JOGO DE MARIONETES | O egoísmo dos homens revela suas sombras mais obscuras.
Valentim nunca enxergou Maeve como uma criança.
Desde o momento em que a sequestrou ainda bebê, ela foi apenas um experimento. Uma arma em potencial.
Criada entre cientista...
— A filha que eu criei — ele disse, a voz tão suave que só eu e talvez Yisa ouvimos — sabe a importância da paciência. Mas também sabe o custo da hesitação. Não estamos apenas coletando dados, Maeve. Estamos preparando o terreno para a reivindicação final. O futuro da humanidade aqui passa pelo colapso daquela liderança. Você é a chave.
Seu discurso era sobre missão, sobre o grande plano. Mas para mim, eram palavras de pai. "A filha que eu criei". "Você é a chave". Eram um lembrete e uma corrente. Ele não estava ameaçando. Estava confiando. E aquele peso era pior do que qualquer ameaça.
— Entendido — respondi, mantendo o contato visual, projetando determinação. — A chave não falhará.
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EU ESTAVA SENTADA COM KIRI à beira do riacho, e a textura da terra úmida sob minha pele era uma verdade tão forte que parecia apagar a memória da cadeira do Centro de Comando.
Em minhas mãos, eu girava a folha de Líria-noturna que ela me dera.
— A mamãe dizia que ela guarda o sussurro do dia e o libera nos sonhos — a voz de Kiri era um murmúrio harmonioso com o riacho.
"A Grace dizia". Cada vez que ela começava uma frase assim, uma pontada de inveja, aguda e feia, me perfurava. Não pelo conhecimento, mas pelo tom. Era como se ela tivesse mais próxima dela do que eu.
— Você viu nos vídeos diários? — perguntei.
— Sim. — Ela colocou a mão no peito. — Mas as vezes, se fico muito quieta, é como se eu conseguisse ouvir a voz dela explicando. Como se ela tivesse plantado as respostas na floresta para eu encontrar.
O aperto no meu peito foi quase insuportável. Esta Grace, a que vivia na voz de Kiri e no brilho dessas folhas, era uma estranha. Uma estranha que eu começava a desejar ter conhecido.
— Deve ter sido bom — soltei as palavras para o riacho, não para ela. — Pode ter acesso as coisas que ela deixou para você.
Senti, mais do que vi, o olhar ponderado de Kiri sobre mim.
— Ela deixou algo para você também, Maeve. — Sua voz era suave. — A marca é só um sinal. O que ela realmente deixou... está aí dentro. Na sua conexão. Você sente a floresta de um jeito diferente. Não é como os outros. É como... é como eu sinto.
Ela tinha tocado no núcleo do meu segredo mais íntimo. A conexão. Aquele puxão na alma, o sussurro nos cipós, o chamado nos sonhos que eu atribuía a fraqueza ou a loucura. Era real. E era igual ao dela.
— Às vezes — admiti, num sopro que quase se perdeu no vento. Era a maior confissão que eu poderia fazer.
— Então escute — ela disse. — A resposta para a sua confusão não está com os humanos, nem só nas suas memórias. Está aqui. Eywa guarda todas as memórias. Até as que foram roubadas.