—Então você deveria ir — Ergueu as duas sobrancelhas.

Eu sei que deveria ir. Eu nem deveria ter ficado ontem, talvez não devesse nem ter vindo saber como ela estava. Sei lá. Tô tão confuso com tudo isso.

—Você deveria descer comigo — Olhei pra ela de lado — Querendo ou não... Faz parte agora.

—Do que?

—Da minha família — Apertei os lábios.

—Não — Ela soltou uma risada, mas parece tão... Doída — Não faço parte da sua família. Não confundir as coisas, lembra? O bebê faz parte, eu não.

Quero corrigir. Quero mesmo.

Lembro da conversa que tivemos no closet, do jeito que ela abraçou as pernas e disse o quanto queria deixar alguém entrar. Devia querer fazer parte de algo também, de uma família. E isso tudo leva à mim. Ao quanto eu já quis isso um dia, o quanto pensei que funcionaria, que ia colocar uma aliança no dedo de alguém e formar uma família dessas que fazem churrasco aos domingos e planejam casamentos, aniversários, batismos.

Então entendo o motivo dela dizer isso agora, de precisar afirmar em voz alta e se proteger de algo que tem tudo pra dar errado.

A gente já se meteu em cada merda, se meter em mais uma não é opção.

—Você não precisa ser nada minha pra isso, sabe? Já é a mãe do meu filho — Custei a falar.

—Isso não é o suficiente — Afastou o edredom com as pernas e jogou-as pra fora da cama.

—Como não é o suficiente? — Levantei e fui atrás dela.

—Pra mim. Não é o suficiente pra mim — Murmurou passando a mão no rosto — Você não entende? Nunca tive o que você tem.

—E o que você quer? O que você quer de mim? — Toquei seu braço, mas ela esquivou, se afastou do toque.

—Porque estamos tendo essa conversa, Gabriel? A gente sabe que não vai levar a lugar nenhum, eu e você... — Soltou um suspiro, passou a mão no rosto e quase. Quase passou a mão na barriga também. Porra eu fiquei ansioso pra ver, mas não aconteceu — A gente não funciona.

—Certo — Soltei uma risada — Desde que decidimos parar de discutir não estamos funcionando então? É isso que tá me dizendo?

—Não. Tô dizendo que discutindo ou não... Você sabe que não vai dar certo — Morde o lábio — Você me beija, diz que não quer. Dois dias depois me pede outro beijo, volta atrás — Conta nos dedos — Diz que a gente não pode confundir, mas deita na cama comigo e diz que não quer ir embora. Eu não tô te entendendo.

Nem eu.

Também não tô me entendendo.

—E me desculpa, mas eu não quero ser sua válvula de escape. Não quero ser usada pra você esquecer outra pessoa. Eu tenho problemas demais, você tá ciente de todos eles. Tudo que eu menos preciso é ter que lidar com o fato de que pela milésima vez vou ser a segunda, a que não tem problema machucar, a que é descartável — Soluça. Puta merda, cara. Ela tá chorando. Muito. E eu tô... Porra. Tô a um passo de mandar tudo a merda e chegar mais perto — Então não. Eu não quero fazer parte da sua família, só isso não é o suficiente pra mim porque o pouco é tudo que eu tive a vida toda.

É tão automático dar passinhos pra perto, do mesmo jeito que sei que é automático ela dar esses passinhos pra trás.

—Pilar...

—Não, sério. Não fala nada, só vai falar com seus pais. Com a sua família — Ela aponta com o queixo pra porta do quarto.

—Vai descer depois? — Me escuto perguntar. Que patético, cara. Quando foi que você se tornou isso?

𝐐𝐔𝐄𝐑𝐈𝐃𝐎 𝐁𝐄𝐁𝐄 • 𝐆𝐀𝐁𝐈𝐆𝐎𝐋 (𝐏𝐀𝐔𝐒𝐀)Waar verhalen tot leven komen. Ontdek het nu