0.8

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— Lucas me disse que ele se machucou.

Olhei por cima da mochila enquanto Victória, a primeira pessoa a me convidar para almoçar em sua mesa na cantina, sentou-se ao meu lado no banco de concreto. Ela também estava na sala de Cameron. Lucas, com quem
tinha um namoro meio enrolado, era o meia do time de futebol.

— É por isso que ele não estava na sala — falou. — Lucas disse que Cameron queria que Harry iniciasse um tratamento pra melhorar.

Assimilei a notícia e tentei fingir que não ligava. A última coisa que queria era que Victória soubesse o quanto meu coração começara a disparar.

Mas, em todas as vezes que eu disse a mim mesmo, que não queria mais vê-lo, apesar de todas as maneiras que imaginei mandar ele embora, no instante em que entrei na classe e vi a carteira de Harry vazia, era como se alguém me deixasse sem ar com um soco no pé do estômago.

— Ah.

Victória tomou um pouco d'agua em sua garrafinha. Com seus longos cabelos loiros e olhos verdes matadores, era uma das meninas mais lindas que eu já tinha visto. Se eu não pensasse tanto em Harry, e se ela estivesse solteira quem sabe...

— Ah? — repetiu. — É isso? So isso? — Ah?

Levantei os ombros. — O que mais eu poderia dizer? — Não iria fazer as perguntas que quase não me continham, tipo quando se feriu ou se a coisa foi feia.

— Ah, não sei. Talvez você me dê alguns detalhes, já que estava com ele quando aconteceu.

Uma brisa quente soprou entre os carvalhos que cobriam o pátio. As árvores ali eram um pouco menores que as da entrada, não tão antigas mas as folhas pendiam. Mesmo as poucas ocasiões que eu ficava sozinho, era como se alguém mais estivesse ali... ou muito mais gente... uma multidão, talvez? Por causa das folhas que balançavam, pensei comigo. Aquilo criava uma... energia.

— Não sei do que está falando Vic... — comecei, mas o sorriso dela logo me deteve.

— Como assim? — ela disse. — Eu vi as fotos.

Gelei.

— Fotos?

— É, no perfil da Eleanor, no facebook. Foi lá que aconteceu, não foi? No velho casarão?

Fechei os olhos. Tentei me concentrar. Não sabia o que perguntar primeiro.

Victoria me poupou em relação a isso. — Mal acredito que você foi lá, Lou. — falou apressada — Sabe, nem pagando. Nem por um milhão de dólares eu iria até lá...

- Por quê? - Procurei minha garrafa d'água dentro da bolsa sem quebrar o contato visual com Victoria.

  —  Ah, não sei... Talvez porque as pessoas que entram ali morrem.

Aquilo me pegou. Quero dizer, realmente me pegou. Encontrei a garrafa e desenrosquei a tampa, fingindo que meu coração não pulsava tão forte a ponto de doer. — Essa é uma afirmação bastante falsa.
— Harry se feriu, não foi?
— Ferir-se não é o mesmo que morrer.
— Então por que todos corriam?
Eu definitivamente precisava ver as fotos que Eleanor tirara para compartilhar com seus 5k de amigos no facebook. — Foi apenas uma brincadeira que fizemos, nada mais. — falei.
— Ah, está certo. Vocês pareciam mesmo que estavam se divertindo.
Dei um gole, esperei pelo calor. Puxa, que droga. Estava em Nova Orleans. Em pleno começo de outubro. A temperatura era mais alta que a conta bancária do Obama, a umidade fazia com que parecesse um banho de vapor. Estava muito, mas muito cansado de sentir frio. Não fazia sentido. Podia suportar temperaturas abaixo de zero, ou até mesmo nevascas, mas ali, nessa sauna de Nova Orleans, eu não conseguia parar de tremer de frio, qual era meu problema? O que falta em mim?
— Não olhe agora, mas lá está ele.
E por que essa gente ficava dizendo o que eu devia ou não fazer?
Assim que alguém diz para não se virar, é exatamente isso que você vai fazer. Bobamente, voltei-me para a entrada da academia no momento em que Harry, Zayn e o namorado de Victoria, Lucas, dobravam uma esquina. E, pela primeira vez reparei que ele mancava.
Quando aquilo aconteceu?
E por que eu não tinha reparado?
— Qual é a de vocês dois, afinal? — Victoria perguntou.
Voltei a olhar as raízes dos antigos carvalhos. Harry estivera correndo, eu sabia. Na escuridão, eu o ouvi gritar, e o vi correndo da casa...
— Nada. — Respondi.
— Ah, acho que é por isso que ele não para de olhar para cá, né?
Eu me contive para não olhar. Se olhasse, teria visto Eleanor se aproximando.
— Lou!! — Falou ela, vindo até mim como se fôssemos amigos que não se viam havia tempos. — Aí está você! Tentei te encontrar o dia todo.
Eleanor Calder, era a última pessoa que eu queria encontrar, mas de jeito nenhum ia dar satisfação a ela como se eu me importasse. — ou lembrá-la que já havia me visto ao menos quatro vezes hoje.
Levantei-me.
— Estou tão feliz que esteja bem. - assustou-me ao falar. E aí meu queixo caiu. Ela abraçou-me, envolvendo-me naquele cheiro de spray pra cabelos, nojenta. — Estava tão preocupada.
Concentrei-me no céu. Era azul, um azul muito vívido, com finos torvelinhos de nuvens. Concentrei-me nisso, no canto dos pássaros que se escondiam em algum lado, determinado a não permitir que...
Mas, mesmo quando as linhas se confundiam, eu sabia que não iria funcionar. Quando as visões começavam, uma vez que esses raios surgiam de repente, eles nunca mais se dissipavam.
Não até que eu vira o que iria acontecer, o que as visões queriam me mostrar.

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