Rhinotillexomania

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Rhinotillexomania. (n.): o incontrolável desejo de ser amado.

A mesa de madeira escura, trabalhada em detalhes milimetricamente desenhados, estendia-se à minha frente, imponente. Completando o ambiente ao redor dela, móveis renascentistas se espalhavam, dando um ar aristocrático para a sala. E lá estava eu, brincando de ser importante, chefe de uma grande empresa, reunida com funcionários dos quais eu sempre estava chamando a atenção por não serem eficientes. Isso não é uma metáfora ou uma descrição sutil da minha vida. Eu realmente estava brincando daquelas coisas. Afinal, aos nove anos de idade não dava para, realmente, ser chefe em uma grande empresa.

Àquela altura, com nove anos de idade, um dos meus passatempos favoritos era brincar de ser como o meu pai. Imitava todas as coisas que o via fazer quando se reunia em reuniões em casa, com seus funcionários. Talvez por isso, ele esperasse que eu fosse seguir a mesma carreira que ele e assumir um cargo de executiva em sua exportadora e, posteriormente, o seu cargo. Talvez por isso, o fato de eu ter escolhido uma área completamente diferente para seguir carreira, o tenha decepcionado tanto.

Aos dezessete anos, em uma excursão da escola para visitar universidades e termos contato com alunos de cursos de graduação, visitamos a Harvard Graduate School of Design (HGSD), a escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Harvard. Um instrutor nos acompanhou pelo campus, nos mostrando as salas e laboratórios que os alunos do curso usavam para o seu desenvolvimento durante o curso. Passamos por salas habituais, tradicionalmente dispostas com mesa de professores e mesas para alunos; seguindo para as posteriores salas de pranchetas, onde havia mesas muito maiores, que se elevavam em posição vertical e tinham equipamentos para desenho técnico anexadas à elas. Em seguida, seguimos para as salas de maquete, onde à primeira vista, havia uma enorme maquete do campus da HGSD, disposta para observação dos alunos, bem na entrada. Logo atrás, estavam dispostas ao longo da sala, mesas largas, com maquetes inacabadas dos alunos, cheias de materiais para a construção daqueles mini projetos que algum dia se tornariam algo concreto.

O instrutor nos pediu que não tocássemos nas maquetes, pois eram trabalhos dos alunos e faziam parte de sua avaliação, então, qualquer dano, seria prejudicial a eles; mas ainda assim, pediu que nos aproximássemos das maquetes e as observássemos com atenção. Assim, todos da classe se aproximaram de algumas maquetes por ali. Eu e mais três garotas da minha sala nos aproximamos de uma maquete de uma casa, muito bem feita. Observei que até as portas tinham detalhes e na fechadura minúscula da porta que eu observava, estavam até mesmo os parafusos. Naquele ponto, eu me sentia apaixonada por tudo o que via.

"Vocês estão vendo sonhos. Os olhos de vocês estão contemplando o sonho de alguém e esse sonho um dia se tornará realidade. Esse é o trabalho do arquiteto. Arquitetos materializam sonhos.", o instrutor falou, enquanto admirávamos aquele mini mundo à nossa frente. Enquanto ele falava, minha mente mergulhou em divagações e projeções sobre como as pessoas viveriam naquela casa, quem seriam aquelas pessoas, quem havia sonhado com uma casa como aquela e em como deveria ser maravilhoso para um arquiteto construir, materializar, realizar o sonho de alguém. Foi nesse exato momento em que eu caí de amores pela arquitetura.

Depois do nosso intervalo para almoço, o instrutor nos levou para uma palestra com um arquiteto mundialmente famoso, chamado Frank Gehry. Ele estava lá para palestrar para os alunos do último período do curso e tivemos a sorte de ver. Até o momento, meu coração estava dividido entre ceder aos meus recentes sentimentos pela arquitetura ou continuar querendo seguir os passos de meu pai, mas naquele instante, eu decidi: eu seria arquiteta.

"Arthur Shopenhauer disse uma vez: a arquitetura é música solidificada", disse o homem à nossa frente. Suas palavras me soaram como música e depois daquele dia, eu passei a sentir todos os ambientes dentro de mim, da mesma forma que eu sentia a música em meus ouvidos.

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