Capítulo XIX

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Ter aceitado a proposta do Michael foi a melhor coisa que eu poderia ter feito, pois os dias que se sucederam foram maravilhosamente bons, mesmo eu estando um pouco sobrecarregado com o trabalho, já que faltei por vários dias. Michael era bastante prestativo, sempre me ajudando ao máximo no que podia. Ele insistia em me deixar e me trazer de volta para casa, segundo ele eu não deveria andar sozinho durante a noite. Percebi como ultimamente ele anda um pouco mais radiante, nem parecendo aquele ser sombrio e assustado de antes.

Os dias passaram rápido, as semanas se sucediam como em um piscar de olhos. E cada vez mais nos aproximávamos, deixando de lado os medos, os receios. Confesso que não havia nada melhor do que me tornar íntimo de alguém. Nos finais de semana eu aproveitava para desenhar um pouco, ele sempre gostava de fazer alguma coisa na casa, seja arrumá-la ou consertar algo. Mas em um final de semana ele começou a usar uma furadeira e martelos, ao descer as escadas o vejo montando uma estante na sala. Fiquei muito curioso e perguntei o porquê daquilo, ele então me responde:

— É para você colocar os seus livros aqui, acho que podem caber muitos mais — Achei aquilo tão fofinho, ele era um doce de pessoa, tão atencioso, era tudo o que eu queria e tudo que eu tinha naquele momento.

— Não precisava se incomodar com isso — Falei o abraçando, ele me afastou e disse:

— Estou todo soado e você aí cheiroso — Confesso que ver os músculos do braço daquele homem brilhando devido ao suor era uma imagem maravilhosa.

— Quer ajuda? —

— Não precisa, vai descansar, você deve estar muito cansado do seu trabalho — Aquele homem conseguia me encantar de qualquer forma. Ele sabia ser um misto de tudo o que sempre desejei e de coisas das quais nunca tive imaginação.

No final da tarde ele me chamou para corrermos juntos, ele era bem dedicado a exercícios físicos. Aceitei e juntos corremos um pouco ao redor do quarteirão, não aguentei correr muito e parei ofegante, ele somente riu de mim e parou também.

— Acho que eu não fui feito para correr — Digo quase com meus pulmões saindo por minha boca.

— Tudo bem podemos fazer uma pausa —

Ele sentou-se no meio-fio e fez sinal para que eu me sentasse também, percebi que ele olhava aquela rua com bastante atenção, talvez estivesse relembrando de momentos do passado.

— Minha mãe costumava caminhar por aqui comigo quando eu era criança, íamos para escola juntos, todo dia, com as mãos dadas e balançando o braço pelo caminho. Ela cantava uma musiquinha animada, ainda consigo lembrar da doçura de sua voz —

— Você de ter tido uma infância maravilhosa —

— Até que tive, considerando que eu perdi meu pai no meio dela. Por mais que isso tenha sido traumático ainda assim tem momentos que guardo com muito cuidado, eles são tudo para mim —

— Logo você vai construir memórias tão maravilhosas quanto essas —

— Eu sei, estou vivo novamente, me sinto vivo. Graças a você — Ele me lança um olhar indescritível, eu não conseguia ler seus sentimentos, apenas sabia que aquelas palavras fizeram o meu coração palpitar. Ele segurou a minha mão bem forte, naquele finalzinho de tarde, quando pouco a pouco as luzes sumiam o céu estava repleto de nuvens pintadas de laranja pelo crepúsculo. A lua crescente estava esplendorosa. Pássaros voavam em busca de seus ninhos e olhos incríveis brilhavam na minha frente.

— Promete que nunca vai me abandonar? —

— Eu prometo. —

— Você foi a melhor coisa que me aconteceu, fico pensando no quanto minha vida era inútil, mas agora quando eu te vejo, tenho plena certeza de que valeu a pena ter aguentado um pouco mais. Você me dá vontade de viver Miguel, todos os dias quando eu acordo e te vejo ao meu lado tenho plena certeza de que os tempos de dor passaram e que os dias daqui para frente serão apenas agradáveis. —

— Sabe quando eu saí do México, nunca imaginei que viveria isso, você também me dá vontade de viver —

Ele sorriu e depois olhou para o céu, conforme ia escurecendo mais estrelas apareciam, isso apenas significa que mesmo em meio a escuridão restava um pouco de luz. No meio de um coração com tanto ódio ainda restava um pouco de amor. Não sei se ele me ama, mas eu o amo, eu o amo demais. Quase três meses vivendo juntos e isso é tempo bastante para ter plena certeza disso. Eu amava em dúvida, mas não em desespero, isso era uma coisa tão boa, sempre ouvi falar que os amores machucam mais do que o ódio, mas meu amor por ele era puro, era bom. Ele também era bom, uma pessoa da qual tenho plena certeza de que jamais me causaria dor, da qual vale a pena viver vários anos juntos.

Esse desejo de louco de envelhecer com alguém era maravilhosamente bom, mesmo que o tempo tenha suas incertezas, mas para uma pessoa incerta lidar com as adversidades não era nada complicado. Ali juntos no meio-fio, debaixo de uma árvore da qual dançava as folhas no suave soprar do vento frio, estávamos de mão dada, mesmo conhecendo toda a maldade do mundo, estando ao seu lado eu não sentia medo. Ele me fazia desafiar meus pesadelos e ir além de onde jamais consegui ir. A verdade que amar exige força, exige determinação. Essas coisas eu tinha pouco, mas por ele eu me desafiava.

— Às vezes fico te observando, admirando cada pequeno detalhe e me perco, fico em dúvida se você é real ou não. Você é bonito pra caralho, sei que essas palavras são feias, mas não consigo ser uma pessoa normal perto de você. — Ele me beija ali, com carros e pessoas passando. Aquele sim era um momento que ficaria na minha memória. Amar sem medo era a melhor coisa do mundo. Retribuo o beijo. Muitas vezes em momentos de euforia perdemos a razão e fazemos coisa das quais nos resguardamos e foi isso o que eu fiz;

— Eu te amo, eu te amo demais Michael — Ele cessa o nosso beijo, por um breve momento eu me arrependi de ter dito aquilo, mas ao perceber sua expressão de surpresa e felicidade tudo passou.

— É sério? De verdade mesmo, não está brincando comigo? —

— Claro que não, por que eu faria isso? — Ele então me ergue e fica me rodopiando no ar como se eu fosse um troféu, fico um pouco confuso com a cena até que ele me solta no chão e me diz:

— Eu te amo, eu te amo demais. Eu fiquei com tanto medo de você não sentir o mesmo — Ele sorriu e jogou a cabeça para trás, como se risse de sua idiotice, achei aquilo muito fofo — Eu amo cada detalhe em você garoto, sou louco por você — Desnorteado com sua declaração e extremamente contente decido ir mais além:

— Michael —

— Me chama de Mike, todo mundo me chamava assim —

— Mike, quer namorar comigo? —

Amor além das fronteirasWhere stories live. Discover now