- Aqui, mãezinha... - digo suavemente, e pego a sua mão fria, repouso em meu colo. Faço a assepsia e injeto a medicação lentamente para não ter efeito, e também não estourar a veia. - Pronto. - digo assim que termino.

- Obrigada. - ela murmura cansada, com os olhos semicerrados e ainda abraçada no vaso.

Descarto a seringa e o algodão. Parti-me o coração ao vê-la assim. Sento-me ao seu lado e espero com as pernas dobradas, e abraçada a elas. O remédio não demoraria muito a fazer efeito. Ficamos em silêncio, apenas ouvindo as nossas respirações. Olho pro nada, e tento não chorar... Não quero que ela se sinta pior. Minha cabeça começa a latejar profundamente, e eu sinto como se o meu crânio fosse se partir de dor, fecho os meus olhos.

Vomitando sangue...

Ela está vomitando sangue. O médico alertou que isso aconteceria, é o presságio do fim. Sinto uma sensação sufocante em meu peito e aperto mais as minhas pernas contra o meu corpo, esquecendo-me que as minhas mãos estão machucadas. Elas doem, mas nenhuma dor se compara da minha alma...

Estou perdendo a minha mãezinha...

Minha vontade é de gritar, e chorar. Mas, engulo as minhas lágrimas e minhas angustias. Tento me manter tranquila por saber que o meu desespero a destruiria. Tremo, meu queixo bate, mas não é de frio, e sim de medo, um medo que age em meus ossos e os corrói.

- Filha? - a voz de mamãe soou baixinho.

Levantei a cabeça, e a olhei. Estava tentando se levantar. Ergo-me rapidamente, e a ajudo. Ela pede para ir à pia; escova os dentes, e molha o rosto. Depois, o enxuga, e vamos para o quarto, lentamente, porque ela está um pouco tonta. Deito-a na cama, e a cubro com o edredom. Ela me olha com carinho e sorrir em agradecimento.

- Se eu soubesse que a senhora estaria assim, não tinha saído depois do trabalho, mamãe. - Comento com o cenho franzido.

- Eu estava bem. - ela respondeu um pouco sonolenta. Os seus lábios estavam tão brancos que parecia que não tinha nenhuma gota de sangue nela. - E fiquei muito bem por um bom tempo. Depois que me veio à vontade de vomitar...

- Se eu tivesse em casa, poderia lhe auxiliar melhor. - digo me sentindo culpada por ter saído pra me divertir, e ter deixado mamãe muito tempo sozinha.

- E você me auxiliou perfeitamente bem. Se você tivesse em casa, não iria mudar o fato de que eu teria que ir ao banheiro vomitar, minha filha. São os efeitos colaterais, não pode se controlados por ninguém. - mamãe disse me olhando, então segurou a minha mão suavemente. - Você não pode parar a sua vida por eu estar doente, me sentiria péssima se fizesse isso.

Seguro a sua mão e dou um leve beijo no dorso.

- A questão, é que me sinto displicente...

- Não é pra sentir. Quando descobrir que tinha câncer, qual foi a nossa conversa?

- Que as coisas seriam como sempre foi sem nenhuma mudança por causa da doença. Que o câncer tinha que se adaptar á nós, e não nós a ele. - falei com um suspiro.

- E continua assim. - mamãe sorriu. Então, virou a minha mão, fazendo uma careta. - Querida, o que aconteceu com a sua mão?

- Cai. - cocei o meu olho para evitar que o tique nervoso me acometesse.

- Cruzes filha, desde ontem que acontece coisas com você. É bom tomar um banho de sal grosso pra afastar o mau olhado. - mamãe murmura e solta a minha mão. - Conte-me... Como foi passeio com a sua amiga... Qual é o nome dela, mesmo?

- Freen. - respondo com um meio sorriso.

- Freen... Foi a mesma que a atropelou ontem, não?

- Sim! - eu rir, e mamãe também. - Ela me buscou no trabalho e formos para a praia. Foi divertido, comemos sanduíches, e assistimos o por do sol. - solto um suspiro sonhador ao me recordar do encontro.

- Hum... - mamãe estava bem sonolenta, efeito do remédio. - Você está feliz, hum?

- Sim, muito. - confessei sem parar de sorrir.

- Eu também me sinto feliz por ti, meu amor... Vejo que essa amizade está lhe fazendo muito bem. Está até mais coradinhaa. - mamãe comentou, inocentemente.

