E foi então que eu decidi sair da cama.

Se ele estava fora e ia voltar tarde, então eu poderia dar uma passadinha em seu quarto, não poderia? Foi o que eu pensei também.

Não me dei ao trabalho de calçar sapatos, porque andar descalça faria muito menos barulho. Minha camisola era meio grande para o meu tamanho, esbarrando no chão, mas se eu tomasse cuidado, não haveria problema.

Peguei o pequeno castiçal que estava sobre o criado-mudo, com uma vela meio derretida, e caminhei até a porta. A chama fazia sombras bruxuleantes dançarem pelas paredes conforme eu andava, dando uma sensação meio fantasmagórica aos meus passos.

Saí para o corredor e fui andando devagarinho, rezando a cada passo para que eu não pisasse em uma tábua que rangesse e acordasse dona Margot ou Sebastian. Se algum hóspede me visse não haveria problema nenhum, mas aqueles dois... Sebastian provavelmente ia me expulsar dali e me deixar à própria sorte nas Terras Não-Clamadas, o que não era exatamente meu plano.

Subi a vela pela madeira das portas conforme passava, até encontrar aquela em que Jax tinha deixado sua doce mensagem. É claro que ela podia estar trancada, mas talvez...

Click.

A porta se abriu quando girei a maçaneta e tive de sufocar um gritinho de empolgação. Nada muito fora do normal acontecia no castelo dos meus pais e, até aquele momento, eu estava tendo os dias mais excitantes da minha vida. Invadir quartos de ogros mal-educados só aumentava a adrenalina da coisa toda.

Me esgueirei para dentro, fechando a porta em seguida e respirando aliviada. Não sei se foi exatamente uma boa ideia, porque o cheiro de Jax invadiu minhas narinas com uma intensidade assustadora. Hortelã e coisas selvagens. Por todo lado.

A janela estava aberta, e a luz da lua cheia banhava as paredes com uma cor azulada. Girei a vela de um lado para o outro, tentando enxergar o que havia ali. O quarto, de fato, parecia muito estéril para uma pessoa, muito impessoal. As paredes pareciam limpas demais, vazias demais. Não havia livros, não havia quadros. Não havia nada.

Por um momento me perguntei se havia entrado no quarto certo, mas eu sabia que sim. Se a cama de solteiro não estivesse bagunçada, eu nunca desconfiaria de alguém dormia ali.

Dei mais alguns passos, ainda percorrendo as paredes e o chão na tentativa de achar alguma coisa, mas, além de roupas jogadas nos cantos, não havia nada. Jax era... vazio.

Aquilo me incomodou de alguma forma. Era intrigante, mas era triste ao mesmo tempo. Não que isso tirasse dele a responsabilidade por me deixar para morrer, mas acho que foi a primeira vez que eu percebi que talvez houvesse alguma coisa realmente errada com ele.

Andei até sua cama e me sentei nela. Eu sabia que aquilo era invasivo, mas não pude evitar. Ninguém ia ficar sabendo mesmo.

O cheiro era mais forte ali, nos colchões e nos lençóis, e subia conforme a brisa entrava pela janela. Coloquei o castiçal sobre o criado-mudo dele e passei as mãos pelo tecido, como se tentasse entender alguma coisa.

– Vejo que encontrou os Trent.

Tive de reprimir um grito de susto. Tobias estava parado no batente da janela, aquela cauda balançando, os olhos brilhando por causa da luz da lua.

– Meu Deus, você quer me matar de susto?

– Não seja dramática, princesa. – ele pulou para a cama e veio até mim, se esfregando em meu corpo. – Achei que fosse ser recebido com um pouquinho mais de entusiasmo.

Acabei cedendo com um sorriso, correndo meus dedos por seus pelos. Ele pareceu satisfeito e pulou de volta para o batente da janela. Então, estreitou os olhos felinos e olhou em volta.

Coração de vidro [FINALIZADA]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora