TRÊS: QUANDO O PERIGO MORA AO LADO.

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Observo através da janela do escritório que tem a vista ampla de todo o ambiente da mecânica, atentando-me ao local. Toda a organização do lugar remete claramente a personalidade do Sr. Velmonte, um tanto metódico e sistemático. Vejo os armários em tom de metal fixados nas paredes que armazenam as ferramentas e utensílios, separados devidamente conforme a utilidade e a proporção de tamanho.

Percebo mais adiante uma certa movimentação, a princípio penso que se trata de meu pai que resolveu voltar e dar-me a devida atenção que eu espero. Porém firmo as vistas até constatar que a pessoa presente ali, não é meu pai e sim Harry. Seu corpo movimenta-se ligeiramente entre os dois carros até os armários para pegar o que aparentemente parece ser uma ferramenta específica para o trabalho que ele está realizando.      

Porém Harry desaparece do meu campo de visão em uma fração de segundos, e eu fico impressionada com a rapidez que isso ocorre. Ergo ligeiramente o corpo tentando o encontrar por entre os carros, mas fracasso em minha busca. Entretanto, a voz rouca e calma de Harry sobressai ao ambiente do escritório e eu olho rapidamente de onde o som surge.

─ Está procurando alguém? ─ O tom irônico é perceptível em sua voz. E eu olho em direção à porta do escritório onde Harry está ligeiramente escorado na lateral da porta, com os braços cruzados.

─ Eu estou esperando meu pai. Você o viu?

─ Sim, ele estava ao telefone. ─ Harry conclui rapidamente, descruzando os braços e deixando visível a chave fixa prateada que ele segura. ─ Depois eu o vi entrando em casa. ─ Ele gesticula com a ferramenta em direção à minha casa e depois rodopia a chave fixa no ar como se brincasse com o objeto.

Disperso minha atenção sobre Harry, e observo as horas no meu relógio de pulso, constatando às horas. Eu havia combinado com Claire e Liam de ir à praia hoje, e ao indicar pelos ponteiros do relógio meu primo estava prestes a chegar com o seu jipe vermelho e 'selvagem' assim como ele gosta de enfatizar tal adjetivo sobre o seu carro.

Percebo que Harry não está mais no escritório, e levanto-me com a intenção de esperar pela chegada de meu primo na varanda de casa. Ao caminhar até a saída, não deixo de notar o moreno que mexe em um dos carros. O capô do veículo está aberto e o corpo de Harry está inclinado à frente, enquanto tenta limpar e apertar alguma peça importante do motor. A blusa clara que ele usa deixa perceptível os músculos das costas e braços que movimentam-se a cada gesto feito. Harry encara-me, com o canto dos olhos, suspeito e receoso do motivo de eu o estar analisando.

─ Está tudo bem? ─ Ele questiona, erguendo o corpo a postura normal e apoiando as mãos na lataria do carro.

─ Sim.─ Digo rapidamente, sentindo um forma-se na minha garganta. Não era a primeira vez que Harry notava eu o encarando.

─ Quero aproveitar e pedir desculpas. ─ Harry soa gentil, o que diverge da falta de expressão que normalmente o moreno dirige-se a mim, entretanto, eu estranho o motivo do seu pedido.

─ Desculpas de que?

─ Por ontem a noite. As luzes ficarão apagadas a partir de hoje. ─ Seu olhar esverdeado analisa-me, enquanto eu tomo consciência da conversa.

─ Eu fui inconveniente, não deveria ter ido incomodar você, ainda mais naquele horário da madrugada.

─ Não, você estava certa. É a sua casa, nada mais justo. ─ Suas palavras são calmas e soam sinceras. ─ Eu só não estou acostumado com a sua presença.

Estranho o modo como ele fórmula sua última frase e não sei ao certo decifrar a tonalidade e a intenção por de trás das palavras que aparentemente soam inofensivas, mas que não escondem o ar ardil que Harry faz questão em ressaltar. Tento repensar em uma maneira de fazê-lo manifestar-se novamente sobre a sua opinião diante a minha pessoa. Contudo a minha breve linha de raciocínio é interrompida pelo o som agudo de buzina que rompe com o silêncio que havia instalando-se entre nós rapidamente.

O SEGREDO DA NOITEWhere stories live. Discover now