41. Hoseok, o outro

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Demorou um pouco para descobrir por que não entendia as regras daquele jogo, mas a resposta era fácil: não era uma das peças do tabuleiro.

Em meio ao cotidiano da faculdade, em que as conversas eram apenas aquelas e os interesses limitados à próxima farra, não percebia. Fazia parte. Era o único ponto de vista. Entretanto, quando voltou à sua cidade durante o fim de semana para comemorar o aniversário da mãe, a compreensão de que não estava sendo ele mesmo o atingiu como um soco do Muhammad Ali.

Porque, com os pais e os amigos destes, rostos conhecidos desde a infância, aquela pressão silenciosa se dissipava. Não calculava o que falaria, nem obrigava risadas a nascerem de seu peito. Não tentava alimentar a vontade inexistente de ir a uma festa. Porra, eram festas demais. Queria virar a noite assistindo filme e dormir no colo de alguém.

Quando encontrou seus amigos do ensino médio para tomar sorvete antes de voltar à capital, teve o mesmo sentimento. De que gostava de estar ali, com um picolé de limão em mãos e conversando sobre coisas idiotas e diversas. Sobre a nova edição do jogo de tabuleiro pelo qual era fissurado, sobre galinhas serem as primas mais velhas dos dinossauros, sobre o álbum novo que nunca saía do The Offspring e mais parecia promessa de político. Era libertador ter tanta coisa para conversar. Era libertador o foco principal da conversa ser assunto, não um show do próprio ego.

E, entre seus amigos do ensino médio, estava sua primeira namorada: Yuna. Ou melhor: Yuju. A garota sempre reclamava que se chutasse uma árvore, cairiam dez Yunas de lá, e portanto preferia o apelido inventado por ela.

O namoro dos dois não foi para frente por causa dos objetivos de futuro de cada um, mas continuaram amigos, até porque sentiram muita dificuldade em cortar o contato. Tinha tanta coisa acontecendo ainda, precisavam se apoiar: Jungkook flertava em abandonar a sua acolhedora cidade para fazer uma graduação da qual não estava certo, Yuju vivia o drama de virar parte da família da amante do pai. O dia de Jungkook sempre foi cheio de Yuju e vice-versa. O afastamento só deixaria um grande vazio.

E deixara. Jungkook notou ao encontrá-la mais uma vez, na sorveteria. Nunca pararam de conversar por mensagens, mas os assuntos de Jungkook findaram, por estar tão rodeado da mesmice que não o representava. Tinha virado outra pessoa, e essa pessoa não conseguia manter a amizade com Yuju.

E, ao observá-la, sentiu muita falta dos carinhos trocados no finado namoro. Dos beijos inexperientes e das risadas confidentes. Das tardes preguiçosas em que jogavam videogame ou assistiam a filmes com a cabeça no colo um do outro. Dos relacionamentos que nutria. Do Jungkook que era. Se algum dia as festas regadas a toques desconhecidos e a álcool barato fizeram sentido, Jungkook o perdeu.

Jungkook não conseguiu se reaproximar dos amigos do ensino médio do jeito de antes. Querendo ou não, a distância mudava muita coisa. Porém, alegrava-se em encontrá-los, mesmo que brevemente, pois era como se nunca tivessem se separado. E era muito agradecido mesmo pelo primeiro reencontro ter lembrado-o de quem realmente era.

A primeira festa recusada quando voltou à capital foi a maior vitória. Sentiu-se tão aliviado. Pensava que ficaria sozinho quando os supostos amigos se afastassem, mas não fez diferença. E, sem aquela muralha de pessoas ao seu redor, Jungkook finalmente pôde enxergar novas, de presença franzina e interior rico. À primeira vista. Depois notou que as presenças não eram franzinas, apenas não eram desesperadas por atenção e, assim, dispensavam inflar a própria persona com ar, em vez de personalidade.

A primeira presença que lhe fez sentido deu em namoro. Era um homem. Chamava-se Moonbin, e Jungkook espantou-se em não ter percebido gostar de homens também antes.

Empresário • jikookOnde histórias criam vida. Descubra agora