A Virtude é um lixo

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A virtude pela virtude é um lixo. "A virtude pela virtude é um ideal ao mesmo tempo mesquinho e desencorajador porque é impossível realizar!" Cita um Cartuxo. Nada mais egoísta do que o homem que busca a bondade e a polidez disfarçando seu caráter. Um coração que se alimenta pelo desejo da virtude e não fixa um objeto como fim, em poucos instantes, acabará por fixar a si mesmo como fim único e inegociável.

Ainda o Cartuxo, "Aquele que deixa o mundo pela vaidade de se querer perfeito ou que luta contra o mundo para se sentir vencedor e conquistar a sua própria estima, nunca atingirá mais que uma nobreza ilusória." Não há verdade na nobreza daqueles que constroem o próprio castelo frio, gelado e circunscritível do egoísmo. Governar com tirania as métricas da virtude, e tomar para si o papel de justo juiz e fim superintendente de toda bondade, é tomar para si o lugar mais alto no pódio da idolatria. 

"Quem fala mal de seu irmão, ou o julga, fala mal da lei e julga a lei. E se julgas a lei, já não és observador da lei, mas seu juiz. Não há mais que um legislador e um juiz: aquele que pode salvar e perder. Mas quem és tu, que julgas o teu próximo?" (Tg IV, 11s). O que julga-se virtuoso, toma o próprio trono da fonte inesgotável da virtude e, por sua própria mesquinhez, cai no desespero da sua finitude miserável. Ser bom por apenas ser; ser educado por concupiscência; crescer em conhecimento de forma pedante; manifestar afeto em troca de louvores e carinho… Essas são atitudes daquele que limpa o chão como um espelho, apenas para glorificar o próprio rosto.

A virtude que contempla um fim, não incorre em erro. Aquele que fixa em Deus e nada interpõe, além da virtude, ao amor de Cristo é capaz de caminhar em paz e santidade. A virtude é uma escada, ligando a nossa fraqueza à fonte de toda perfeição. Não podemos fincar essa escada como uma espada no nosso próprio coração. Nenhuma vela brilha para si; nenhuma vela cresce à medida que produz luz, pelo contrário, diminui. 

Por fim, tomemos o título dessa reflexão. - Supondo que a virtude realmente seja um lixo, todo lixo é resultado de um consumo. Os resíduos são gerados pelo homem de forma natural. Oxalá, que a virtude fosse gerada de forma natural! Sem esforço por aqueles que consumiram bem a própria vida. Do que vale a polidez de um diamante enquanto está no seio da terra, esquecido em si mesmo e embalado em trevas? De nada vale um diamante se a luz não incide sobre ele e revela seu esplendor.

Não basta virtude. De nada serve a bondade se ela flerta com a vaidade. Assim como a sabedoria, a virtude deve ser procurada sem cessar durante a noite e pelo amanhecer estará em nossa porta, desde que Deus seja o seu fim.

BENTO, São. Caput. "Do bom zelo que os monges devem ter." In A Regra

CARTUXO, Um. Caput. " A espiritualidade do evangelho, as promessas do evangelho." In Silêncio com Deus.

Tg IV, XIs

Sb VI, XII- XVI

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