Bônus (Epílogo) - Com o coração ainda mais seu

Começar do início
                                    

O reencontro na noite do acidente não foi o primeiro, tampouco o mais marcante. Só que encontrar Amanda por duas vezes em circunstâncias tão inesperadas é que fez parecer diferente. Às vésperas da mudança para a casa de Carolina, às vésperas de tomar a importante decisão de guardar definitivamente todos os sentimentos sobre ela, Amanda reapareceu. E trouxe tantos detalhes, até mesmo alguns que revelavam os sinais de ferrugem da própria memória. A pintinha logo abaixo do olho esquerdo, o sorriso que alcançava as têmporas, o jeito com que ela tentava respirar pausadamente quando ficava minimamente nervosa.

Instantaneamente ao pôr os olhos nela, aquele rosto que se parecia com uma lembrança luminosa, sob o brilho de uma lanterna, ele soube. Nada havia mudado. Passado a magia daquele instante, ele pensou que deveria ter feito diferente. Poderia ter pedido ajuda a outra pessoa, havia tantas possibilidades. Mas ele queria vê-la, ter a certeza de que não era apenas uma alucinação. Nunca achou que Amanda pudesse estar tão linda daquele jeito: corada e de pijamas. Foi esse o momento em que se deu conta de que toda a sua serenidade estava tendo um colapso nervoso.

"Estávamos tão bem e de repente ela acha que pode aparecer e me mostrar que vai continuar me assombrando. Eu achei que pudesse competir com ela, mas não importa o que eu faça, ela sempre vai ganhar!"

A voz de Carolina ressoou por debaixo da porta do banheiro. Se Henrique não tivesse certeza de que ela estava a quilômetros de distância, podia jurar que ela sairia de lá a qualquer momento.

"Eu não vou pedir para você escolher entre nós duas, porque eu sei a resposta, Henrique...".

Cora foi a única que conseguiu fazer com que Carolina se acalmasse e decidisse por ir embora. Sem muito jeito e com a rispidez necessária para fazê-la entender que já havia excedido os limites. A avó de Henrique também disse algo que ele jamais esperava ouvir. A pessoa que nunca se envolvia nos seus relacionamentos ou nas escolhas que ele fazia, estava lhe oferecendo um conselho. Sem meias palavras ela disse: todos os tormentos chegavam ao fim.

Henrique achou que tivesse entendido quando ouviu sua avó dizer a primeira vez, logo depois de ter voltado da conversa definitiva com Carol, no entanto o sentido real e completo daquelas palavras foi só entendido ali. Insone e desassossegado é que conseguiu entender o verdadeiro significado de: todos os tormentos chegavam ao fim.

Terminar com Carolina foi uma decisão sensata.

Parecia fácil construir uma bolha e ir para dentro dela com Carol, mas não era justo.  Esquecer e fingir que todo o amor que sentia por Amanda pelo simples fato de ter encontrado alguém como Carolina não era honesto. Ela era divertida, empolgada e estava disposta a construir um futuro com ele, mas faltava alguma coisa e ele se recusava a entender.

Todos os tormentos chegavam ao fim.

Henrique se sentou na cama, cansado de tentar dormir. Quase sufocado pelos gritos, tateou no criado-mudo na busca por seus óculos de grau. Ele estava ofegante e com o peito aos sobressaltos e foi apenas pendurar os óculos sob o nariz para conquistar o silêncio.

Mudo.

Tenso.

E frágil.

Era exatamente assim que ele se sentia. Conseguia se esconder de si mesmo durante o dia, emendando um plantão no outro, como uma espécie de fuga que não o tirava do lugar. Mas já havia se passado três semanas e todas aquelas cobranças, noite após noite, causaram certa revolta em uma mente que clamava por descanso.

Se ele a encontrasse novamente, será que tudo acalmaria?

Seria realmente capaz de aguentar todas as consequências de um novo encontro? Ou o que aconteceu no hospital fora uma pista sobre o que precisava fazer: enfim, substituir todas as reticências daquela história por um ponto final?

Com tequila e com amor [Concluído] [VENCEDOR DO WATTYS 2017]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora