07_ Quem é bom no que faz?

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ㅡ Não... ㅡ Disse baixo apenas para mim mesma. Meus pés deram passos cursos e medrosos para trás automaticamente. Íris notou meu pavor e fez uma careta.

ㅡ Que foi? Ta passando mal? ㅡ Ela perguntou tocando meu ombro, felizmente, todos estavam ocupados cochichando e falando sobre o rapaz parado a frente da sala para notar minha situação.

ㅡ Ele... ㅡ Indiquei com o dedo da maneira mais discreta que consegui. Íris olhou para ele.

ㅡ Não me diz que você ta assim só porque o cara é bonito... ㅡ Balancei a cabeça de imediato.

ㅡ Não! Ele... Ele é o gringo que foi na cafeteria e me viu chorando ontem. É ele! ㅡ Ela arregalou os olhos quando entendeu. ㅡ Tinha que ser ele? ㅡ Tentei cobrir meu rosto. Estava morrendo de vergonha por conta da noite passada.

ㅡ Nossa... Quais eram as chances? ㅡ Ela fez outra careta.

ㅡ A turma é sua. ㅡ Mônica disse ao rapaz antes de se sentar na cadeira ao canto da sala. O rapaz tirou o casaco que vestia e o pendurou numa das janelas. Ele voltou para o meio enquanto analisava cada rosto presente ali. Quando passou por mim, seus olhos pareceram me reconhecer, mas, para minha sorte, ele não disse ou fez nada, apenas continuou a analisar o resto dos alunos.

ㅡ Quem aqui se considera bom no que faz? ㅡ Um balão de confusão se instalou em minha mente assim que ouvi essas palavras saindo da boca dele. Primeiro: ele falava português?? Por que ele me fez ficar falando em inglês com ele na cafeteria se sabia falar português?? Segundo: eu me considerava muito boa no que fazia. Eu sempre tive muitos complexos e não me considerava lá grandes coisas, mas aprendi com o tempo a me valorizar e hoje reconheço que a dança é o meu maior talento, então, sim, eu devia responder, porém, estava com vergonha. Não dá turma ou de me manifestar, vergonha dele! Vergonha da noite passada.

Ele continuou olhando para todo mundo ali esperando que alguém respondesse sua pergunta. Ninguém disse nada, então enfrentei minha vergonha e ergui minha mão. Os olhos dele, e de todos ali, pararam em mim.

ㅡ Pode dar um passo a frente, por favor? ㅡ Ele pediu, da maneira mais intimidadora possível. Era agora que ele me humilhava? ㅡ Mais alguém?

ㅡ Eu. ㅡ A voz de Nicolas me fez arquear uma sobrancelha. Olhei para o lado em tempo de vê-lo dar um passo a frente também. Nicolas me observou e piscou de uma maneira desafiadora.

ㅡ Pois bem... ㅡ Trevor sacou um celular do bolso, conectou rapidamente à caixa de som, soltou uma música que tinha apenas a batida do Hip Hop  e indicou que nós dois chegássemos um pouco mais a frente. ㅡ Eu quero ver uma batalha de freestyle, mostrem o que sabem fazer e não economizem na energia. ㅡ Virou-se para mim. ㅡ Você começa.

Assenti. Se existiam momentos que eu me sentia segura de mim, eram os freestyles. É claro que a sensação de aprender uma coreografia e conseguir executa-la bem era incrível, mas poder me expressar e improvisar não tinha preço.

Os alunos formaram uma meia lua a nossa volta e gritaram a cada movimento que fizemos. Trevor ficou andando em círculos ao nosso redor parecendo analisar tudo o que fazíamos. Cada um de nós teve três chances para improvisar até que a música acabasse. Quando terminou, senti um pouco da minha raiva pelo Nicolas diminuir, já que eu tinha ido nitidamente melhor que ele. Não tinha luta melhor para extravasar a raiva que uma batalha de dança.

Nicolas não pareceu contente quando a música terminou. Os alunos aplaudiram, mas Trevor permaneceu sério.

