Capítulo 22

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ALGUNS DIAS SE PASSARAM até que finalmente chegou o momento mais ansiado por Mônica: a abertura da exposição. Além de sua curiosidade, estava na torcida para que tudo desse certo com o seu mais novo amigo.

Ela pediu folga no trabalho. Queria estar à altura do evento, portanto marcou hora na manicure. Desejava estar linda. André merecia isso e, mais do que tudo, depois do que passou, ela o merecia.

Mônica estava feliz. Acordou cedo, ligou o rádio e tomou café. Estava começando a lavar a louça, quando a campainha tocou. Foi atender a porta. "Será que já é ele?!" – pensou enquanto seu coração disparava – colocou seu melhor sorriso no rosto. Abriu a porta e a felicidade sumiu. Deparou-se com Jorge.

– Por um acaso os meus livros ainda estão aqui, ou você já fez a doação para biblioteca?!

– Olha, por sorte, eu não tive tempo de doá-los, então aguarde um momentinho, buscá-los-ei. 

Mônica foi tão sarcástica quanto Jorge. Ela sabia que isto o deixaria furioso, aliás, ela pôde ver a fúria em seu olhar. A mesóclise, ela sabia que a mesóclise proferida o irritava profundamente. Ela pôde perceber o quanto ele ficou vermelho e revirou os olhos assim que os ouvidos dele ouviram o "buscá-los-ei". Não tenho culpa se o meu conhecimento gramatical o atinge, refletiu mergulhada na ironia. Depois, de volta à porta disse:

– Aqui estão.

– Obrigado.

– Não há de quê.

Ela fechou a porta, sem dar importância se Jorge diria alguma coisa mais e se surpreendeu com o tratamento que dava ao rapaz.

(...)

O dia transcorreu entre terminar de arrumar a casa, passar em um restaurante vegetariano para uma refeição leve e partir para o salão de beleza. A tarde já atingira seu auge quando Monica chegara a sua casa com suas unhas devidamente feitas. Fazia um dia quente e a moça resolveu tomar um banho para livrar-se do suor. Estava muito ansiosa. Ao sair do chuveiro, ligou o rádio e pegou uma pequena barra de chocolate. Já estava penteando o cabelo quando recebeu a seguinte mensagem no celular:

Moni, passo aí em uma hora, ok?! Beijos, André

Como sempre em que pensava no fotógrafo, ela sorriu. Será que eu sou a mais nova Cinderela?! Pegou o telefone e digitou:

Estarei a sua espera. Beijos

Após ter a mensagem respondida, Mônica voltou a se arrumar. Quando finalmente terminou, olhou-se no espelho e gostou do resultado. Depois, foi até a sala, ligou a televisão – mudava de canal sem interesse algum na programação – não via a hora que seu artista preferido chegasse.


PASSADOS ALGUNS DIAS, JORGE TOMOU CORAGEM e decidiu ir à casa de Mônica buscar seus livros. Para ele, isso não era uma tarefa fácil, já que, por mais que lutasse contra, ainda sentia algo pela antiga namorada.

Para concretizar tal missão, vestiu a sua melhor roupa – uma calça social preta e uma camisa que ela lhe dera de presente –, escolheu o seu melhor perfume, escovou o cabelo e, ao invés de fazer uso da costumeira lente de contato, optou pelos óculos que o deixava com ar de intelectual.

Passou o caminho todo pensando em que diria ao chegar à casa de Mônica e em como ela o receberia. Parou o carro em frente à residência da moça e ouviu a música alta que saía pela janela. Imaginou que ela estivesse muito feliz e isso o fez perceber que ele não fazia mais parte daquele mundo. Esta constatação fez seu sangue subir e a veia saltar em seu pescoço.

Saiu do carro e bateu a porta. Respirou fundo ao subir os degraus da escada e tocou a campainha. Ouviu o volume do rádio sendo diminuído; os passos se aproximando da porta e a voz de Mônica que cantarolava uma canção qualquer. Como em um flash, viu como a sua preocupação em se apresentar bem arrumado o tornara um completo idiota naquele momento.

Enquanto ele imaginava que sua ex-namorada ainda sofria a sua ausência; ela, na verdade, demonstrava tê-lo esquecido. Ficou tão furioso, que ao olhar para Mônica, não disse ao menos "Bom dia", disparou:

– Por um acaso os meus livros ainda estão aqui, ou você já fez a doação para biblioteca?!

– Olha, por sorte, eu não tive tempo de doá-los, então aguarde um momentinho, buscá-los-ei.

Ela virou-lhe as costas sem convidá-lo para entrar e adentrou na residência para apanhar os livros. Jorge, que já estava furioso, ficou mais ainda. Odiava a prepotência gramatical de Mônica. Ainda mais quando ela dava uma de purista propositalmente. Ela o fazia para humilhá-lo... E, claro, conseguia. Gramática nunca fora o forte de Jorge e, francamente, ele estava pouco se lixando por isso. Custava ela falar como gente?

Estava perdido em seus sentimentos, quando a voz de Mônica lhe trouxe de volta à realidade:

– Aqui estão.

– Obrigado.

– Não há de quê. 

Apesar da fúria, Jorge pensou em dizer o quanto ela estava linda, o quanto ele odiava quando ela se achava a certinha, o quanto ele... Mônica já havia fechado a porta, já aumentava o volume do rádio, já cantava – e provavelmente dançava – a animada melodia. Ele não foi rápido o suficiente, como sempre, não soube expressar o que sentia. Resignado, abandonou a residência e foi trabalhar.

(...)

Jorge saiu do trabalho e resolveu pegar um atalho para chegar a sua casa mais rapidamente. O trajeto, diferente do habitual, era um prazer para ele, que podia dirigir em outras ruas e observar outras paisagens. Enquanto ouvia o rádio e fitava o céu mudando de cor – do alaranjado passava a um azul penetrantemente escuro – avistou uma faixa em uma galeria lhe chamou a atenção:

"Venha conhecer novos artistas na abertura da casa de cultura Arte de Viver

Inauguração dia 05 de maio, às 18h"

Ao ler cartaz algumas reminiscências lhe cruzaram a mente. Lembrou-se dos tempos em que Mônica e ele viviam felizes, das tardes de sábado em que visitavam exposições, assistiam a peças de teatro, iam ao cinema...

Pensou no quanto ela ficava feliz com aqueles passeios e quanto ele aprendeu ao seu lado. Todas aquelas lembranças exerceram um forte poder em Jorge. Ele, então, fez o retorno até a galeria de arte, parou o carro e resolveu que entraria na Casa de Cultura.

História de um casalWhere stories live. Discover now