Bônus (Epílogo) - Com o coração ainda mais seu

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"A senhorita me dilacera a alma. Estou dividido entre a agonia e a esperança. Não me diga que chego tarde, que aqueles tão precisos sentimentos desapareceram para sempre. Ofereço-me outra vez, senhorita, com o coração ainda mais seu do que quando a senhorita quase o partiu há oito anos. (...)"
(Jane Austen)

EPÍLOGO

Dedico esse capítulo a todos os leitores maravilhosos que acompanharam essa história comigo ❤ Muito obrigada por terem tornado tudo tão especial!
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Henrique tinha o sono agitado. Algo assim não acontecia com frequência, embora as últimas semanas provassem justamente o contrário. Ele nunca tivera problemas para dormir, mesmo nos dias de plantão, quando atravessava de uma madrugada a outra, voltar para casa sempre era como um alívio. Dormir fazia parte da rotina de desacelerar, assim como fechar os olhos e se entregar ao cansaço.

Até a noite do acidente.

Aquela noite era apenas uma reprise das últimas.

Henrique consultou o relógio na cabeceira da cama por quatro vezes. Despertado aturdido por duas e cogitado levantar por três. Muitas pessoas atrapalhavam seu sono naquele quarto, embora nenhuma delas tivesse presença física ali.

Começava com os gritos de Carol, em uma variação entre as frases ditas por ela, mas sempre começava do mesmo jeito. O timbre agudo, choroso ecoava através das paredes.

Ele havia acabado de voltar do hospital quando a namorada estava à sua espera no apartamento de seus avós. Carol estava nervosa e apreensiva, mas logo substituiu a aflição por um ímpeto desesperado. Aliás, foi no exato momento em que escutou o nome Amanda. E o tom só aumentou quando Henrique acabou por deixar escapar o resto. Com direito a detalhes que poderiam passar despercebidos, se a preocupação de um avô não fosse tão maior do que a necessidade de manter certos delineados em sigilo.

Ouvir a história sobre o encontro com Amanda fez Carolina surtar. Henrique podia jurar que os olhos de sua namorada cintilavam em uma espécie de fúria nunca antes vista e as palavras estavam espumando ao serem balbuciadas.

"Não me mande ficar calma, Henrique! Como você quer que eu fique calma com esse fantasma assombrando a nossa vida?"

Ele se remexia na cama se lembrando. Inquieto, incomodado com o modo com que ela atirava as palavras. Parecia tão real, tão alta e límpida como a voz de Carol e, a cada respiração entrecortada dela, ele precisava mudar o corpo de lugar. Só que ela não estava ali e provavelmente jamais voltaria a estar.

"Foi a única coisa que eu te pedi! Pra você deixar que ela fosse embora!"

A visão de Carolina com os lábios tremendo, em meio a todo o nervosismo contido, que não combinavam com a delicadeza de seus olhos azuis, tornava mais vívida a cada noite.

"Como você pôde passar a noite com ela? Não mente pra mim, Pedro Henrique. Você dormiu com ela, não foi?"

Assistir Carol chorando foi doloroso e reviver toda a cena mais ainda, como retocar uma tatuagem e reviver a mesma dor em cada pedacinho. Principalmente, por saber que quase nada do que ela disse era mentira.

Amanda era como um fantasma vagando sem rumo nas memórias de Henrique. Ainda que ele raramente falasse sobre ela, o silêncio correspondia aos gritos que ecoavam para dentro.

Nem sempre o silêncio significava esquecer e, no caso dele, o silêncio era o seu suplício.

"Eu fui tão burra por achar que poderia competir com ela..."

Com tequila e com amor [Concluído] [VENCEDOR DO WATTYS 2017]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora