Tentativa

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É o primeiro dia de aula do jovem Suguru Niragi. Não estava animado, muito pelo contrário: queria se esconder num buraco, já que imaginava ser o único lugar aceitável para ele. Não queria se enturmar e nem participar de qualquer besteira de aluno novato. Sentia nojo de tudo isso.

Porém, sabia que não seria do seu jeito ideal. Inclusive, pouco demorou para ouvir grupinhos de pessoas o observando e cochichando entre si e, por isso, apenas andou mais rápido à sua sala e sentou-se na última cadeira, lá no final da sala.

— Bom dia, pessoal! — Apresentava-se a auxiliar da coordenação, sorridente. — Sou a nova auxiliar do coordenador Takeru Danma. Me chamo Mira Kano. Tem algum novato na sala?

— Eu. — Um loiro platinado, à sua frente, levantava a mão. Niragi, logo de início, o julgava arrogante pela sua expressão. — Sou Chishiya, prazer a todos.

— Seja bem-vindo, Chishiya! Ah, e você ali? — Apontava a Suguru — Nunca te vi, é novato, né?

— Sim, sou. Me chamo Niragi, prazer.

— Ótimo, ótimo! Espero que todos se dêem muito bem! Tchau, queridos!

Enfim, já era intervalo. Suguru, então, já preparava-se para escolher um lugar afastado e, por isso, foi à biblioteca. Pegou um livro qualquer para fingir que estava lendo e colocou seu celular no meio, como costumava fazer nas aulas chatas de literatura, porém, sem os chatões para o dedurar.

Só que, poucos minutos depois, ouviu uma risadinha perto de si. E conseguiu ver perfeitamente quem era.

— Tá rindo de quê, hein!?

Chishiya riu novamente.

— Nada demais, só achei engraçada a sua tentativa de fingir que tá lendo. — Apontava ao livro de Niragi, se achando o espertão. — Quem em sã consciência leria um artigo de 600 páginas sobre ciências contábeis?

— Tá, mas e se eu tivesse lendo? Você só estaria me chamando de doido.

— Você tem, que dê pra observar, quatro piercings no corpo. Isso é praticamente impossível, dá pra sentir o cheiro de humanas de longe.

— Acertou, gênio. Agora, poderia deixar eu e minhas ciências contábeis de boa aqui? — Fazia uma cara de desinteresse e raiva, propositalmente. — Se não for incomodar o jovem de saúde, claro.

— É, ao menos, você acertou também. Até mais.

Após Chishiya ir embora, Niragi, de maneira inexplicável, sentiu alívio. Era a primeira vez desde muito tempo que alguém de sua idade se aproximou sem más intenções. Obviamente, era apenas uma interação humana normal entre humanos desconhecidos, porém, Suguru não cumpria um desses requisitos: não se sentia humano. Se sentia julgado como um ser repugnante, um ser asqueroso. Às vezes, até que gostaria de agir dessa forma para que o odeiem com um motivo concreto — sonhava e imaginava várias vezes, também, com atos de violência contra os outros do pior caráter. Porém, ao mesmo tempo que desejava perder a sua moralidade, tinha medo de se tornar um sociopata completamente dissociado de si, como em alguns sonhos.

Deixando os pensamentos intrusivos de lado, levantou-se e foi à sala novamente. Era de uma tal professora An que, no primeiro dia de aula, já tinha passado um trabalho em duplas. "Que bosta, hein?" foi o pensamento de praticamente toda a turma.

— Ah, vocês dois são novatos, não são? — An aproximou-se dos dois garotos. — Que tal fazerem juntos, então?

— O trabalho não pode ser individual, não? — Niragi mantinha a postura levemente agressiva; embora Chishiya tivesse o tratado como gente, ainda não ia muito com a cara dele.

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