usei.

Depois de está tudo arrumado, dou uma olhada no relógio.

9h17.

Pego a minha bolsa no quarto e vou até o do meu pai me despedir. Sempre peço sua bênção antes de sair de casa.

- Pai? Estou indo. - digo quando entro no quarto. Ele está deitado na cama, e apesar dos óculos escuros, nota-se que está de olhos fechados.

Me aproximo mais e peço sua bênção. Ele a dá, como sempre. Mas parece um pouco mais triste.

Saio de casa e já esbarro em Camila que com certeza tem uma fofoca quente para contar.

- Amiga! Você não sabe quem vai casar, sua louca. - ela exclama toda animadinha, e por um segundo eu cogitei perguntar se era ela.

- Não faço ideia, Camila. - respondo quando termino de fechar o portão.

- A minha prima, Susana! - ela dá pulinhos de alegria e eu acho graça.

- Aquela sua prima de trinta e cinco anos que disse que só perderia a virgindade depois do casamento?

- Essa mesmo! Eu sinceramente não sei como ela aguentou esse tempo todo. Mas enfim, ela vai casar. Acabei de falar com ela.

- Só você mesmo para está tão feliz assim pelo casamento de alguém. - eu rio e começamos a caminhar juntas.

- No dia em que você se casar, eu vou ficar em êxtase, querida.

"Espere sentada, porque em pé cansa.", pensei.

Não é que eu não queira me casar. Eu quero, mas acho que demoraria uns bons anos para chegar o pretendente.

Quando chegamos ao ponto de ônibus, Camila se cala para atender uma chamada e eu pego meu celular, coloco os fones de ouvido e "Photograph" do Ed Sheeran, começa a tocar. É uma das músicas que eu mais amo nesse mundo.

Fico imaginando se realmente me casarei um dia. Acho improvável, afinal, dos dois namoros que já tive, todos foram fracassados. No primeiro eu fui traída, no segundo, ele foi morar em outro estado e era muito ciumento. Insuportável, na verdade.

Descarto os pensamentos sobre casamento quando vejo o nosso ônibus se aproximar.

Giancarlo (BÔNUS):

Suspirei mais uma vez.

Então enfim tinha chegado. Meu aniversário de trinta anos.

Eu sempre quis que esse dia demorasse o máximo de tempo possível para chegar, mas ele chegou. O que eu faria agora? Teria que sair da Itália para ir para o Brasil conhecer a minha "noiva".

Há vinte e dois anos atrás, o meu pai achou que uma maneira de compensar a ajuda financeira que recebeu para a sua empresa, que agora é minha, Group Agnelli, era me casando com a filha de uma amiga sua.

A mulher era exageradamente rica, mas tinha se casado com um simples motorista.

Ela conheceu o meu pai em uma viagem que fez à Veneza. Os dois se tornaram amigos, e quando o meu pai decidiu fundar seu próprio negócio, não recebeu a ajuda de seus pais, que queriam que ele fosse um advogado.

Ela o ajudou, emprestou todo o dinheiro necessário para ele. E como forma de pagamento, quis que a sua filha, que na época estava prestes à completar três anos, casasse comigo. Meu pai concordou, claro.

A mulher morreu poucos meses depois e pelo o que meu pai soube, deixou uma herança generosa para filha e o marido, mas ele se recusou a pegar nem que fosse um pouco do dinheiro. Sua filha, só receberia a herança então, depois do nosso casamento.

Eu sempre tive esperança da garota ter alguns princípios e não aceitar o casamento, mas eu sou rico e famoso. Com certeza ela estará pensando que tirou a sorte grande.

Quando ouço a chamada do meu vôo, levanto-me e começo a caminhar até a área de embarque.

Infelizmente, foi uma promessa que eu fiz ao meu pai, e ele tinha palavra, assim como eu. Se o acordo era me casar com a garota, eu me casaria, custe o que custar.

Era Uma Vez Em Florença Onde as histórias ganham vida. Descobre agora