Fiquei em silêncio por uns minutos, apenas a observando, sua expressão estava suave, beirando a tranquilidade. Era um sinal de que não estava sentindo nenhuma dor.

- Mamãe... O papai foi o seu primeiro namorado? Primeiro tudo? -  pergunto. Sei da história deles, como se conheceram e se apaixonaram, mas e antes? Será que tiveram algo com outras pessoas?

- Não. - mamãe se aninhou mais na cama, e abraçou o travesseiro. - No colegial, namorei um rapaz, muito bonito e com um porte elegante. Ele era a sensação do momento. Todas o queria, mas ele me escolheu para namorar. Ele foi o meu primeiro amor. 

- Sério? - perguntei com os olhos arregalados em surpresa. - E por que não ficaram juntos?

- A família era contra. Eles eram ricos. Podre de ricos. E eu, uma simples garota do interior. Sem dinheiro para nada, nem pra cair dura. - riu da sua piada. - E tinha uma menina que vivia correndo atrás dele, sabe? Causando intrigas, infernizando de verdade. Até aí, levávamos. Estávamos apaixonados, e sabíamos que queríamos. Porém, a menina se aliou com a família dele. Foi demais para nós. Uma coisa desencadeou outra... Brigamos sério, e terminamos o namoro. Ele ficou com ela, mas depois se arrependeu e tentou reatar, ainda ensaiamos uma volta, mas ela anunciou aos quatros ventos que estava grávida. - mamãe bocejou. - Foi o nosso fim definitivo. 

- Poxa... Que história! - falo impressionada. - Nunca que imaginaria que a senhora tivesse passado por uma situação dessas. Deve ter sido muito difícil para ti, mamãe. 

Mamãe balançou a cabeça em positivo, então, sorriu.

- Foi... Mas tudo se passa nessa vida, minha filha. E a melhor coisa me aconteceu: Conheci o seu pai, e tive a filha mais linda de todas. Talvez, se eu tivesse com o meu primeiro namorado, eu não tivesse sido abençoada com uma família tão linda. Deus escreve certo em linhas tortas, não posso deixar de me sentir mais abençoada. - disse com carinho.

Inclinei-me para abraçá-la e beijar a sua testa. Quando me afasto, mamãe estava a dormir com um leve sorriso nos lábios. Desço com cuidado da cama para não acordá-la. Recolho a minha mochila e vou para o meu quarto... Dou uma rápida organizada no mesmo, e depois rumo para o banheiro. Debaixo do chuveiro que deixo que tudo que assombra o meu coração saia... A água do chuveiro arrasta de mim a tristeza juntamente com as minhas lágrimas.

Não quero pensar, não quero me martirizar com a situação crítica de saúde de mamãe porque sei que ficarei com esse caroço preso em minha garganta que me sufocará á cada segundo, mas é tão difícil... Sei que prometi que não ficaria assim á ela. Mas ela é minha mãe, meu amor maior! Tudo o que tenho em minha vida, sem ela ficarei completamente sozinha...

Você não está sozinha... Tem a Irin, e o Luke, mas, acima de tudo, você tem a Freen...

Meu cérebro me informou. Porém, nenhuma pessoa, não importa o valor que nos tenha na vida, nunca será tão importante como a nossa mãe. Jamais. É insubstituível. Não sei quanto tempo fiquei debaixo do chuveiro, mas quando a minha pele começou a arroxear, sair... Vesti o meu pijama de camurça, e penteei os cabelos, eles soltos dava para ver como o desastre da franja foi grande.

Olhei a mamãe que dormia tranquilamente e desci, arrumei a sala, e depois a cozinha. Preparei uma xícara de chá e fui para a varanda, sentei-me e fiquei olhando a escuridão. Lembrei-me da história de mamãe com o seu primeiro namorado, era impossível não lembrar também de Freen... No contexto de que ela é rica, e eu pobre, e que tem a Alison... Muito estranho tudo isso.

Pensar em minha namorada me fez sorrir... Queria que ela estivesse aqui nesse momento, à presença dela iria me reconfortar muito. Mas, como infelizmente é possível. Fiquei a tomar o meu chá, e deixei que o devaneio tomasse conta de mim...



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Sei não, mas acho que a mãe da Becky não irá durar muito mas não 😟 E essa história que ela pra Becky, coincide com a que a mãe da Alison tbm contou. Será que tem alguma coisa a ver? 

El Sabor De Lá Venganza { FreenBecky }Where stories live. Discover now