Onde há fumaça, há fogo

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"E quando o céu escurecer, quando a esperança acabar, só há um sentimento capaz de trazer união novamente. E a este sentimento nós brindaremos, porque ele acabará com o fim dos tempos."

Quando o céu voltou a escurecer, após as familiares e míseras três horas de Sol, e tomou uma tonalidade vermelho-sangue ao invés do arroxeado que o reino estava acostumado, todos souberam que algo estava errado e se prepararam para o pior. Andrei Volgermann caminhou até a janela de seu escritório, observando com atenção os portões de Obumbratio, enquanto estalava os dedos repetidamente, um ato nada discreto que denotava seu nervosismo com a situação, antes que as portas do cômodo fossem abertas de forma exagerada e teatral por sua mãe, Victoria, que irrompeu no ambiente seguida de boa parte da família e de alguns militares, justamente os que deveriam cuidar da chegada dos herdeiros no Reino.

A elegante mulher vestia um vestido claro, combinando com sua pele pálida e seus olhos azuis, assim como os curtos cabelos loiros. Ela estava, como sempre, majestosa. O mesmo não se podia dizer dos familiares e soldados que estavam atrás dela: todos usavam seus trajes de patrulha e guarda das fronteiras ensanguentados e rasgados, provando que, ao contrário do que pensavam os plebeus humanos, a realeza Volgermann tinha mais o que fazer além de dar festas luxuosas e usar jóias caras.

Além disso, notou o homem, estavam todos desnorteados, o que só podia significar uma coisa:

— Meus filhos não chegaram ainda? — perguntou, a voz perigosamente baixa e calma enquanto recebia acenos negativos de cabeça, antes que seu olhar passeasse pela sala e se instalasse em um ponto para além da janela: a visão de Scapaccio — Eles nunca se atrasam.

— Acha que estão com eles? — A pergunta veio de Ekaterina, mas transmitiu o pensamento de todos os que estavam presentes no escritório.

Claro que o primeiro pensamento do monarca foi também o mais óbvio: os Vacchiano haviam sequestrado seus filhos e a tropa que saíra com eles. Não seria a primeira vez que eles fariam algo assim apenas para provocar a ira dos Volgermann e, se esse fosse o caso dessa vez, Andrei se certificaria de que seria a última, pois não sobraria nenhuma criatura com tal sobrenome para contar a história depois.

— É o que vamos descobrir. Preparem os cavalos, temos uma visita à fazer. — sussurrou, assentindo enquanto o fazia, como se estivesse pensando em um plano consigo mesmo, antes de se recompor e caminhar na direção de sua mesa — Não digam nada à Charlotte enquanto não tivermos certeza, irão preocupá-la à toa.

— Meu bom amigo, me escute. — A voz calma e didática de Raphael se fez ouvir e todos se viraram para ele, o observando caminhar até o monarca e colocar a mão em seu ombro, da forma segura como só ele sabia fazer — Como pretende invadir Scapaccio com meia dúzia de familiares? Isso seria uma catástrofe, não perderíamos apenas uma batalha, perderíamos tudo.

— Mas meus filhos, eles-

— Meus filhos também estão lá, e por isso peço que tenha prudência. — Andrei suspirou, se afastando, e ele continuou — Você pode ser Vossa Majestade para os humanos que estão lá fora, mas para mim, você é apenas meu irmão, e eu não posso deixar que tome uma decisão como essa sem pensar antes.

Antes que qualquer um pudesse dizer uma palavra para cortar o silêncio que se seguiu, uma sirene alta foi ouvida e todos praticamente correram até a janela, acompanhando os portões serem abertos para a chegada dos herdeiros com sua comitiva, ou o que restara dela. Meia-hora atrasados, pela primeira vez em suas existências, e Andrei quase não queria saber o que havia os segurado tanto tempo, porque se soubesse, talvez Raphael não tivesse tanta sorte em controlar sua ira.

Sanguinis PetalaOnde histórias criam vida. Descubra agora