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O livro aberto em cima da escrivaninha chamou a atenção de Beatrix, quando a garota entrou despreocupadamente dentro da suíte alheia, avistando Ully andando de um lado para o outro do local.

- Você chamou - a fada do ar anunciou, sorrindo de lado. - E eu vim.

A de cabelos escuros se virou em direção à voz, apontando para o livro antigo em seguida. Beatrix arqueou uma das sobrancelhas, confusa com o aparente mau-humor da outra - não que fosse alguma novidade, já que Ully parecia irritada a maior parte do tempo, nos últimos dias.

- Esse livro idiota - começou. - Em primeiro lugar, nada faz sentido! Em segundo, tem coisas escritas em uma língua diferente... Latim? Não sei! - exclamou, a voz cansada. - Não posso mais fazer isso sozinha, eu estou aqui a dias! Será que uma garota não pode descobrir suas origens em paz?

Beatrix segurou o riso, diante a fala corrida da fada da mente. Esperando que Ully recuperasse o ar, a de cabelos castanhos avermelhados se aproximou mais, colocando uma das mãos no ombro da fada à frente.

- Qual, é? - começou, suave. - Fique calma, eu vou ajudar você - completou. - Não precisa fazer isso sozinha.

Ully assentiu devagar.

Se dissessem à ela um mês atrás, que Beatrix estaria em seu quarto, lhe acalmando e dizendo que a ajudaria, Ully teria rido por horas seguidas. Parecia impossível o que acontecia ali, naquele momento.

Mas, a fada da mente não podia simplesmente sair dizendo as pessoas à sua volta, que precisava de ajuda. Não quando ninguém sabia o que se passava.

Isso não queria dizer que estava usando Beatrix como uma segunda opção. Inesperadamente, Ully queria que a ajuda viesse da fada do ar. Mesmo sem ainda ter acesso à mente dela, sentia que a garota era sincera no que dizia.

Era a primeira vez que Ully confiava em alguém, cujo os pensamentos não podia ler. E, para uma surpresa ainda maior, essa era a mesma pessoa com quem teve conflitos o ano passado inteiro e trocou ameaças de morte.

- Se você quiser, é claro - continuou Beatrix, notando o silêncio vindo da fada da mente. - Entendo se não quiser, afinal, eu realmente fui uma pessoa péssima, não só com você e...

- Eu quero - interrompeu Ully. - Eu quem te chamei aqui, e quero muito que você me ajude, Beatrix... Por favor.

A fada do ar sorriu mais uma vez. Seu coração acelerado com a possibilidade de finalmente conseguir uma amizade de verdade, sem algum plano maluco por trás ou a devoção por Rosalind sendo uma chave de interesse.

Já havia feito loucuras demais pela diretora, sem resposta alguma. Estava cansada, também. Agora, queria poder começar a fazer as coisas pelo motivo certo.

- Beleza, então vamos lá.

•••

Duas horas se passaram.

Beatrix e Ully discutiam animadamente sobre às escritas do livro, enquanto tentavam traduzir algumas das coisas - supostamente digitadas no Latim.

- Okay, então... - a fada da mente começou, pensativa. - A possibilidade maior, dentre tudo isso, é que eu herdei os poderes de vários membros da minha família?

- Uhum - Beatrix concordou, jogando-se na cama de sua nova amiga. - Pelo jeito, você pode ser uma Receptora.

Ully assentiu devagar, folheando o livro pesado em seu colo. Um barulho então soou, chamando a atenção das duas adolescentes, que se viraram em sincronia em direção à porta.

A figura de Bloom surgiu, confusa.

- Beatrix? - questionou, dividindo seu olhar entre as fadas. - Okay, porque Beatrix que está aqui?

A de cabelos castanhos avermelhados revirou os olhos, se colocando de pé em um pulo. Ajeitando a roupa com uma das mãos, a fada do ar anunciou:

- Estou indo nessa, Lily, eu te mando mensagem depois.

Ully assentiu, sorrindo para Beatrix, que não demorou ao se direcionar até a porta, onde a fada do fogo observava tudo com os olhos semicerrados.

- Aliás, nunca agradeci você por ter ido me procurar também - a fada do ar disse, acenando com a cabeça para Ully. - Muito obrigada.

- Eu te devia uma - a de cabelos escuros respondeu, piscando um dos olhos de forma divertida.

Beatrix então saiu, recebendo os olhos claros de Bloom queimando suas costas a medida que se distanciava. Então, a ruiva virou-se para Ully, os braços cruzados em frente ao peito.

- Que merda foi essa?

Foi a vez de Ully revirar os olhos, deixando o livro de forma discreta em cima da cama. Bloom, tão entretida pela interação estranha que acabara de presenciar, nem notou o ato sútil da amiga.

A fada da mente se levantou também, dando de ombros ao passar por Bloom.

- Ully, estou falando sério! - exclamou a ruiva. - Desde quando você é amiga da Beatrix!?

- Porque está gritando? - a de cabelos escuros perguntou, levemente irritada. - Beatrix sabe que cometeu erros, mas está disposta a mudar. Ela é uma boa pessoa e...

- Você ao menos sabe se ela não está enganando você? - Bloom retrucou. - Nem a mente dela você consegue ler, Ully, por Deus!

- Que moral você tem, hein!? - o tom da fada aumentou, a paciência indo embora. - Você sabe se a Rosalind não está enganando você? Qual a diferença entre eu confiar na Bea e você na maluca da Rosalind? - gesticulou, agitada. - Vê se me erra, Bloom.

Sem esperar por uma resposta, Ully sai apressada da suíte.

- Porra! - xingou, nervosa.

Com Bloom.
Com si mesma.
Com toda a situação.

O lugar seguro, que pensou ser suas "amizades", também desandava aos poucos. Brigas, discussões desnecessárias. Até Musa estava estranha com ela, após o incidente do Raspador, evitando a todo custo esbarrar com a irmã.

"Só quero que lembremos, que por pior que as coisas estejam lá fora... Aqui dentro, as coisas estão bem" - a voz de Terra soou em suas lembranças, fazendo seu coração apertar.

"Aqui dentro as coisas não estão bem, afinal" - pensou.

••••••

𝐢. 𝐀𝐅𝐓𝐄𝐑 𝐓𝐇𝐄 𝐒𝐓𝐎𝐑𝐌. ! ༉ 𝗳𝘁𝘄𝘀Onde as histórias ganham vida. Descobre agora