Os segundos passaram, as notas suaves soavam ritmadas enquanto as mais graves pontuavam um intervalo intenso entre elas, Iruka suspirou fundo ao tentar reprimir o choro e os batimentos acelerados de Sasuke já haviam normalizado. Tudo sob efeito da melodia. Ele percebeu, também, que Hinata não estava estática ou rígida como pensava. Ela mexia o corpo lentamente, quase de forma imperceptível; inclinava-se para trás e tornava a ir para a posição ereta de novo; sua cabeça tombava para um dos lados em um movimento sutil, fazendo os cabelos escorregarem ligeiramente.

O Uchiha estava encantado, porque conseguia sentir em cada nota como Hinata era delicada no que fazia. E, de mesmo modo, ela tinha a capacidade de transmitir seus sentimentos através da melodia — a qual já era naturalmente triste, porém, vindo dela, tornava-se muito mais intensa e soturna. Sasuke sentia um aperto no peito, como se uma pessoa emocionada o abraçasse com muita força.

Como se alguém que ele nunca mais fosse ver o abraçasse com muita força.

E aquilo o deixava sem ar.

No instante seguinte, os gestos da Hyuuga se tornaram mais agitados com o segundo movimento da melodia, mesmo que seus ombros não se mexessem muito, e o som deveria ter seguido o ritmo e se tornado mais alegre. Entretanto, ainda era possível sentir a angústia nas notas, até que o terceiro — e último — movimento da décima quarta sonata de Beethoven se iniciou.

Os cotovelos acompanhavam a rapidez com que as mãos de Hinata deslizavam pelo piano: apressados e precisos. Não havia mais suavidade, não havia mais tristeza. Havia raiva, havia amargura. E ela se manifestava pelo som; pela forma da jovem tocar com mais força nas notas mais graves; no cabelo que se remexia abruptamente de acordo com o modo que o corpo dela se projetava para frente e para trás. O ápice se deu quando ela apertou as mãos por um tempo maior e passou a acelerar, estendendo-se à parte mais aguda do instrumento só para voltar vagarosamente, tecla por tecla.

Quando Sasuke achou que tinha acabado, Hinata voltou ao refrão com muito mais intensidade, um pouco mais baixo. Mas, ao chegar ao efêmero ápice, não se prolongou, e finalizou a melodia com a última nota grave. Ela permaneceu naquela posição, respirando muito rápido e forte, do mesmo jeito que ele tinha ficado ao subir aquelas escadas com tanta pressa.

Contudo, a Hyuuga não estava somente ofegante, a respiração entrecortada evidenciava que ela também chorava. Ainda que tentasse controlar e diminuir o choro, ela apoiou as mãos nas teclas, fazendo um som desagradável e desafinado — quase como a garota se sentia naquele instante — e se curvou por sobre o piano. Sasuke quis caminhar até lá, mas ele não sabia como agir. Deu um passo incerto para frente, contudo, Iruka fez um gesto para que permanecesse na porta. Assim ele o fez.

Hinata se recompôs alguns segundos depois, inalando o ar com profundidade e força suficientes para encher os pulmões ao máximo, e expirou com lentidão. Ela juntou as mãos e as ergueu acima da cabeça, espreguiçando-se e estalando os dedos. O professor desceu da mesa e andou até a jovem, pousando a mão em seu ombro esquerdo. Os olhos perolados se direcionaram a ele e as bochechas se comprimiram em um sorriso triste.

— Você foi incrível, Hinata-san — ele sussurrou. — Keiga, ne.

Doumo arigatou, Iruka-sensei — agradeceu, fazendo uma leve reverência ao mestre.

Sasuke continuou parado entre os batentes da porta, apenas observando a interação entre professor e aluna. Ela finalmente o viu quando precisou se levantar para pegar a mochila e sair da sala. Sempre muito transparente com suas emoções, Hinata arfou com a surpresa de encontrá-lo ali, logo após um de seus "surtos" com o piano — mesmo que fosse esperado, já que era um dia de aula de reforço. O tempo tinha passado tão rápido assim? A jovem ainda surpreendia-se com sua capacidade de desligar a mente de tudo a sua volta quando engatava o ritmo nas teclas do piano.

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⏰ Last updated: Aug 21, 2022 ⏰

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