ㅡ Obrigado. ㅡ Trevor disse em sinal de que podíamos nos juntar aos outros alunos. ㅡ Todos vocês aqui estão numa turma avançada. Todos vocês tiveram que fazer uma inscrição, ser convidado a fazer uma audição, tiveram que passar nessa audição, tiveram que entrar numa turma iniciante, subir para a intermediária, entrar na avançada e só aí puderam estar aqui. Se vocês não se considerarem bons no que fazem, ninguém vai. ㅡ Suas palavras fizeram a sala inteira se silenciar. ㅡ É claro que todos temos sempre que nos aperfeiçoarmos e sempre temos que buscar aprender mais, mas se subirmos num palco sem acreditar que somos bons no que fazemos, o público também não vai acreditar. De que adianta uma turma avançada cheia de alunos bons, se eles mesmos não acreditam em si? Nada! Quando perguntei quem se considerava bom no que faz, esperei que todos, ou pelo menos, mais da metade da turma levantasse a mão. ㅡ Ele continuou andando pela sala, doendo cada palavra olhando nos olhos de cada um. ㅡ Quando não acreditamos em nós mesmos, qualquer um que chegar e dizer que você é péssimo no que faz... Você vai acreditar. ㅡ Ele parou no meio da sala. ㅡ A dança exige confiança. E é isso que quero ver em vocês. Seja você realmente muito bom no que faz... ㅡ Ele olhou para mim. ㅡ Ou ainda tenha que melhorar bastante. ㅡ Olhou para Nicolas. ㅡ Vamos começar.

[...]

ㅡ Meu Deus... ㅡ Íris me olhou. ㅡ Essa aula foi incrível!

ㅡ Eu to toda quebrada. ㅡ Fiz uma careta alongando a coluna.

ㅡ E aquele sermão do começo? Foi um tapa sem mão na cara de todo mundo! ㅡ Íris disse com admiração. ㅡ Menos na sua, né? Porque ele te elogiou.

ㅡ Ele não me elogiou. ㅡ Peguei a garrafa d'água do chão e abri para beber um pouco.

ㅡ Ah, não? ㅡ Pigarreou. ㅡ " Seja você realmente muito bom no que faz... " ㅡ Forçou uma voz mais grossa. ㅡ Ele falou isso olhando dentro da sua cara! Eu chamo isso de um baita elogio.

ㅡ Concordo. ㅡ Kevin parou perto da gente.

ㅡ Viu. ㅡ Íris assentiu. ㅡ E você preocupada. Acho que ele nem lembra de você. Talvez não tenha te reconhecido.

ㅡ Ele viu a minha cara passando pela mesa dele na cafeteria por mais de três horas inteiras. ㅡ Toquei a nuca com a palma da mão. ㅡ Apesar de que eu estava de uniforme e o cabelo preso. Mas, eu não fico tão diferente assim, fico?

ㅡ Você parece outra pessoa de cabelo preso. ㅡ Ela disse da maneira mais séria possível.

ㅡ Mas, ele me viu ontem. Eu estava de cabelo solto.

ㅡ É, mas era de noite e você estava chorando. ㅡ Olhei na direção de Trevor que conversava com Mônica na frente da sala. A aula já tinha terminado, mas a maioria dos alunos ainda estavam recuperando o fôlego dentro da sala.

Será? E se ele não me reconheceu? Até porque na cafeteria ele mal olhava para mim... Talvez ele não se lembre.

Meu coração se aliviou no mesmo instante em que cheguei a essa conclusão. Pensar que ele não me associaria à garota chorona que viu na rua me deixava aliviada.

ㅡ Bem, agora vamos para o outro sofrimento. ㅡ Íris ajeitou a postura e fez um plie. Ri dela e segui para sair da sala. ㅡ Temos quantos minutos até o ballet?

ㅡ Hm... ㅡ Ergui o pulso. ㅡ Uns vinte minutos.

ㅡ To morrendo de fome. Vou na cozinha roubar uma fruta, pode ir descendo que eu te alcanço. ㅡ Ela correu na direção contrária e eu segui para o elevador. O ballet era no andar de baixo.

Entrei no elevador e apertei o número do andar, porém, poucos segundos antes da porta se fechar, Trevor entrou no elevador e apertou o botão térreo.

Senti a vergonha me tomar novamente e esqueci como se respirava. Parei feito uma estátua ao lado dele tentando olhar para qualquer coisa sem parecer estranha.

Os segundos pareceram eternos ali dentro. Meus olhos teimavam em querer olhar para ele ao mesmo tempo que eu tentava respirar de uma maneira que não fosse tão alta. Meu Deus, eu só queria que aquela porta abrisse logo, era só um andar!

Fechei os meus olhos e tentei acalmar minha mente. Era só mais um aluno que eu veria em todas as aulas, precisava me acostumar e vê-lo só como um aluno. Como Íris mesmo disse, ele nem deve ter me reconhecido.

ㅡ Sophia? ㅡ Meu nome sendo chamado por ele me fez abrir os olhos na hora e o encarar. Ele estava me observando parecendo completamente confuso. Só entendi o motivo quando vi que a porta do elevador já estava aberta.

E eu estava de olhos fechados, parada, feito uma maluca.

ㅡ Ah... É. ㅡ Abri um sorriso sem jeito e saí do elevador quase que correndo.

•••
Continua...

Te Pedi para a Estrela CadenteWhere stories live. Discover now