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POV | Lena Kieran Luthor

Dos milhares espetáculos de balé que existem, o favorito da minha mãe era de longe, "O Lago Dos Cisnes". Seu maior orgulho era ter conseguido o papel mais importante e ter se apresentado nos melhores palcos, maiores cidades e vir a ser conhecida mundialmente pela sua legendária interpretação de Odette, a personagem principal.

E por uma infeliz ironia do destino, seu final não foi tão diferente do cisne que tanto amava.

Ambos acabaram em tragédia. Em morte.

Eu tinha quase doze anos quando aconteceu. Algumas pessoas que passaram por situações parecidas sempre dizem que se lembram de quase tudo, mas eu não. As únicas coisas que tenho memória são das últimas conversas que tive com ela e de ter visto paramédicos levando um corpo coberto por panos brancos.

Eu estava sozinha. Pela primeira vez eu estava verdadeiramente e totalmente sozinha.

E ela me deixou. Foi uma decisão pensada que fez, escolhendo me deixar para trás. Mesmo sabendo do quanto eu precisava dela. Do quanto eu a amava. Sua dor e tristeza realmente eram bem maiores do que qualquer coisa que eu pudesse fazer e qualquer amor que eu pudesse dar.

Por mais estranho que pareça, eu entendo seus motivos. Ela teve de aguentar coisas muito piores do que eu e por muito mais tempo, vivendo constantemente sob tortura. Odeio sequer pensar que minha mãe, aquela mulher amorosa, gentil, talentosa e linda, estava tão machucada por dentro que não via nenhuma outra saída. Nenhum sinal de esperança.

E a pior parte de todas é que, mesmo entendendo seus motivos, eu a culpo. Já tentei muito, mas não consigo evitar parar de pensar que foi uma escolha me deixar sozinho com o meu pai. Arrancar de mim a única pessoa que eu realmente amava: si mesma.

Eu sei que é um pensamento egoísta. Eu sei que é horrível, mas como eu disse, não consigo evitar.

E tudo isso por conta do meu pai. Do meu maldito pai. Sua raiva e angústia de si mesmo devoraram como fogo minha mãe e dizimaram qualquer brilho de felicidade que existia em seus olhos. Não consigo imaginar a imensidão da escuridão que assolava a alma dela, consumindo-a dia após dia, de fora para dentro e de dentro para fora.

Para ser sincero, ele não é meu pai. É um monstro.

Ainda lembro de entrar no estúdio favorito de dança da minha mãe dentro da nossa enorme e, ao mesmo tempo, vazia mansão, coberto de espelhos e vidros que nos refletiam por todos os lados. Fotos, recortes de jornais e quadros imensos exibindo minha mãe dançando diferentes espetáculos na época do seu auge. Absolutamente linda e quase sempre com um sorriso radiante em seus lábios, cheia de felicidade legítima e pura que já não existe mais.

flashback
Oito anos atrás...

Paro alguns metros atrás de minha mãe para observá-la enquanto admira suas próprias fotos antigas. Os lindos e longos cabelos pretos cobrindo seu rosto machucado e escondendo suas lágrimas, os olhos pesados em arrependimento e saudade, pensando em como saiu da mulher dos quadros para a mulher parada em minha frente.

Eu corro para abraçá-la, tomando cuidado com sua perna machucada e cuidando para não a derrubar – ela já não dançava mais.

Seus braços envolvem meu corpo pequeno com amor, mas seus olhos continuam vidrados em si mesma.

– Lee – diz calmamente com a voz carregada em um forte sotaque russo. Ela se desvencilha do nosso abraço e pousa as suas mãos sobre os meus ombros. – Olhe aqui.

Prodígios de Elite ᴥ SupercorpWhere stories live. Discover now