Balaio

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Já era quarta-feira à tarde. A maioria dos alunos do 2º ano que tinham aulas extracurriculares resolveram faltar para se preparar para a apresentação na aula da An. Logo, na aula de informática, só estavam Niragi, Chishiya e mais três nerdolas.

— Ei, Chishiya. — Niragi, surpreendentemente, parecia mais tranquilo do que o usual.

— Oi, o que foi?

— Já decorei minha parte, mas tenho uma dúvida. Essa parte que tu escreveu realmente aparece no slide? — Mostrou a ele o computador.

— É, mais ou menos. Acho que escrevi mais do que eu devia.

— Então, olha, se eu errar algo a culpa é sua. Ninguém mandou tu encher linguiça.

Bem, isso irritou Chishiya. Odiava quando alguém o dizia que tinha feito além do que devia — é porque ele gostava do assunto, poxa!

— Olha aqui, Suguru. — Apontava o dedo indicador bem no meio da cara do colega. — Eu disse pra tu ir decorando desde cedo, mas você me ignorou. Deixa tuas grosserias de lado, não sou saco de pancada pra tu descontar...

— Descontar o quê, porra!? — Agarrou Chishiya pela gola da camisa, praticamente o enforcando. — O que tu sabe da minha vida, imbecil?

— Ei, ei! O que estão fazendo, vocês aí? — Foram notados pelo professor. — Saiam da sala, os dois.

Se essa saída era para ajudar em algo, então falhou miseravelmente. A coordenação ficava lá do outro lado e com toda certeza os dois garotos não segurariam a raiva por tantos corredores. E, curiosamente, o primeiro a explodir foi o mais calmo entre ambos.

— Sério, Niragi! — Cruzou os braços e pisou firme no chão. — Por que tu é desse jeito?

— Que jeito, hein? Vem cá, seu tampinha, me explica melhor! — Usando sua altura como ataque, tentava intimidar o loiro.

— Você não me dá medo, eu tenho é pena de tu. Fica se fazendo de durão à toa, não vai ganhar porra nenhuma com isso. Só fama de babaca.

— Tu tá me chamando de fracote, seu frango? — Mostrava o seu punho bem diante de Chishiya. — Vamos ver quem é o fracote nesse caralho!

— Pode me bater, vá em frente. Não vai mudar quem tu é de verdade.

— Eu já perguntei, o que tu sabe da minha vida!? — Socou o rosto do loiro com força, o derrubando no chão. Então, o agarrou pelos cabelos, levantando seu rosto. — Eu tava até te aturando antes, mas agora vejo que é um lixo como todos os outros.

— Olha aqui, meu mano. — Colocou a mão sobre o local em que recebeu a mãozada. — Não sei que outros são esses, mas sei que não tô nesse balaio.

Shuntaro, logo, levantou-se e foi à enfermaria buscar gelo e torcer para que o coordenador não descobrisse sobre isso — sentia que Niragi iria o odiar ainda mais. Mas, porra, e a apresentação?

quarta, 8 de fevereiro

Chishiya: mano mano mano mano

SamuraBoss: oi oi oi oi

Chishiya: tu n sabe oq rolou hj de tarde
Chishiya: kkkkkkkkkkkkkkkk

SamuraBoss: meu deus conta

Chishiya: adivinha qm me deu um socao

SamuraBoss: ????????
SamuraBoss: eoq doido
SamuraBoss: no q tu ta se metendo?
SamuraBoss: mas ta, foi a kuina?

Chishiya: n, deus me livre levar um soco dela, eu ja tava era morto

SamuraBoss: sla, arisu?

Chishiya: mt frangote nn
Chishiya: ate a usagi seria mais decente

SamuraBoss: sla man

Chishiya: foi o niragi

SamuraBoss: EXPLICA ISSO AI

Chishiya mandou um áudio explicando o ocorrido, além de mencionar o temor em relação à apresentação do dia seguinte.

SamuraBoss: po, q situação merda
SamuraBoss: mas assim, n tem oq ele fazer ctg lá, tlgd? ele n vai te bater na frente da sala

Chishiya: é vdd, eu sei disso
Chishiya: mas p ser sincero to c um pouco de medo dele amanhã, n sei explicar n
Chishiya: n iria demonstrar na frente dele mas me assustei c isso de vdd

SamuraBoss: tu nunca levou um socao antes ent eh normal
SamuraBoss: mas relaxa, vai dar td certo

Chishiya: espero mt msm

Faltavam apenas dez minutos para a apresentação do trabalho. Chishiya estava visivelmente nervoso, estava quase tendo uma crise de ansiedade — por causa de Niragi, por causa da apresentação e por causa da turma. Mesmo que o período de sua ansiedade social já estivesse passado, sempre há resquícios de uma fase ruim na vida de alguém. Por isso, também entendia em partes pelo o que o seu "inimigo" passava.

— Suguru e Shuntaro, é a vez de vocês. — Ambos engoliram em seco e, então, seguiram.

A apresentação foi até que boa. Houve poucos erros e Chishiya, por dominar o assunto, conseguiu aperfeiçoar o trabalho. Porém, o pós foi simplesmente horrível: o loirinho estava passando muito mal e foi correndo até o banheiro. E o pior: odiava banheiros escolares. Lembrava-se de quando não suportava ficar dentro da sala e tinha crises de pânico e de choro quase todo dia — e estava revivendo tudo novamente.

Nem ao menos aguentou entrar numa cabine; viu que estava sozinho, apagou as luzes e sentou-se, suado e trêmulo, naquele chão frio e sujo. Mas, como se fosse uma punição divina, repentinamente surgira a pessoa menos adequada para a situação.

Niragi, numa tentativa simples de evitar infecções no seu piercing mais recente, entrou no primeiro banheiro que avistava. Não queria ter que lidar com outro quelóide, foi um saco na vez que teve — preparou-se, pois, para abrir o antisséptico. Entretanto, percebeu sons de choro e uma figura estranha se escondendo ao lado da bancada. Aproximou-se e abaixou a cabeça. Viu que era Chisiya e, após uns cinco segundos trocando olhares fixos, ouviu-o:

— Por favor, não conte pra ninguém. — Sua voz estava tão baixa que Suguru quase não o entendeu.

Niragi apenas o observou por uns dez segundos, não falou nada e foi embora. Dez segundos estes que foram suficientes para fazê-lo repensar sobre a natureza de Chishiya: ver ele sentado no chão de forma indigna e solitária o lembrava de seu passado similar. Talvez ele realmente não estivesse nesse balaio, como havia dito.

O EnigmaWhere stories live. Discover now