CAPÍTULO 1 - Bom dia, Tia Yara

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   Oi.


Meu nome é Verônica. Tenho 1,60 de altura, ruiva, olhos meio verdes, meio castanhos.

Cresci em orfanato, nunca vi se quer uma foto de meu pai, ou de minha mãe, ou de qualquer um de minha família. Eu era uma criança estranha, eu não tinha amigos, e nem tentava ter, procurava me manter afastada de tudo e de todos. Várias vezes tentaram que eu fizesse terapia, mas toda vez que eu sentava na divã do psicólogo a única coisa que eu fazia era encarar o teto fixamente. O meu silêncio irritava tanto os psicólogos que na terceira sessão eles sempre desistiam de mim, e diziam para a diretora do orfanato: "ela não tem jeito".

Eu era uma criança um pouco complexada. Não dirigia a palavra a ninguém. Na escola era um pouco difícil quanto a isso, demorei pra provar pra todo mundo que eu já sabia ler. Mas desde sempre o ser humano me dava preguiça, e não valia apena gastar meu tempo e saliva.

Eu odiava a minha vida. Odiava ter sido abandonada, e meus pais me odiavam tanto, que não deixaram nenhum rastro. Odiava viver assim, e odiava quando tentavam me forçar a falar. Na minha primeira série, ouvi umas meninas mais velhas, do primeiro ou segundo ano do Ensino Médio, eu acho, comentarem sobre uma menina da idade delas que havia se matado. E desde aquele dia, eu vivia a espera do momento perfeito para fazer isso.

Quando menorzinha, muitos ainda tentavam. As monitoras do orfanato, a diretora de lá, a diretora da escola, as professoras, todas elas achavam que um dia me fariam falar. Me mandaram para 5 psicólogos diferentes.

Aos oito anos todos desistiram de mim. Todos, menos 3.

A primeira pessoa era Tia Yara. Sempre me acordava com um bom dia caloroso, me chamava para as refeições, me acompanhava na execução dos deveres de casa e fazia questão de se despedir antes de ir embora no final da tarde.

A segunda pessoa... Bem... Nós não conversávamos muito, na verdade não conversávamos nada até certo tempo. Mas ela sempre estava do meu lado. No almoço ela sentava ao meu lado, quando eu estava lendo ela ficava perto de mim. Insistiu para que colocassem sua cama ao lado da minha. Mesmo "respeitando" meu espaço sem me dirigir a palavra, ela estava sempre comigo. Ela não sabia, mas eu cantava pra ela às vezes, e a vigiava quando estava brincando no jardim. Eu cuidava de suas feridas quando se machucava, eu penteava seus cabelos quando mal sabia pentear os meus. Falar dessa pessoa me parte o peito! Mas prometo entrar em detalhes mais tarde...

A terceira pessoa eu nem se quer sabia o nome, e foi por muito tempo assim. Mas até os meus onze anos ele não me dizia mais do que um bom dia. Falaremos dele depois.

Certo dia, Tia Yara perguntou:

– Sabe por que olho seu caderno e sua mochila todos os dias, Vê? - Era como ela me chamava.

Olhei para ela.

– Porque é o que eu faço com meus filhos todos os dias.

Eu gostava da Tia Yara, gostava muito. Mas naquele dia eu passei a amá-la. Ela havia me comparado com os filhos dela. O que ela me disse, bem, entrelinhas, significava que ela se importava comigo como se importava com os filhos dela.

Pela primeira vez, eu dei um abraço em Tia Yara. Pela segunda vez, dei um abraço em alguém.

Como eu disse antes, tinha outra pessoa, a Malu. Eu nunca falava com ela, assim como nunca falava com nenhuma das outras crianças no orfanato. Mas com a Malu era diferente, mesmo nunca nos falando, estávamos sempre cuidando uma da outra.

Na manhã do dia seguinte, quando Tia Yara me acordou para a escola, e me deu aquele bom dia caloroso de sempre, eu a respondi. "Bom dia, Tia Yara." Ela ficou tão feliz, tão radiante. Meu Deus. Eu nunca imaginei que um simples bom dia meu teria o poder de mudar o dia de alguém. Ela até chorou.

O Mistério de Emma SueDonde viven las historias. Descúbrelo ahora