Can You Hold Me?

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Caos.

Era tudo o que eu via ao meu redor.

Gritos.

Eram tudo o que eu ouvia.

Mulheres, homens e crianças sendo arrastados de suas casas e mortos em frente as mesmas.

Era minha primeira batalha.

Camelot atacava um reino vizinho. Segundo meu pai, seu governante havia nos provocado.

Meu eu de 12 anos daquela época não entendia o porquê de aquelas pessoas terem de pagar pelos pecados de seu rei, quando o próprio já havia fugido no inicio da invasão, e o meu atual eu de 19 não tinha uma opinião tão diferente.

Eu corria entre "inimigos" desesperados e aliados sedentos de sangue procurando por meu pai.

Ao mesmo tempo que queria, eu hesitava em encontrá-lo. O procurava, pois estava aterrorizado com o que estava acontecendo ao meu redor, mas receava em achá-lo, porque sabia que me chamaria de fraco. A última coisa que queria era decepcionar meu monarca.

Foi logo após ver sua capa, de um vermelho mais escuro do que a resto dos cavaleiros, que aconteceu.

Um enorme soldado do reino inimigo apontou sua espada para a garganta daquele pequeno príncipe de 12 anos, provavelmente me reconhecendo como o filho de Uther já que eu usava uma réplica da capa de meu pai. Desesperado, comecei a lutar com o homem que era 20 vezes mais forte do que eu.

Meu pai acreditava no treinamento precoce, então eu já lutava desde muito novo, mas nunca com alguém tão forte, ou com alguém que realmente pretendia me matar.

O guerreiro claramente me subestimava pela minha idade, já que me atacava de forma desleixada. Em um golpe de sorte, achei uma abertura em sua defesa e cravei minha espada em seu peito.

Sangue.

Foi tudo que eu vi e senti após meu ataque.

O corpo morto do homem caiu em cima do meu, o que me fez gritar.

Foi também gritando que acordei.

Era sempre assim : o cadáver caia em cima do meu eu de 12 anos, eu gritava e acordava em choque e tremendo. Os guardas em minha porta já sabiam distinguir os meus gritos de quando eu tinha algum problema e quando eu havia tido um pesadelo, então ao me ouvir acordar de um sonho ruim nem entravam mais para checar meu estado.

Porém, para a minha surpresa, a porta foi aberta.

Com a adrenalina do pesadelo ainda em minhas veias, peguei minha espada e apontei para a porta, logo relaxando ao perceber que era apenas meu serviçal, Merlin.

- Meu lorde, está tudo bem? - ele tinha uma expressão preocupada enquanto acendia duas das velas de meu quarto para conseguir me ver melhor.

- Está, Merlin. Apenas tive um pesadelo - o respondi, colocando novamente minha espada na bainha, esperando ouvir algum tipo de afirmação para confirmar que havia ouvido e o barulho da porta se fechando com sua saída, assim como os guardas faziam quando esses sonhos começaram.

Então é claro que estranhei ao me virar e encontrar Merlin se aproximando, após apagar as velas, ao invés de ir embora.

- O que pensa que está fazendo ? - o perguntei ainda na defensiva pelo sonho recente.

- Vou ficar com você até conseguir voltar a dormir - respondeu como se não fosse nada demais - Era o que minha mãe sempre fazia quando eu tinha pesadelos.

Muito confuso para comentar qualquer coisa, o observei retirar seus sapatos, seu casaco marrom, aquele pedaço de pano vermelho que vivia em seu pescoço e vir se deitar ao meu lado. Eu jamais iria admitir, mas ter companhia após aquele pesadelo terrível não era algo ruim.

Ficamos em silêncio por um tempo, cada um em uma beirada da cama, completamente imóveis deixando uma barreira de ar entre nossos corpos para não nos encostarmos, encarando o teto sem saber o que dizer, totalmente tensos por estarmos deitados juntos.

Eu sabia que Merlin não era o tipo de pessoa que aguentava ficar calada por muito tempo. Precisei esperar apenas mais 5 segundos até ele dizer alguma coisa.

- Quer falar sobre seu pesadelo?

- Não

Ele ficou mais alguns segundos em silêncio

- Você sabe que não vou contar a ninguém não é?

Finalmente me virei para encara-lo. Confesso que esperava vê-lo segurando o riso ou qualquer coisa do tipo que me mostrasse que ele iria espalhar aquilo para o castelo todo, mas apenas encontrei um rosto sério e ainda com resquício de preocupação em seu olhar. Aquilo fez algo dentro de mim se acalmar.

Eu respirei fundo e lhe contei. Desabafei sobre toda a situação como nunca havia feito com ninguém em todos esses 7 anos. Me surpreendi com a rapidez em que ele conseguiu me fazer confortável a ponto de lhe dizer algo que eu não havia dito até mesmo para Morgana e eu havia crescido com ela ao meu lado como se fosse minha própria irmã.

Merlin me ouviu em silêncio, algo difícil de acontecer. Ele havia se tornado meu servo a alguns meses e se recusava a me ouvir em grande parte das vezes. Diferente de como reagiria com outras pessoas, eu achava engraçado o modo como ele jamais seguia minhas ordens, ignorava com convicção o meu título de príncipe de Camelot e me ofendia não importava quando ou onde.

Ao terminar de lhe explicar, Merlin continuou em silêncio, seu olhar pensativo seguindo de meus olhos para a cama e voltando para mim milhares de vezes. Eu estava mexendo nos lençóis com meus dedos de forma insegura quando ele finalmente fez algo.

Merlin se sentou me puxando para me sentar também.

E ele me abraçou.

Demorei a reagir pelo meu choque, mas quando finalmente retribuí o abraço eu desabei.

Deuses, seu abraço era TÃO bom.

Seus braços me apertando em seu peito de forma a me passar a segurança que nunca senti desde que me entendia por gente.

Em certo momento simplesmente desisti de segurar as lágrimas.

Eu não conseguia colocar em palavras o que sentia naquele momento.

Eu soluçava de emoção por FINALMENTE receber algum conforto.

As lágrimas de Merlin em minha blusa foram o que me acordaram daquela bolha de carinho e proteção.

- Merlin, se você contar isso para alguém, eu vou - comecei de forma tremula, fungando e com o rosto vermelho ainda banhado em lágrimas que cintilavam com a luz da lua, apontando meu dedo indicador para seu peito.

- Jamais, meu príncipe. Eu te prometo que o que aconteceu aqui vai comigo para o caixão - ele me interrompeu, seu rosto também brilhando pelas lágrimas recentes.

Merlin me estendeu seu dedo mindinho. Devo ter feito uma expressão confusa ou algum tipo de careta, porque ele soltou uma risadinha e pegou minha mão. O moreno fechou meu punho deixando apenas meu dedo mindinho estendido e enlaçou nossos dedos juntos.

- Pronto, promessa de mindinho é um juramento muito sério, se algum dia eu quebra-lo coisas terríveis vão acontecer comigo - ele disse com expressão severa.

Minha reação imediata foi sorrir.

Voltamos a nos deitar, agora comigo em meio aos seus braços que me seguravam de forma firme e com meu rosto na curva de seu pescoço. Ele sussurrava em meu ouvido palavras de conforto.

Aquela foi a primeira vez desde meus 12 anos que consegui adormecer após um pesadelo e, felizmente, não foi a última.

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Pesadelos - MerthurWhere stories live. Discover now