Fiquei agradavelmente surpresa quando ele retribuiu de um modo que eu não esperava.

Mas preferiria levar mil tiros outra vez do que admitir que aquele pequeno agarramento me deixara quente em lugares completamente inapropriados para uma menina - morta ou viva - de família.

Caramba, eu devia ser uma raridade. Uma garota virgem viva decididamente já era uma pérola naquele mundo em caos. Uma morta-viva virgem, então, era um milagre imaculado.

Não podia deixar de sentir medo e angústia ao pensar que, mesmo que algo entre mim e Ryan evoluísse de tal modo que algo mais sério parecesse iminente, talvez ele não estivesse pronto. Talvez eu nunca me curasse, e Ryan descobriria que aquela paixonite passageira jamais o faria ser louco o suficiente para continuar com um cadáver ambulante. E eu não o impediria de me largar. Quem poderia continuar amando um corpo que já deveria ter sido morto e enterrado?

Ele sentou ao meu lado e pegou minha mão. A mão dele era quente, provocando pequenos espasmos de choque térmico em minha pele gelada. Meu coração saltou quando sentiu o contato.

– Tudo bem, Chloë?

– Aham - murmurei, ainda refletindo.

– Parece triste... - Ryan virou o rosto, preocupado.

Olhei para Ryan, me deixando afundar em seus olhos.

– Você vai acabar... descobrindo que tudo isso... é loucura, não vai? - arfei, tensa - que nós somos... perda de tempo...

Ryan arregalou os olhos antes de abarcar meu queixo com a mão.

– Chloë... se conseguirmos salvar quatro zumbis... só quatro... e provarmos ao Comitê que vocês podem se curar, tudo voltará a ser como era. Não entende? Assim que vocês se curarem, poderemos fazer um tratamento de cura em massa com os zumbis que ainda estão lá fora. Todos voltarão à vida que tinham antes. Poderemos salvar esse mundo e recomeçar do zero. Poderemos ver nossas famílias de novo.

Meu coração doeu quando lembrei de mamãe e de tio Fred.

Ryan tinha razão. Eu poderia ver minha família outra vez. E mesmo que eles já tivessem virado zumbis, poderiam ser curados. Ryan e Gail não estavam fazendo isso com papai e eu?

Papai parecia ter ouvido a conversa. Olhava com um misto de reflexão e raiva para nós - ou a raiva era só uma ciumeira paterna voltada contra Ryan?

– Makennah... - ele murmurou.

– Sim... - balancei a cabeça, segurando as lágrimas que já me embaçavam a vista - mamãe... o senhor lembra dela... não é?

Os olhos de papai pareceram brilhar. Ele assentiu.

Ryan olhava para nós, parecendo estranhamente calculista.

– Vou dormir... - gemeu Julia, se aninhando nas almofadas.

– Eu também. Partiu - brincou Gail, se ajeitando no sofá.

– Boa ideia - papai deu um sorriso torto que mostrava - literalmente - seus dentes, através do corte em sua mandíbula. Ele pousou a cabeça em outra almofada e se virou para o lado.

Passei a mão em suas costas, tentando fazer um afago desajeitado nele. Coitado do meu pai...

Ele tremeu com o contato, mas não se virou para mim outra vez. Devia estar cansado.

Pim ficou me olhando com aqueles olhos pretos arregalados. Me lembrava de um filme que eu havia assistido quando viva... o Exorcista. É, era igualzinha àquela menininha do filme. Só faltava o vestido branco ensanguentado.

Voltando à ViverWhere stories live. Discover now