Capítulo 1 - Chegada (revisado)

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Mas tudo valeria a pena.

Passei pelo varal e procurei alguma roupa que pudesse me servir. Peguei a primeira calça jeans surrada que vi pela frente que parecia mais próxima do meu número. A blusa vermelha também não estava das melhores, mas pelo menos estavam todas limpas e cheirosas. E eu gostava de coisas cheirosas. No entanto, quando olhei mais a frente e vi dois pares de tênis na escada da varanda, quase senti o cheiro dele daqui. Eu não sabia dizer exatamente qual deles que fedia rato morto e nem tinha vontade de descobrir, mas precisava calçar alguma coisa e um dos pares parecia perto o suficiente de servir no meu pezinho lindo. Estavam a poucos metros de distância e por mais que eu não quisesse me aproximar da casa, eu não podia ir para a cidade descalça.

Andei até lá sorrateiramente e peguei o par de sapatos menor. E a felicidade que senti por saber que não havia um rato morto dentro daquele em específico foi tão grande que calcei sem esperar nem mais um segundo. Os sapatos, assim como imaginei, ficaram um pouco largos, mas não importava. Queria mais era sair daqui. De preferência com roupas e com os pés minimamente confortáveis.

Silenciosamente voltei para a floresta e segui em direção a estrada.

Não foi encorajador olhar para as placas e descobrir que ainda faltavam 30 km para Burlington. A cidade mais populosa — e mais segura para uma recém solitária como eu — do estado de Vermont. Com um território extremamente maior comparado ao qual minha antiga alcateia ocupava em Lancaster, em New Hampshire. No entanto, foi menos encorajador ainda tentar pegar carona e ser ridiculamente ignorada pelos raros veículos que ousavam passar por ali. Não sei se seriam corajosos o suficiente para ajudarem alguém às 5 horas da manhã no meio da estrada, mas não custava nada tentar mais um pouco.

Continuei andando arrumando meu cabelo emaranhado e esperando o próximo carro passar. Demorou vários minutos até que o primeiro farol aparecesse, mas quando acenei, ele sequer diminuiu a velocidade antes de passar direto.

Isso demoraria muito mais do que eu imaginava. Entretanto, olhando pelo lado positivo, eu estava longe de casa. Longe de todos, sozinha e pronta para começar minha vida de loba solitária. Do zero. Era no mínimo emocionante pra cacete! E no máximo, aterrorizante ao extremo.

Andar como humana depois de ter ficado exausta como lobo não era agradável. E depois de algumas tentativas falhas, eu vi finalmente o próximo veículo vindo na minha direção. Ergui os dois braços e fiz sinal. No intuito de chamar mais atenção ou mostrar urgência o suficiente dessa vez. Percebi quando o automóvel diminuiu a velocidade e parou do outro lado do acostamento. Era um caminhão pequeno de carga.

O motorista abaixou a janela e fez sinal para eu entrar. Estranhei por alguns segundos o cabelo loiro sedoso, os olhos lindos e brilhantes e os lábios rosados com gloss. Não, não era um homem que dirigia. Era uma mulher.

Atravessei a estrada e abri a porta do caminhão antes de entrar. A mulher estava usando uma jaqueta jeans e uma calça escura, o cabelo loiro escuro estava amarrado num rabo de cavalo e parecia ter no máximo uns 35 anos.

— O que você faz sozinha na estrada uma hora dessas? — Ela me olhou com bastante atenção, mas o olhar só durou alguns segundos antes que ela pisasse no acelerador novamente. Ok, vamos lá...

— Ah, eu moro aqui perto, tenho compromissos na cidade logo de manhã, mas não tinha como ir. O motor do meu carro resmungou para mim quando tentei ligá-lo. — Dei um sorriso humorado e torci para que a mulher me acompanhasse.

— Então teve sorte de eu estar passando. — Ela riu fraco.

— Tive sim. E agradeço. — Encarei a estrada.

A LUA, O CAOS E A LIBERDADE [+18]Where stories live. Discover now